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Textos_Juridicos-->Dever jurídico e direitos da personalidade -- 18/04/2005 - 20:28 (Helder Martinez Dal Col) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Helder Martinez Dal Col é Advogado e professor no Paraná. Especialista em Direito Civil e Processual Civil pela Fundação Getúlio Vargas - FGV/RJ. Mestre em Direito Civil pela Universidade Estadual de Maringá – UEM/PR.

* Artigo publicado no CD-ROM Juris Síntese Millennium n° 36 jul-ago/2002. Editora Síntese – Porto Alegre-RS.; e na Revista Eletrônica da Editora Forense: http://www.forense.com.br/


Sumário: Introdução – 1. Deveres Jurídicos - 1.1. Dever Jurídico - 1.1.1. Conceito de dever jurídico – 1.2. Regra jurídica e dever – 1.3. Correlatividade entre direito e dever – 1.3.1. Há exceção ao princípio metajurídico da correlatividade? - 1.4. Dever moral e obrigação natural - 1.4.1. Obrigações naturais no direito comparado - 1.5. Quanto ao conteúdo dos deveres - 1.6. Dever jurídico e obrigação - 1.7. Dever jurídico, sujeição e ônus - 1.8. Dever jurídico e norma jurídica – 2. Análise do tema à luz dos direitos da personalidade - 2.1. Capacidade civil e capacidade de deveres - 2.2. Deveres das pessoas em geral - 2.3. Dever jurídico e dever de prestar – 2.4. Colisão de deveres - 2.5. Deveres do tipo não fazer e incapazes – Notas conclusivas.

Resumo: O presente trabalho tem por escopo analisar algumas vertentes do dever jurídico, procurando estabelecer as diferenciações existentes entre este e as demais formas de dever, bem como as distinções que ocorrem entre dever e obrigação.

Introdução

Dever jurídico e obrigação são expressões sinônimas? A proposta deste estudo é demonstrar que dever jurídico é gênero, do qual a obrigação, em suas diversas modalidades, é espécie, quando considerada em seu sentido estrito.
Para compreendermos suficientemente o significado e amplitude do dever jurídico e sua importância no âmbito da relação jurídica, analisá-lo-emos em cotejo com o dever moral e as obrigações naturais, comparando-o ainda com a regra jurídica, com o ônus, com a sujeição e, finalmente, com a obrigação e com a norma jurídica.
Como tema correlato, estudaremos o dever jurídico no âmbito dos direitos da personalidade, com ênfase na capacidade de deveres em confronto com a incapacidade civil negocial.
Permeando nossas abordagens, evidenciaremos o pensamento doutrinário acerca das matérias tratadas, colocando em evidência as divergências existentes e fazendo breves incursões analíticas ao direito comparado.


1 – DEVERES JURÍDICOS

1.1. Dever Jurídico

1.1.1. Conceito de dever jurídico


O termo “dever” comporta diversificadas acepções, fruto da polissemia que caracteriza nosso vernáculo.
De Plácido e Silva oferece-nos conceito de dever que também se revela ambíguo e que deve ser analisado em suas especificidades para compreendermos o que vem a ser dever jurídico e as distinções entre este, a obrigação e outras figuras jurídicas similares, pelo que permitimo-nos transcrevê-lo em sua íntegra:

DEVER. Derivado do latim debere (ser devedor, estar obrigado), não possui o verbo, na linguagem jurídica, outra significação (1). Quer, assim, significar o fato de se encontrar uma pessoa sujeita ao cumprimento de uma obrigação, em virtude da qual terá que dar ou restituir alguma coisa, fazer ou não fazer alguma coisa.
Indicativo de ação ou omissão a ser cumprida pelo devedor, a quem compete o cumprimento da prestação de dar ou de fazer ou o da abstenção do fato, opõe-se ao haver, que representa a ação do credor, pela qual se investe no direito de exigir o adimplemento da obrigação.
Dever. Como substantivo, em ampla acepção, revela a obrigação, que se impõe a toda pessoa, de fazer ou não fazer alguma coisa segundo as regras que se inscrevem no direito e mesmo na moral.
Mas, nesta circunstância, o dever apresenta-se em dupla acepção: dever moral e dever jurídico, somente este sendo, legítima e racionalmente, sujeito a se tornar objeto de uma coação externa.
O dever moral caracteriza-se pelo fato de ser livremente e voluntariamente assumido, não havendo imposição de ordem legal que possa compelir a pessoa a cumpri-lo.
O dever jurídico, dependa ou não da vontade humana, estabelece sempre um vinculum juris, de que se gera a necessidade jurídica de ser cumprido aquilo a que se é obrigado.
Dessa forma, o tanto provém do contrato, para formular especialmente a obrigação criada pelo mútuo consentimento dos contratantes, como decorre do respeito pelos princípios elementares da eqüidade e da ordem jurídica, em virtude dos quais se firma a obrigação de não ofender direito alheio (neminem laedere).
Entretanto, o dever jurídico, fundado na obrigação contratual, dependente sempre da vontade do homem, mais se apresenta como um direito de exigir, pertinente ao sujeito ativo da obrigação, que um dever a cumprir, como sucede ao dever decorrente de uma imposição de ordem legal.
E, neste primeiro caso, o dever difere da obrigação. Esta resulta da própria natureza das coisas e se funda na ação que tem o sujeito ativo sobre aquele que a deve cumprir e sobre as coisas que são de seu objeto. O dever é fundado nas relações que subsistem entre o sujeito ativo, que exige o adimplemento da obrigação, e aquele que a deve cumprir. (2) (destaques no original).

O dever jurídico, como visto acima, deriva da lei e do contrato. Pode derivar, igualmente, da sentença. Difere do dever moral ou ético, ou do dever de cunho religioso, uma vez que todos se traduzem em normas de comportamento desprovidas de juridicidade e coercibilidade.
Não que tais normas não sejam capazes de induzir alguém a determinada conduta. Muitas vezes a pressão do grupo social ou do meio religioso são tão ou mais fortes que a da própria lei, quase que compelindo o indivíduo à conduta ou à abstenção. Trata-se de dever, sim, mas não de dever jurídico, visto que não se opera no âmbito de uma relação jurídica nem possui a necessária correlatividade entre o dever e um direito material, positivado pela norma e imponível coercitivamente.
Tanto o dever quanto o direito constituem efeito decorrente da relação jurídica.
O fato, situado no plano ôntico, que possui importância para o Direito (fato jurídico), ao se amoldar à hipótese de incidência descrita no plano deôntico da norma, opera a subsunção que faz nascer a relação jurídica.
A incidência da regra jurídica faz com que se estabeleçam as posições de cada pessoa nos pólos ativo e passivo da relação jurídica. No pólo ativo estará o titular do direito subjetivo e, no pólo passivo, o indivíduo ou a coletividade juridicamente obrigados pelo dever.

1.2. Regra jurídica e Dever

A primeira análise que se faz necessário realizar, para adentrarmos no tema do dever, que nos conduzirá à compreensão do dever jurídico, diz respeito à regra jurídica.
Regra jurídica não se confunde com o dever, que dela resulta.; dá substrato ao dever.
Segundo Pontes de Miranda, a regra jurídica, como meio inerente ao processo social de adaptação, dirige-se às pessoas, fixando-lhes posições em relações jurídicas. Ao dizer-se que todos os homens são pessoas, a regra jurídica estabelece uma posição ativa para cada uma delas, presentes e futuras, perante todas, menos ela. Ela é pessoa e as outras pessoas têm o dever de tratá-la como pessoa. (3)
Exemplificando, assevera o autor que, “se A, para a regra jurídica, deve entregar a B alguma coisa, deve-a.; B tem o direito a ela. Se A não cumpre o que deve, o Estado tem posição passiva diante de B: a que deriva de sua função de tutela jurídica do direito, razão para que possa B exercer contra ele a pretensão à tutela jurídica e postular seu casus”. (4)
“A regra jurídica, incidindo, faz entrar no mundo jurídico o suporte fáctico.; e a conduta do que deve, do que é obrigado, do que é sujeito passivo da ação ou da exceção, tem de sofrer o que resulta do fato jurídico, exatamente porque tudo isso se passa no mundo jurídico entre personalidades”. (5)
Depreende-se, assim, que na relação jurídica sempre haverá alguém, titular de um direito, que será o sujeito ativo da relação e outro, que deve respeitar esse direito, ocupando a posição de sujeito passivo ou devedor. Ninguém pode ter direitos contra si mesmo, nem dever a si próprio. Daí porque a regra jurídica, ao fixar a posição das pessoas na relação jurídica, exclui de um pólo o integrante do outro.
Esse poder que tem a regra jurídica de fixar a posição das pessoas no âmbito das relações jurídicas, tem por característica a existência de uma correlatividade entre o dever e o direito, ou seja, o titular de um direito sempre terá diante de si alguém, a quem a regra jurídica imporá o dever de respeitar esse direito, que na indeterminação, será toda a coletividade. Analisaremos esse fator mais pormenorizadamente no item a seguir.

