Publicado no jornal O POVO, em 07 de agosto de 2002
Em meio ao processo de moralização que a Justiça cearense vem desencadeando há quase dois anos, com a apuração de denúncias contra seus integrantes e as conseqüentes punições, um lamentável equívoco parece estar passando despercebido pelo meio jurídico do Estado. Na contramão dos mais sensatos juízes, procuradores e advogados do Brasil, que refutam, a cada nova tentativa, a aprovação da chamada Lei da Mordaça pelo Congresso Nacional, uma versão cabeça-chata desta malsinada medida já vigora no Ceará.
A aberração está contida no novo estatuto da Associação Cearense dos Magistrados (ACM), aprovado em assembléia por um punhado de juízes e publicado no Diário da Justiça de 25 de julho. Em seu artigo 20, foi incluída a previsão de que caberá ao Conselho Executivo da entidade decidir o teor das manifestações da Associação a serem divulgadas por qualquer meio de comunicação.
Para quem não sabe, o Conselho Executivo da ACM, segundo o mesmo estatuto, é formado por um presidente, um vice-presidente, um secretário-geral, um tesoureiro e cinco diretores. Ou seja, para expressar a qualquer órgão de imprensa a posição da entidade sobre tema de interesse da comunidade o juiz, eleito presidente pela maioria dos associados votantes, terá de ouvir pelo menos oito colegas.
Quem conhece minimamente os mecanismos de funcionamento interno dos veículos de comunicação e a necessidade de dar celeridade à circulação das informações sabe que tal mordaça imposta ao presidente da entidade burocratizará a possibilidade de presença da instituição nos grandes debates sociais. Não me refiro ao atual presidente, Michel Pinheiro, porque, a menos que se trate de uma mudança casuística e com alvo certo - ele próprio, a mordaça atingirá os próximos presidentes.
Estranho é que a mudança ocorra quando a ACM, surpreendentemente, passou a ser presidida por um magistrado não oriundo das fileiras mais conservadoras do poder. Se isso se estende a outras categorias...