1.3. Correlatividade entre direito e dever

Quando a regra jurídica fixa que A tem que entregar uma coisa a B e que portanto A deve fazê-lo, por tornar-se obrigado a isso, implica dizer que B tem o direito à coisa e A o dever. A correlação consiste justamente nesse sinalagma ou relação de reciprocidade que une o direito de um ao dever do outro e vice-versa, no contexto de uma relação jurídica.
Isso não quer significar, conforme adverte Pontes de Miranda, que direito e dever sejam a mesma coisa, vista de dois lados diferentes. (6)
Em verdade, o que ocorre é a correspondência entre o direito, que faz nascer o dever, quando positivado no plano deôntico, gerando a relação jurídica e o direito subjetivo. O direito subjetivo tem, como correlacionado, um dever, imposto pela norma no plano objetivo. No momento em que o direito e o dever são positivados, através da norma, está previsto o modelo que, preenchido pelos elementos fáticos nele descritos, origina a relação jurídica e faz nascer a exigibilidade do comportamento do devedor, como correspondente ao direito subjetivo.
O direito subjetivo, de que é titular a pessoa componente do pólo ativo de uma relação jurídica, permanece em estado de latência para realizar-se quando e se houver o descumprimento do dever por parte do devedor. Esse direito subjetivo, ou facultas agendi, constitui a prerrogativa ou faculdade que o titular do direito objetivo violado possui de invocar a proteção do Estado e exigir a imposição coercitiva do cumprimento do dever jurídico correspondente, ao seu descumpridor.
Citando Vanni, Vicente Ráo assevera que “direito subjetivo é a faculdade concedida aos indivíduos de agir de conformidade com a norma garantidora de seus fins e interesses, bem como de exigir de outrem, aquilo que, por força da mesma norma, lhes for devido”. (7)
O autor descreve o objeto da relação jurídica através das seguintes proposições:

1. A todo poder jurídico uma obrigação correlata corresponde.
2. A relação jurídica pressupõe, necessariamente, uma correlação de poderes e deveres, os quais por sua vez, qualificam os elementos pessoais ativos e passivos dos direitos que formam a relação e lhe dão vida.
3. Relação jurídica não há, nem pode haver, que não consista em relação entre pessoas.
4. A correlação entre os poderes e deveres se caracterizam pelo vínculo jurídico que os unem e atinge os seus respectivos sujeitos ativos e passivos. (8)

Vejamos também os modais deônticos propostos por Aff Ross, para explicar o dever, em suas formas positiva e negativa:
A palavra dever pode ser substituída por prescrição ou por proibição, segundo as regras que se seguem. Afirmar que um ato está prescrito quer dizer que há o dever de realizá-lo.; afirmar que um ato está proibido quer dizer que há o dever de não realizá-lo. Assim:
dever (C) = prescrição
dever (não C = proibição (C), do que se segue que:
prescrição (C) = proibição (não C),
proibição (C) = prescrição (não C).

Ao dever de A corresponde a faculdade de B. B possuir uma faculdade relativamente a A quer dizer que B pode acionar a maquinaria jurídica para obter uma sentença contra A.; ou que o fato de B mover um processo é condição necessária para a possibilidade de condenação de A.” (9)

Direito e dever, portanto, não existem efetivamente um sem o outro. O dever corresponde ao direito. O titular de um direito pode exigir que os posicionados no pólo passivo em relação a tal direito o façam valer e respeitar. De igual modo, não haverá dever divorciado de um direito que se lhe relacione, juridicamente falando, já que o dever pode assumir outras conotações que não a jurídica e obrigar por impositivos morais, religiosos ou culturais.
Para definir dever jurídico, André Franco Montoro o correlaciona ao sujeito (10), asseverando que:
Ao conceito de ‘sujeito passivo’ ligam-se as noções de ‘dever jurídico’ e de ‘prestação’ que constituem importantes categorias jurídicas. O sujeito passivo tem o ‘dever jurídico’ de observar determinada conduta, que pode consistir em um ato ou abstenção (...) o dever jurídico se caracteriza por sua exigibilidade. Ao dever jurídico do sujeito passivo correspondem sempre a exigibilidade ou poder de exigir do sujeito ativo. Dever jurídico é aquele que pode ser exigido por outrem (sujeito ativo). (11)

Para o direito de pessoa individualizada, poderá corresponder um dever de pessoa individualizada ou um dever de todas as pessoas, tal como ocorre na propriedade. Aquele que se faz titular do direito de propriedade tem a prerrogativa de exercê-la em todas as suas potencialidades e todas as demais pessoas têm o dever de respeitar a propriedade e não atentar contra o direito do proprietário. A regra jurídica situa, então, todas as pessoas que não o próprio titular do direito na posição jurídica de sujeitos passivos, logo, devedores. Conforme bem observa Kelsen, “para o direito de propriedade como direito absoluto típico, o proprietário tem um direito típico de exigir de todos a não interferência na posse de sua propriedade”. (12)
Tercio Sampaio Ferraz Junior também traz a lume o pensamento normativo puro acerca das relações jurídicas, dizendo: “Kelsen, por exemplo, diz-nos que relações jurídicas não são relações entre seres humanos concretos, entre pessoas no sentido do senso comum, mas entre normas.; isto é, desde que entendamos que o credor e o devedor, entre os quais se estabelece uma relação, são sujeitos e sujeito é o ponto geométrico da confluência de normas e que credor é o sujeito de um direito, o qual nada mais é que o correspondente comportamento prescrito por normas ao devedor (x deve pagar sob pena de z) e que o devedor é o sujeito da obrigação (conduta prescrita na norma e que evita a sanção), então o que chamamos de relação jurídica nada mais é do que relação entre normas (normas que qualificam os sujeitos, ativo e passivo, normas que lhes prescrevem condutas). A posição de Kelsen, na sua integralidade, nem sempre aceita pela doutrina, mostra, no entanto, que a qualificação jurídica das relações, mesmo que não se adote a tese normativista, implica normas e deve ser definida com a ajuda delas”. (13)
Complementando a lição, valemo-nos do próprio Hans Kelsen, que assinala: “A norma jurídica não estipula a conduta que forma o dever jurídico. Apenas seu oposto, a conduta que é designada como ‘errada’, ‘ilícita’, ‘dano’, ocorre na norma jurídica como condição da sanção, que é o que a norma jurídica estipula. O fato de a norma jurídica vincular certa sanção a certa conduta faz com que a conduta oposta se torne um dever jurídico”. (14)
Já para Pontes de Miranda, nas relações jurídicas de direito das obrigações, os devedores são determinados desde o início, em virtude da natureza do fato de que decorre. Nas relações jurídicas com sujeitos passivos totais, o dever é de todas as demais pessoas.; e a posição passiva nas pretensões e nas ações, ou exceções, depende de algum fato que atualiza o dever, isto é, que caracteriza, no presente, a posição passiva, que o enche de obrigação, que é o correlato de pretensão. Assim, tratando-se de direitos com sujeitos passivos totais, todos têm de abster-se de negar a relação jurídica em que se contêm, ou de que são expressões ativas, ou têm de abster-se de intromissão no espaço que eles ocupam no mundo jurídico. Os deveres que acompanham tais direitos com sujeitos passivos totais, diz o autor, são deveres que vão dirigidos a alguém, titular do direito, dependendo de algum fato o ser perante A ou perante B, ou perante outrem a pretensão, ou a ação, ou a exceção. (15)
Nota-se aqui uma clara distinção quanto aos posicionados nos pólos ativo e passivo da relação jurídica, pois enquanto para o normativismo kelseniano a relação jurídica se opera entre normas, para Pontes de Miranda a relação jurídica se verifica entre pessoas.

1.3.1. Há exceção ao princípio metajurídico da correlatividade?

Conforme pudemos observar, no item 1.3, há uma inarredável correlação entre direito subjetivo e dever jurídico, a ponto de um não existir sem o outro.
Para uma afirmação em favor de alguém, o direito dita uma negação em detrimento de outrem, ou de toda a coletividade, o que se dá sob os auspícios do denominado princípio metajurídico da correlatividade.
A dúvida levantada por Pontes de Miranda opera no sentido de indagar se há exceção a tal princípio, ou seja, se poderá haver, ou não, deveres sem direitos correlatos e direitos sem deveres correlatos, como parece se dar na hipótese das disposições testamentárias a favor de pessoa incerta, mas determinável.
Sua conclusão, no entanto, é em sentido negativo. Enumerando diversos exemplos de situações onde se entende haver direito sem dever correspondente, o autor conclui que o que falta, na verdade, é o exercício da pretensão, em face do que assevera que é ao direito que corresponde o dever e não à pretensão. Pretensão, como veremos, tem por correspondente uma obrigação, no sentido estrito. (16)
Logo, sempre que se estiver diante de um direito, haverá de encontrar-se no pólo oposto, um dever e a identificação dos sujeitos passivos deste dever, sejam eles totais ou individualizados.

1.4. Dever moral e obrigação natural (17)

Muitos dos atos da vida de relação, que se opera entre os seres humanos, e que repercutem no mundo do direito, não possuem por substrato, em sua gênese, imperativos de ordem jurídica, mas sim moral.
O sentimento moral, diz John Rawls, faz parte de uma ligação entre as atitudes morais e as atitudes naturais do homem. Para o autor, a inclinação para os sentimentos morais parece fazer parte dos sentimentos naturais, ou, ainda, sugere que os sentimentos morais são uma característica comum da vida humana. (18)
E acrescenta Rawls, acerca dos sentimentos morais: “Não poderíamos dispensá-los sem eliminar ao mesmo tempo certas atitudes naturais. Entre pessoas que nunca agiram de acordo com o seu dever de justiça, a não ser quando motivadas pelas razões do interesse próprio e da conveniência, nunca haveria laços de amizade e confiança mútua. Pois quando existem esses vínculos, outras razões são reconhecidas para agirmos de forma eqüitativa”. (19)
Partindo de tais considerações, compreende-se que muitas vezes, senão na quase integralidade das vezes, as pessoas sentem-se imbuídas de um dever de ordem moral, que as leva ao adimplemento de suas obrigações, a despeito da exigibilidade jurídica que lhes impõe o cumprimento da prestação obrigacional, ou do dever.
Disso se depreende que nem todos os deveres morais têm efeito jurídico. Para isso ocorrer, é preciso que seja um dever jurídico, ou como efeito jurídico ou como suporte fático de uma regra jurídica, ou seja, fato do mundo moral que serviu à composição do suporte fático que entrou no mundo jurídico.
O exemplo dessa situação é dado por Pontes de Miranda ao elucidar a dicção do artigo 970 do Código Civil, quando diz que não se pode repetir o que se pagou para cumprir obrigação natural, pois se houve prestação e se havia dever moral correspondente a essa prestação, está composto o suporte fático da norma jurídica que veda a possibilidade de repetição (no sentido técnico = devolução) do pagamento. (20)
Caso típico dessa previsão é o de quem paga espontaneamente dívida de jogo, por entender-se moralmente devedor. O mesmo se diga em relação ao devedor que paga dívida já alcançada pela prescrição. O imperativo subjetivo que sustenta o móvel dessas ações humanas, em tais hipóteses, é de ordem moral ou natural e não jurídica.
No Direito Português, o conceito de obrigação natural encontra-se encartado no artigo 402o, do Código Civil Português, que estabelece:
“Art. 402º - Noção. A obrigação diz-se natural, quando se funda num mero dever de ordem moral ou social, cujo cumprimento não é judicialmente exigível, mas corresponde a um dever de justiça.”
E uma vez efetuado o pagamento de obrigação de cunho natural, este não pode ser objeto de repetição, tal qual se dá no Direito brasileiro. Vejamos a dicção do artigo 403º do Código Civil Português:
“Não repetição do indevido. 1. Não pode ser repetido o que for prestado espontaneamente em cumprimento de obrigação natural, excepto se o devedor não tiver capacidade para efectuar a prestação. 2. A prestação considera-se espontânea, quando é livre de toda a coacção.”
O pagamento de dívida prescrita, sob o enfoque do direito italiano, é objeto de análise por Roberto de Ruggiero, que assinala a existência de entendimentos conflitantes quanto à repetibilidade. Diz o autor italiano:

“Sustenta-se, por um lado, que a prescrição extingue a ação e não a relação creditória, que ela é uma causa formal e arbitrária de extinção, que a sua razão reside ou na necessidade de não manter eternamente em suspenso as relações e de não perpetuar os processos, de modo que esse fim cessa quando o devedor pague voluntariamente, ou na presunção de pagamento que desaparece quando o devedor, fazendo-o, nega que antes tivesse tido lugar.; sustenta-se, por outro lado, que a prescrição da ação implica extinção integral do débito, que o seu fim não seria atingido ainda que a relação sobrevivesse na forma sequer mais atenuada de uma obrigação natural, e que é absurdo o suposto fundamento da presunção de pagamento”. (21)

De nossa parte, entendemos que a prescrição pode comportar dois efeitos específicos, atuando em dois planos diferenciados. Um, diz respeito à extinção da própria obrigação jurídica, quando a prescrição opera no sentido de direito adquirido do devedor. É o que se dá com as previsões do Código Civil que afetam a possibilidade de cobrar, por qualquer modo, o crédito, após decorrido certo lapso temporal. O que resta para o devedor é apenas a denominada obrigação natural. Nesta hipótese, se o devedor vem a pagar, mesmo já não mais devendo (juridicamente), por imposição de sua consciência (obrigação natural ou dever moral), não poderá repetir o pagamento, pois não se tratou de indébito.
Outro efeito liga-se ao título executivo ou documento representativo do crédito, gravado por lei com prazo prescricional para o exercício do direito de ação. Na primeira hipótese, o que se perde é a própria pretensão, desaparecendo a obrigação jurídica, embora subsista a obrigação natural. Nesta segunda, o que se perdeu foi apenas o direito à ação executiva do título, que prescrito, passa a ser mero indício de prova da obrigação, ainda exigível pela via ordinária ou pelo procedimento monitório, através, portanto, de outra ação.
No primeiro caso, com o pagamento espontâneo, o dever moral que motivou a prestação não volta a ser dever jurídico, nem efeito imediato da obrigação natural. Apenas compõe o suporte fático que foi subsumido pela norma jurídica fazendo incidir a impossibilidade de repetição (22), já que a lei assevera a impossibilidade de repetir o pagamento.
No segundo, a cobrança do título executivo prescrito é possível porque o credor não deixou de ser credor, nem o devedor livrou-se de sê-lo. Somente a via executiva prescreveu, restando a obrigação incólume.
Pontes de Miranda contradiz o entendimento esposado por alguns autores no sentido de que o dever moral (23) ou obrigação natural é dever jurídico em parte ou dever juridicamente reconhecido pela metade, afirmando que tal postura equivale a pôr o sistema jurídico em contradição consigo mesmo, pois o jurídico é ou não é.; não pode ser e não ser ao mesmo tempo.
Nessa linha de pensamento, voltamos a observar o caráter do dever moral, que ante previsão legal obstativa da repetição, não se converte em jurídico nem passa a sê-lo pela metade ou em parte. O dever é puramente moral, nada comportando de jurídico em sua natureza. O pagamento realizado é que se reveste da impossibilidade de repetição, não porque o dever moral se tenha tornado jurídico, mas porque o ato espontâneo resultante do dever moral, até então inexigível juridicamente, reveste-se de legalidade e não pode ser repetido, já que a repetição, por natureza, pressupõe o indevido ou o ilegalmente pago, o que não é o caso.

1.4.1. Obrigações naturais no direito comparado
Conforme leciona Arnoldo Wald, o direito moderno não mais conhece as razões históricas que deram origem às obrigações naturais em Roma, mas este instituto perdurou, passando a exercer outras funções no ordenamento.
Ainda segundo o autor, o Código Civil Francês não deu o conceito de obrigações naturais, limitando-se a estabelecer o princípio geral de que não é admissível a repetição do pagamento, quanto às obrigações naturais espontaneamente cumpridas.
Já o Código Civil Alemão, além de fazer referência expressa a alguns casos específicos de obrigação natural, prevê princípio geral, no capítulo sobre enriquecimento sem causa, obstando a repetição de pagamento feito quando a obrigação corresponde a um dever moral ou motivo de conveniência, o que, segundo Arnoldo Wald, é repetido no Código Suíço das Obrigações. (24)
Washington de Barros Monteiro também anota a ausência de disciplinamento das obrigações pelo Código Civil Francês, que ao tratar das causas e dos efeitos das obrigações, só se referiu às causas e efeitos das obrigações convencionais, omitindo a regulamentação daquelas que se formam sem convenção, chegando mesmo a equiparar obrigações a contratos. (25)

1.5. Quanto ao conteúdo dos deveres

Partindo da premissa de que todo dever possui um conteúdo e que este consiste em um ato ou uma omissão do devedor, Pontes de Miranda os classifica em pessoais (prestação de serviços, abstenções) ou pessoais-patrimoniais (prestação de coisa ou de dinheiro). Para os atos ligados a dever meramente pessoal, haveria limites relacionados com a possibilidade de quem deve e de como se poderia exigir a prestação. Já para os atos pessoais de natureza patrimonial não haveria limites, de modo que, ainda que não possa pagar a dívida, o devedor continua a dever e está obrigado. (26)
Pode-se deduzir dessas assertivas, que o devedor de uma prestação pessoal consistente em realizar ato ou abster-se de fazê-lo, quando se vê diante de impossibilidade de prestação, seja por não ser capaz de comportar o esforço exigido, ou não possuir habilidade ou capacidade (técnica, artística, etc.), bem como quando o cumprimento do dever importe em risco para outros bens juridicamente tutelados, de escalão igual ou superior (como nos casos de perigo de vida ou para a saúde, sua ou de outrem), pode escusar-se validamente de concretizar o cumprimento de seu dever.
Diferentemente ocorre quando a prestação tem natureza patrimonial. O devedor pode até não possuir bens suficientes para saldar a obrigação. Pode consumir todo o seu patrimônio e restar insolvente. Pode vir a falir ou cair em miséria. Nada disso lhe retira o dever. Mesmo impossibilitado de prestar ou concluir a prestação, pela ausência patrimonial, continua umbilicalmente vinculado à relação jurídica obrigacional. Continua a ser devedor.
Buscaremos elucidar esta idéia através de exemplificação: W toma emprestada de Y certa quantia, obrigando-se a devolvê-la corrigida monetariamente ao final de certo tempo. No vencimento, W não paga. Y, após esgotar as tentativas de receber amigavelmente seu crédito, busca no Estado, através da jurisdição, em execução forçada, que W seja compelido a pagar o que deve. Os bens de W são arrestados, penhorados e alienados em hasta pública. O produto da alienação forçada é entregue a Y e porque W gastara grande parte do valor tomado em empréstimo em viagens pelo mundo, sem qualquer investimento ou capitalização, constata-se que o valor arrecadado foi substancialmente inferior ao que W deveria ter pagado no vencimento. Y recebe apenas parcialmente seu crédito. W já não possui qualquer bem ou haver capaz de responder pela dívida. A execução chega a seu termo e é provisoriamente arquivada.
No exemplo descrito acima, Y continua credor de W da diferença entre o que deveria ter recebido e o que efetivamente recebeu, a despeito da insolvabilidade econômica de W. E sua posição de credor subsiste até que alguma causa obstativa de seu direito se verifique, por constar de previsão legal, como por exemplo, em ocorrendo a prescrição ou a decadência, ou ainda uma circunstância a que a lei atribua o condão de desonerar o devedor.
Pode ocorrer que W nunca venha a possuir outros bens e Y jamais receba a integralidade de seu crédito. Pode se dar, no entanto, que W receba por herança grande fortuna, voltando a ser solvente. Y poderá reassumir a posição de credor que jazia em estado latente e voltar a exigir de W o adimplemento complementar da dívida. Poderá dar-se, também, que W, desta feita, imbuído de um imperativo íntimo (dever de ordem moral), salde espontaneamente sua dívida.
Há que se considerar, ainda, a possibilidade de W pagar a dívida, mesmo depois de Y ter perdido a condição de credor, como por exemplo, em caso de prescrição. Os efeitos do cumprimento dessa obrigação natural já foram analisados quando se tratou das obrigações naturais: o pagamento, em caso de arrependimento, não poderá ser repetido.

1.6. Dever jurídico e obrigação

Há que se distinguir os conceitos de dever jurídico e de obrigação, o que desde já marca uma das referências principais deste trabalho. A doutrina preocupa-se em estabelecer a diferenciação entre ambos, situando cada um desses institutos jurídicos em sua correta posição dentro do Direito, a fim de que não restem confundidos entre si ou tomados como sinônimos absolutos.
Conforme bem observa Mário Júlio de Almeida Costa, a obrigação comporta duas conceituações distintas, sendo uma em sentido lato e outra em sentido estrito ou técnico. Em sentido lato "obrigação designa todos os deveres e ônus de natureza jurídica ou extrajurídica". Apenas neste sentido amplo obrigação se apresenta como sinônimo de dever jurídico. Para o autor, afigura-se mais correto distinguir dever jurídico enquanto gênero e obrigação como espécie desse gênero. (27) - destaques no original.
Em consonância com os ensinamentos de Pontes de Miranda, “para que haja dever, há de haver, pelo menos, direito de alguém, ainda que do Estado, a que esse dever corresponda, - não é o mesmo dizer-se que ao direito há de corresponder obrigação de alguém ao titular do direito, ou, a fortiori, pretensão desse ou ação”. (28)
Segundo o autor, “dever corresponde a direito.; obrigação a pretensão. Todos têm o dever de atendimento dos direitos de personalidade e de propriedade. Daí falar-se em responsabilidade civil quando se trata de dano. (...) Porque à pretensão é que corresponde a obrigação, há direitos sem pretensão e pois, do outro lado, sem obrigação. Não, porém obrigações sem dever.” (29)
A lição é de lógica ímpar. Obrigação é modalidade estrita de dever jurídico. Ao dever jurídico corresponde um direito e à obrigação corresponde uma pretensão que também está calcada em um direito e, por conseguinte, em um dever que lhe é correlato.

1.7. Dever jurídico, sujeição e ônus

Há situações em que a lei impõe a realização de determinadas condutas ou atos jurídicos que não estão em direta correspondência com um direito e um dever jurídico interligados, possuindo uma relação jurídica adjacente ou dela fazendo parte como elemento ou elo de ligação para o surgimento de novas relações jurídicas a partir da concretização de um direito.
Em tais casos, o que se poderá notar é que o ato jurídico a cuja prática alguém está vinculado, não coloca a pessoa que deve praticá-lo na posição de sujeito passivo de uma relação jurídica, uma vez que a este ato não se vincula um outro sujeito no pólo ativo, como titular de um direito.
Isto ocorre porque a pessoa que deve realizar a conduta não possui um dever. É, na verdade, o próprio titular de um direito, que para tutelá-lo ou completar o processo de aquisição do direito e gerar uma relação de sujeição onde as demais pessoas passem a possuir um dever em relação a esse direito, recebe do legislador determinado ônus.
Ao discorrer sobre o Direito das Obrigações, Orlando Gomes estabelece algumas distinções importantes que devem ser observadas para separar o conceito de obrigação do de dever jurídico, bem como de sujeição e de ônus jurídico: “O conceito de obrigação deve ser depurado da intromissão de outras noções jurídicas tecnicamente distintas, tais como as de dever jurídico, sujeição e ônus. A obrigação é, numa relação jurídica, o lado passivo do direito subjetivo, consistindo no dever jurídico de observar certo comportamento exigível pelo titular deste”. (30)
Segundo o autor, o dever jurídico é a necessidade que corre a todo indivíduo de observar as ordens ou comandos do ordenamento jurídico, sob pena de incorrer numa sanção, como o dever universal de não perturbar o exercício do direito do proprietário. (31)
Já a sujeição, traduz a necessidade de suportar as conseqüências jurídicas do exercício regular de um direito potestativo, tal como é o caso do empregado ao ser dispensado pelo empregador. (32)
A sujeição não impõe uma conduta ou abstenção correlata ao direito, mas sim a exigência de ter que suportar o exercício desse direito pelo seu titular sem reagir, sem irresignar-se, porque calcado na lei. (33)
Citamos mais, como exemplificação, a posição de sujeição do cônjuge separado de fato há mais de dois anos, em relação ao pedido de divórcio direto.
A lei, para a concessão do divórcio, exige apenas a comprovação do tempo mínimo de separação. O cônjuge que não concorde com a dissolução do vínculo conjugal não pode opor sua vontade como empecilho para evitá-la. O direito à obtenção do divórcio é potestativo.; independe do consentimento ou da vontade e, portanto, impõe como único comportamento lícito e regular a sujeição. Não há aí qualquer dever ou obrigação. A sujeição decorre da inexistência de mecanismos jurídicos capazes de impedir o exercício do direito por seu titular.
Outro exemplo claro de sujeição é o que se dá em todos os casos que envolvam a Administração Pública, atuando em prol da coletividade e voltada à realização finalística do bem comum (finalidade pública), ocasião em que faz valer a supremacia do interesse público sobre o interesse privado e, por critérios de conveniência e oportunidade, revogando atos jurídicos (administrativos) em detrimento de interesses individuais.
O mesmo ocorre, segundo a mesma principiologia, na desapropriação da propriedade imóvel para atender ao interesse público, cabendo ao titular do domínio a mera discussão quanto à justiça do preço depositado, mas não podendo obstar a atividade administrativa que o destitui da propriedade.
A nosso ver, portanto, a sujeição não é imposta por lei, mas mera decorrência da inexistência de mecanismos jurídicos válidos para impedir o exercício do direito pelo seu titular. Não se impõe qualquer dever. Não há que se fazer ou não fazer, mas apenas sujeitar-se.
O ônus jurídico, por sua vez, impõe a necessidade de agir de certo modo para defesa de interesse próprio. (34) Assim é que o credor pignoratício ou hipotecário, para poder fazer valer seu direito real de penhor ou hipoteca e opô-lo erga omnes, tem o ônus de levar a registro o contrato ou a cédula, no registro de imóveis. O mesmo se diga em relação ao adquirente de bem imóvel, sem cujo registro não será proprietário. O exercício exigido opera em função dos interesses do próprio agente.
Mas não se pode dizer que existe aqui um dever jurídico de qualquer espécie, porque o ônus não se dirige a um devedor situado no pólo passivo da relação jurídica e sim ao próprio titular do direito.
Nem decorre o ônus das relações jurídicas subjacentes. Seria um sofisma alegar que o comprador de bem imóvel tem o dever jurídico de realizar o ato registral, sob pena de poderem todas as demais pessoas privá-lo dos direitos da propriedade. (35)
O que ocorre é justamente o contrário. O comprador de um imóvel é titular de direito em relação ao vendedor. A relação jurídica entre ambos já se estabeleceu. Mas para ser proprietário e poder desfrutar dos amplamente direitos da posse, uso, fruição, gozo e livre disposição do imóvel, com oposição contra terceiros, tem o ônus de levá-lo a registro junto ao cartório de registro de imóveis competente.
Não há na imposição desse ônus uma correlação de direito e dever, daí porque o adquirente não está no pólo passivo de nenhuma relação jurídica que o obrigue a praticar o ato. Se não o fizer, poderá inclusive defender a posse contra qualquer ofensor e, em relação ao que lhe vendeu, conservará toda a plenitude dos direitos advindos da relação jurídica de venda e compra.
Ao cumprir, porém, o ato registral, passa a ser titular efetivo de um direito que, agora, o coloca no pólo ativo de uma relação jurídica, onde todas as demais pessoas da coletividade passam a compor o pólo passivo e ter o dever de reconhecer e respeitar a propriedade e o de tolerar o exercício regular dos direitos, a ela inerentes, pelo seu titular. Daí a condição de ônus ou encargo e não de dever jurídico.

1.8. Dever jurídico e norma jurídica

Para compreendermos o momento em que surge o dever jurídico, faz-se necessário investigar a norma que o implementa, visto que sem o caráter imperativo, inexiste dever passível de ser exigido em face de quem esteja obrigado à prestação, positiva ou negativa.
Logo, no que tange à já estudada correlatividade entre direito e dever, este último só poderá ser classificado como dever jurídico se lhe corresponder uma sanção, prevista na mesma norma jurídica (36) que o instituiu ou em outra que o regule, de forma geral ou especial.
Segundo Norberto Bobbio, o ordenamento se caracteriza como sendo um conjunto de normas, onde se identificam modalidades normativas ou deônticas de regras de conduta, traduzidas no “obrigatório”, “proibido” e “permitido”. (37) Assim, tem-se que, segundo a forma, as normas jurídicas podem ser imperativas, proibitivas ou permissivas.
Propõe, ainda, Bobbio, nove tipos de normas como possíveis resultados da conjugação dessas modalidades deônticas, que seriam: 1) normas que mandam ordenar.; 2) normas que proíbem ordenar.; 3) normas que permitem ordenar.; 4) normas que mandam proibir.; 5) normas que proíbem proibir.; 6) normas que permitem proibir.; 7) normas que mandam permitir.; 8) normas que proíbem permitir.; e, 9) normas que permitem permitir. (38)
Resulta desta ilação que qualquer espécie de norma que, criada sob o desenho de um desses modais deônticos, institua qualquer espécie de direito, seja do particular frente ao Estado, ou vice-versa, ou dos particulares entre si, terá como conseqüente um dever jurídico correlato.
Hans Kelsen situa os fatos e acontecimentos da vida no campo ontológico do ser, ao passo que a norma, que empresta ao fato o caráter de ato jurídico ou antijurídico quer significar algo que deve ser. Diz Kelsen que, “Com o termo ‘norma’, se quer significar que algo deve ser ou acontecer, especialmente que um homem se debe conduzir de determinada maneira”. (39)
Assim entendida a norma, como fator que disciplina um dever ser regulador incidente sobre o fato jurídico, podemos conceber o dever jurídico como estrutura finalística da norma, ou seja, a regra de conduta que se quer alcançar e ver acolhida pelos seus destinatários.
O ato de vontade do legislador, segundo Kelsen, fixa a norma e quando dirigido como um comando regulador da vontade de outrem, estabelece um “dever ser”, uma prescrição normativa.
Norberto Bobbio assevera que frente a qualquer norma jurídica se faz possível o exame por uma tríplice ordem de problemas: 1) se a norma é justa ou injusta.; 2) se é eficaz ou ineficaz.; e 3) se é válida ou inválida. (40)
A dogmática jurídica enfoca a concepção da norma em três planos distintos, quais sejam: o plano da validade, da existência (ou vigência) e da eficácia. Ao invés de avaliar a justiça ou injustiça da norma, a doutrina cuida de examinar se ela possui vigência ou existência jurídica. Vejamos, em síntese, como se opera cada um deles:
a) validade - uma norma, para ser válida, deve primeiramente estar integrada no ordenamento jurídico, onde cumprir-se-ão os processos de formação e produção da norma em conformidade com as diretrizes e requisitos do próprio ordenamento.
b) vigência - “Viger é ter força para disciplinar, para reger, cumprindo a norma seus objetivos finais. A vigência é propriedade das regras jurídicas que estão prontas para propagar efeitos, tão logo aconteçam, no mundo fático, os eventos que elas descrevem”. (41) O momento em que a norma válida alcança o plano da vigência e passa a existir é com a sua publicação. (42) Logo, vigência e existência são sinônimos no que tange a tal plano.
c) eficácia - “A eficácia de uma norma consiste em que esta é, em geral, efetivamente cumprida e, se não cumprida, é aplicada. A validade consiste em que a norma deve ser cumprida, ou, se não o for, deve ser aplicada”. (43) Para alcançar o plano da eficácia, a norma deve ser válida e estar em vigência, em estado que já comporte exigibilidade da conduta por ela descrita.
Logo, para que possa existir o dever jurídico, como correspondente a um direito subjetivo, é necessário que a norma jurídica discipline a conduta comissiva ou omissiva, prescrevendo preceito sancionatório para a inobservância do direito assegurado, ou mecanismos de proteção capazes de fazer valer o direito instituído. (44)

2 – ANÁLISE DO TEMA À LUZ DOS DIREITOS DA PERSONALIDADE

Os direitos da personalidade são aqueles concernentes à pessoa humana. São Inatos, segundo Carlos Alberto Bittar, e “nascem com a pessoa e para a sua individualização no mundo terrestre.; prevalecem sobre os demais direitos, que, em eventual conflito, fazem ceder.; ”. (45)
São considerados direitos absolutos, porque se opõem erga omnes. E quando conflitam entre si, devem ser harmonizados, através de uma solução pacificadora onde um direito não exclua o outro.
Os direitos da personalidade constituem os chamados bens da vida, objeto de tutela pelo Direito, mas cuja individuação revela dificuldades, conforme assevera Gustavo Tepedino: “A dificuldade de individuação do bem jurídico objeto dos direitos da personalidade revela-se na lição de Ferrara, para quem ‘nos direitos absolutos o objeto não é a res, mas os outros homens obrigados a respeitar o seu exercício’. Assim sendo, os direitos da personalidade ‘têm por conteúdo a pretensão de exigir respeito de tais bens pessoais. A vida, o corpo, a honra, são o produto de referência (termine di riferimento) da obrigação negativa que incumbe à coletividade”. (46)
Observa-se desta análise, a figura de sujeito passivo total, por nós já estudada neste trabalho, que emerge no contexto da relação jurídica que se opera entre o titular do direito (de personalidade) e todas as demais pessoas, em face das quais pode exigir respeito aos bens da vida de que se faz titular, visto que são sujeitos passivos detentores de um dever comum.
O tema, no entanto, comporta algumas divergências, acentuando-se a polêmica doutrinária que existe quanto a possuírem os direitos da personalidade um caráter de direito subjetivo ou não e quanto a constituírem um direito propriamente dito.
J. M. Leoni Lopes de Oliveira aponta a primeira dessas dissensões, tratando da natureza jurídica dos direitos da personalidade, onde relaciona, dentre os que negam aos direitos de personalidade o caráter de direito subjetivo, autores como Savigny, Von Tuhr e Enneccerus e, dentre os que lhe atribuem tal caráter, De Cupis, Guido Alpa, Capelo de Sousa e Orlando de Carvalho, posicionando-se, o autor, com a segunda corrente. (47)
O autor condensa, ainda, os apontamentos de Ricardo Luis Lorenzetti, acerca da classificação dos direitos fundamentais, neles incluídos os direitos da personalidade, sob o ponto de vista da evolução histórica, em quatro gerações de direito, resumidamente: Primeira geração: introduzida pela Declaração Universal dos Direitos do Homem, se consubstancia em uma liberdade negativa, dizendo respeito aos limites impostos ao Estado de lesar a liberdade das pessoas, consistindo , por parte do Estado, numa obrigação de não fazer, ou seja, não se intrometer nas liberdades individuais. – Segunda geração: ao garantir os direitos econômico-sociais, procurou exatamente uma atuação do Estado, através de um fazer, para garantir, por exemplo, o direito ao trabalho, a moradia, à saúde, etc. – Terceira geração: visou garantir novos direitos que podem ser sintetizados no objetivo de garantir qualidade de vida, tais como os direitos que protegem bens como o patrimônio histórico e cultural da humanidade, o direito à autodeterminação, à defesa do patrimônio genético da espécie humana. Quarta geração: direitos fundamentais expressos por Lorenzetti como ‘direito de ser diferente’, tais como a homossexualidade, à troca de sexo, ao aborto, etc., por garantir o respeito a comportamentos distintos dos demais indivíduos. (48)
A outra problemática, abordada pela doutrina, diz respeito a ser o direito de personalidade um direito propriamente dito ou um conjunto esparso de direitos da personalidade.
Para falar-se em direitos de personalidade, diz Pontes de Miranda, o problema inicial é o de saber quais os direitos, o seu conteúdo e a sua extensão, quando a pessoa ou algo da pessoa é que é objeto deles e invoca, para demonstrar as divergências quanto à existência e alcance dos direitos de personalidade, três correntes filosóficas distintas:
a) a concepção do direito global de personalidade – o direito de personalidade é tido como um direito, cujo objeto é a pessoa toda, em seu corpo e psique, em sua conservação e movimentos, inclusive quanto ao nome e produtos imediatos.;
b) a concepção pluralística dos direitos de personalidade, para a qual não há direito de personalidade, mas apenas direitos esparsos de personalidade, como o direito à vida, o direito à integridade, física e psíquica, o direito à imagem, ao nome, o direito autoral, etc.
c) a concepção do direito de personalidade uno-plúrimo. O fato de se reconhecer a personalidade, possibilidade de ser sujeito de direitos, mostra, de si só, que se tem a pessoa como titular de direito a essa possibilidade, dependendo das regras jurídicas o determinar-se até onde, quando e como se assegura esse direito.
E conclui o autor, com peculiar clareza: “Não seria de admitir-se, antes de clara e precisa determinação do conteúdo e extensão do direito de personalidade em geral, e dos diferentes direitos de personalidade, dar-lhes proteção jurídica a priori.; nem as limitações aos direitos especiais ligados à personalidade são as mesmas para todos. Um degrau, porém, foi subido, definitivamente. Todo ser humano é pessoa (= todos os seres humanos são capazes de direito.; = Todos os seres humanos podem ser sujeitos de direito).” (49)
Essa vertente de análise, muito importante sob a ótica da personalidade, diz respeito à capacidade de direitos e deveres, que estudaremos a seguir.

2.1. Capacidade civil e capacidade de deveres

Todo ser humano é pessoa e possui capacidade para ser titular de direitos e deveres. Mas não são todos os deveres que podem ser imputados ao ser humano. Para certas categorias de pessoas, que não possuem capacidade civil, certos deveres são inaplicáveis, como é o caso dos loucos de todo gênero, dos surdos-mudos que não conseguem expressar sua vontade, dos ausentes e dos menores de 16 anos, considerados pela lei absolutamente incapazes e que, portanto, não podem responder pelos deveres de administração e gestão de seu patrimônio.
Mas os incapazes podem ter deveres e efetivamente os têm. Nas relações jurídicas que se estabelecem entre os sujeitos ativos de direito e todas as demais pessoas (sujeitos passivos desse direito) o dever se manifesta e o titular do direito pode exigi-lo contra o incapaz, segundo bem observa Pontes de Miranda. Sua incapacidade está, portanto, diz este autor, no campo da capacidade civil e não da capacidade de direito. E esclarece: “se o louco intenta invadir-me a casa, posso usar do que me permitem os arts. 502 (atos de defesa ou desforço possessório) e 160, I (legítima defesa). Se pelo dano, que me causam, não respondem, é porque não têm capacidade para atos ilícitos absolutos, dita capacidade delitual. Respondem os representantes dos incapazes (art. 1.521, I e II).” (50)
Mas são os incapazes os sujeitos de direito e sujeitos de deveres. São eles que “assumem os deveres, sofrem e aproveitam as conseqüências e efeitos dos atos do seu representante legal.; os deveres de conduta estão com esse, porque não as pode ter o que é sujeito ativo ou passivo das relações jurídicas básicas, ou intrajurídicas. O representante obra por eles, que são os sujeitos dos deveres.” (51)
Esclarece ainda Pontes de Miranda que, por ser o incapaz o sujeito dos deveres de prestação e dos deveres de conduta, este, e não o tutor, é que é condenado nas ações contra ele. Mas é o tutor quem suporta as conseqüências do descumprimento, em caso de transgressão ao que foi imposto pela sentença, porquanto é o representante quem responde pela transgressão efetuada pelo representado. Já nos atos de administração dos bens do incapaz, é o próprio tutor que responde porque os atos são seus, é seu o dever e é sua a negligência. (52)

2.2. Deveres das pessoas em geral

Dentre os deveres das pessoas em geral, Pontes de Miranda dá especial destaque ao “dever de não causar dano”. Quem lesa a propriedade de outrem, diz o tratadista, “infringe dever ligado àquela posição de sujeito passivo que hão de ter todas as pessoas diante do direito de A à casa ou outro bem de A. Se, em vez disso, B lesa a propriedade de A, infringe o dever decorrente de sua posição de sujeito passivo, inserto no sujeito passivo total (= ‘todas as outras pessoas’), e responde pelo dano.” (53)
A mesma concepção é expressada por Humberto Theodoro Junior ao atualizar a obra “Obrigações”, de Orlando Gomes, quando faz constar a seguinte nota pessoal: “O dever jurídico pode ser geral ou especial, conforme se concentre numa certa pessoa ou se refira à universalidade das pessoas. Caracteriza-se por exigir um comportamento (ativo ou passivo) do sujeito em favor de terceiro, sob pena de sanção.” (54)
Observa-se, portanto que nos direitos de personalidade e direitos de propriedade, o titular do direito se posta ante as pessoas em geral, que compõem o “sujeito passivo total”. Assumem, todas as pessoas, a condição de sujeitos passivos, titulares do dever jurídico de não causar qualquer ofensa ou dano ao direito tutelado, do sujeito ativo.

2.3. Dever jurídico e dever de prestar

Conforme analisamos anteriormente, a obrigação pode derivar da lei, do contrato ou da sentença. E para o descumprimento da obrigação existe correlato dever de indenizar, sempre que o ato ou omissão cause dano. O ilícito, portanto, sempre será objeto de reparação por parte do causador da ação ou omissão danosa.
Segundo Pontes, haveria três princípios acerca das doutrinas gerais dos delitos (no sentido de fatos ilícitos, compreendidos, portanto, atos ilícitos, atos-fatos ilícitos e fatos ilícitos), a saber: o princípio da contrariedade a direito, o princípio da culpa, o princípio do nexo causal. Mas nem sempre, para falar-se em dever de reparação, haverá transgressão da regra jurídica. E esclarece: “Há diferença entre a antijuridicidade como elemento do suporte fáctico, em direito penal, e como elemento de antijuridicidade que se exige para suporte fáctico, em direito privado. No direito penal, a violação da lei é que contém os elementos do suporte fáctico, de modo que ela, em si, não o é”. (55)
Para o autor, há indenizações que não resultam de infrações de dever de atividade ou de omissão, daí porque, ao falar-se em dever de indenizar, “já se considera irradiado o efeito do ato, positivo ou negativo, que pode não ter sido ilícito. São os casos dos arts. 1.519 e 1.520 do Código Civil, em que se prevê que a remoção de perigo iminente, com deterioração ou destruição de bem alheio (art. 160, II) (56), faça responsável quem o removeu e, regressivamente, terceiro, culpado do que se deu”. (57)
Quando cuidou da “Ação de Reparação de Danos por Ato-fato Ilícito”, em seu célebre “Tratado das Ações”, Pontes de Miranda dedicou o item introdutório ao conceito e natureza do dever de prestar frente à ocorrência do estado de necessidade.
Como uma das vertentes do dever jurídico, imposto pelo ordenamento positivo, o dever de reparar o dano ou dever de prestar, afigura-se como eficácia do ato-fato jurídico e não como ato ilícito, uma vez que não há, segundo afirma, sequer contrariedade a direito.
E explica, textualmente: “A obrigação de reparar o dano incumbe ao agente, pois foi ele que o causou. Não importa se o fez para salvar coisa sua, ou a si mesmo, ou se para salvar a outrem, ou a coisa de outrem”. (58)
Trata-se, segundo o autor, de ato-fato jurídico lícito, mas que se deve reparar, porquanto foi praticado para salvar o que é seu ou a si mesmo, sem culpa do dono da coisa que se perdeu. (59)
Ainda segundo Pontes de Miranda, desta feita no clássico “Tratado de Direito Privado”, já tantas vezes mencionado no curso deste trabalho, o dever de prestar também é apresentado como conseqüência sancionatória pela infração de deveres. O dever de reparar o dano, pode resultar da infração de dever, ou ser o dever originário. E esclarece: “Se o dono da coisa, no caso do art. 160, II, não foi culpado do perigo, tem direito a haver do que praticou o ato em estado de necessidade o prejuízo.; esse, sem contrariedade a direito, causou dano (elemento fáctico), e ressarce. Não é em virtude da violação de dever que ressarce, é em virtude do dever que o art. 1.519 criou. Não se pode, todavia, estender ao dever do art. 877 o mesmo raciocínio (sem razão, A. Von Tuhr, Der Allgemeine Teil, I, 99) : o dever originário é de prestar.; se não presta o que deve, responde o devedor”. (60)
Como se vê, trata-se de duas situações diametralmente divergentes: uma em que o dever de prestar surge como decorrência da infração ao dever jurídico e outra onde inocorre violação ao dever, porque o ato é lícito e respaldado na lei. Mas a própria lei criou mecanismo para impor novo dever de prestar (a reparação), quando o dano for causado no exercício do ato lícito, para que o titular do direito, que não deu causa ao dano, não reste indene.
Assim, tanto na violação de dever jurídico (ilícito) quanto na prática de ato lícito, o dano haverá de ser reparado por quem o causou.
Se A, dirigindo seu auto, empreende manobra emergencial para não atropelar BY, menor impúbere, filho de C, que brincava sozinho na pista de rolamento e se dessa manobra vem a ser abalroado o carro de Y, não se pode dizer que A praticou ilícito. Seu ato, causador de dano, resultou da prática de ato acobertado pela licitude, porque ofendeu um bem jurídico de menor valor para resguardar um outro bem jurídico, de maior valor, que é a vida ou a integridade de B.
Y, no entanto, teve seu bem danificado e não poderá restar ausente de indenização. A, causador do dano, terá que indenizar a Y o prejuízo que lhe causou. A, entretanto, poderá exigir de C, pai do menor, que falhou no dever de vigilância e tornou o filho objeto causador do evento danoso, a indenização direta do dano que sofreu em seu conduzido, bem como regressivamente, o que teve que pagar para indenizar os danos causados a Y.
Não se trata, porém de hipótese de responsabilidade sem culpa. A culpa é elemento embasador da responsabilidade em nosso Direito. A Constituição Federal de 1988 afastou a necessidade de comprovação da culpa grave ou gravíssima, o que importou em um substancial elastecimento da responsabilidade, inclusive para os casos onde a culpa é leve ou levíssima. Mas a Carta Magna, é de se observar, não descartou o elemento subjetivo. A culpa dos pais, pelos atos dos filhos, é presumida.
José de Aguiar Dias, ao tratar da culpa e da responsabilidade sem culpa, cita a doutrina francesa: “Diante disso, indaga Josserand se não convém ir mais longe, abandonando essa noção de culpa, tão desacreditada, para admitir que somos responsáveis, não somente pelos atos culposos, mas pelos nossos atos, pura e simplesmente, desde que tenham causado um dano injusto, anormal. O faiseur d’actes deve responder pelas conseqüências de suas iniciativas. Por essa concepção nova, abstrai-se de idéia de culpa: aquele que cria o risco responde, se ele se vem a verificar, pelas conseqüências lesivas a terceiros. Não comete falta quem, com licença da administração, monta um estabelecimento incômodo, insalubre, perigoso, ruidoso ou pestilencial. Mas é obrigado a indenizar os vizinhos prejudicados pelo seu funcionamento”. (61)
Nosso Direito, no entanto, não contempla a responsabilidade aquiliana ou extracontratual sem o elemento subjetivo culpa (em sentido lato). A responsabilidade objetiva somente se verifica em situações especiais, como ocorre em relação ao Estado, pelos atos de seus agentes. É também objetiva a responsabilidade no âmbito das relações de consumo, albergadas pelo Código de Defesa do Consumidor, como também a infortunística do trabalho na esfera previdenciária. Note-se que o campo é o da contratualidade.
Já no campo extracontratual, em que pese a defesa da responsabilidade civil objetiva por alguns autores, é certo que o ordenamento jurídico brasileiro continua a contemplar a responsabilidade subjetiva, vinculando a responsabilidade extracontratual à culpa, o que ocorre inclusive através de postulado fundamental (CF, art. 7o, XXVIII).

2.4. Colisão de deveres

A doutrina assinala a possibilidade de ocorrer casos de colisão de deveres. O exemplo clássico é o depositário A que recebeu a coisa em depósito de seu possuidor B mas a tem reclamada por alguém, C, que se apresenta como proprietário da coisa ou titular de direito real sobre ela.
Existirão, no caso, dois deveres distintos do depositário, em planos jurídicos diferenciados. Um, em relação ao depositante, que é o dever de devolver a coisa e outro, em relação ao proprietário, ou titular de direito real, que a reclama.
No plano do direito material, diz Pontes de Miranda, “o devedor pessoal deve devolver a coisa ao seu credor (locador, comodante, empenhante, depositante), ainda que saiba ser dono outra pessoa: não tem o devedor função de tutela jurídica, para conhecer e julgar da propriedade de terceiro, se a coisa lhe veio de outrem, que talvez tenha outros argumentos”. (62)
E continua, mais adiante: “se A entrega a C, em vez de a B, de quem houve a sua posse, A procede a seu risco e faz justiça a si mesmo, pois o seu ato é de julgamento fora da justiça estatal.; (...) há na recusa pelo que conhece a relação de propriedade ato de acordo com o direito, e não contrário ao direito”. (63)
É certo porém, que no plano processual, se o depositário (devedor) for demandado pelo proprietário, somente poderá recusar-se a entregar a coisa ao proprietário se o depositante tiver direito de possuí-la. Da mesma forma, se o depositante a exigir judicialmente, não poderá alegar o direito do proprietário para recusar a devolução. (64)
E mais, uma vez proposta ação reivindicatória da coisa pelo proprietário, em face do possuidor, este já não poderá devolvê-la ao depositante, salvo se este último comparecer no feito e integrar a relação jurídica processual. Completa Pontes de Miranda, que “a nomeação à autoria é dever, se o réu quer entregar a coisa.; se o nomeado não comparece, tem o nomeante de prosseguir na causa, para não perder o direito à responsabilidade pela evicção, ou entregar a coisa ao autor. Idem, se o nomeado nega a afirmação do nomeante”. (65)

2.5. Deveres do tipo não fazer e incapazes

O artigo 1.521, do Código Civil de 1916, prevê a responsabilidade dos pais pelos atos praticados por seus filhos menores.
Segundo Caio Mário da Silva Pereira, trata-se de responsabilidade que resulta da presunção de culpa dos pais, pelos atos dos filhos. E completa: “É um complemento do dever de educar os filhos e manter vigilância sobre os mesmos. Não há mister prove a vítima a falta de vigilância, nem se exime o pai com a alegação de que não faltou com ela e com a educação. A responsabilidade assenta na presunção de culpa”. (66)
Conforme observa Sergio Cavalieri Filho, ao discorrer sobre a responsabilidade por fato de terceiro, a regra que se opera, em sede de responsabilidade civil extracontratual subjetiva, é que “cada um responda por seus próprios atos, exclusivamente pelo que fez. (...) É o que se chama de responsabilidade direta, ou responsabilidade por fato próprio, cuja justificativa está no próprio princípio informador da teoria da reparação. Excepcionalmente, uma pessoa pode vir a responder pelo fato de outrem. Temos, então, a responsabilidade indireta, ou responsabilidade pelo fato de terceiro. Isso, entretanto, não ocorre arbitrária e indiscriminadamente. Para que a responsabilidade desborde do autor material do dano, alcançando alguém que não concorreu diretamente para ele, é preciso que esse alguém esteja ligado por algum vínculo jurídico ao autor do ato ilícito, de sorte a resultar-lhe, daí, um dever de guarda, vigilância ou custódia”. (67)
Consoante Louis Josserand, são três as hipóteses previstas no Código Civil Francês, de responsabilidade por fato de outrem, ou fato alheio: “La responsabilidad por el hecho ajeno se impone por el artículo 1384, en su redacción actual: 1o Al padre y a la madre, por los daños causados por sus hijos menores.; 2o A los artesanos por el hecho de sus aprendices.; 3o A los comitentes, por el hecho de sus comisionados”. (68)
Parece lógico, portanto, que os pais sempre responderão pelos atos de seus filhos menores. Mas a indagação que nos surge aponta para outro enfoque: no campo dos deveres e direitos, quem é o sujeito passivo, quanto à conduta ou abstenção? O menor ou seus pais?
De tudo quanto analisamos neste trabalho, o sujeito passivo da obrigação é o menor, assim como o seria o louco, ou qualquer outra pessoa reputada incapaz. A obrigação dos pais, ou do tutor ou curador, independe do que faça ou deixe de fazer para assegurar o cumprimento do dever jurídico pelo menor. No âmbito da propriedade, o titular do direito tem como sujeitos passivos totais todas as demais pessoas, sejam elas capazes ou não. Se um menor ou qualquer outro incapaz invade a propriedade, o proprietário pode exercer todos os direitos dela decorrentes, inclusive proteger a posse, com todos os meios permitidos em lei.
Mas se dessa invasão resulta dano, responde o responsável legal. O dever de não invadir é do incapaz, mas o de reparar os danos resultantes do descumprimento do dever é de quem responde pelo incapaz, pois já não se estará na esfera do comportamento lícito, mas sim do ilícito.
“Os absolutamente incapazes, irresponsáveis pelo ato ilícito, são-no pelos atos-fatos jurídicos: a ação baseada no ato em estado de necessidade vai contra eles, bem assim a regressiva, sempre que o atuante, salvando interesses deles, danificou bem de terceiro”. (69)
Outra situação se nos afigura, nesta exemplificação: se o proprietário desejar impor uma abstenção específica ao incapaz, para que faça cessar o desrespeito contumaz a seu direito de propriedade, deverá intentar contra quem a ação? Contra o incapaz ou contra seu representante legal?
Como já vimos em Pontes de Miranda, o incapaz é que é sujeito dos deveres de prestação e dos deveres de conduta. É ele, e não seu tutor ou curador, “que é condenado nas ações contra ele, inclusive quanto às sentenças de condenação a emitir declaração de vontade. (...) Se a sentença condena a praticar ato ou omissão, é ao incapaz que ela condena (Código de Processo Civil, arts. 998-1.005 e 1.007).; como, porém, o absolutamente incapaz não tem capacidade delitual (e a sentença comina pena), é o tutor que acarreta com as conseqüências, em caso de transgressão ao que a sentença impôs”. (70)
O excerto transcrito dispensa outros esclarecimentos.
Assim, observa-se que a capacidade de direitos e deveres guarda diferenciações em relação à capacidade civil e que o dever jurídico se estende à totalidade das pessoas quando correlato a certos direitos absolutos, como os de propriedade e da personalidade, sobretudo estes últimos.
Notas conclusivas:
1 – Existe para todo direito subjetivo um dever jurídico correlato, que pode ser próprio de uma única pessoa (sujeito passivo individual) ou alcançar toda a coletividade (sujeitos passivos totais). A correlatividade traduz-se em princípio metajurídico e não admite exceções.
2 – Sujeito ativo e sujeito passivo, titulares do direito e do dever, respectivamente, ligam-se através de uma relação jurídica. É a regra jurídica que fixa a posição de cada um dos sujeitos nos respectivos pólos da relação jurídica.
3 – O dever jurídico é elemento sinalagmático correspondente a um direito subjetivo.; não se confunde com a obrigação em sentido estrito, visto ser gênero da qual esta é espécie, nem com as figuras do ônus jurídico e da sujeição.
4 – O ônus difere do dever e da obrigação, pois se trata de ato que deve ser praticado pelo próprio credor, não em cumprimento de um dever, mas para assegurar e dar guarida a seu próprio direito.
5 – A sujeição, por sua vez, não implica em dever jurídico, nem de fazer nem de deixar de fazer alguma coisa, mas impõe ao sujeito de dada relação jurídica uma abstenção de oposição ao exercício lícito de certo direito pelo seu titular.
6 – Nem todo dever é jurídico, haja vista existirem deveres de natureza moral, como sói ocorrer com as obrigações naturais, onde a vinculação do devedor é meramente de cunho íntimo, psicológico e subjetivo, não possuindo um correspondente na norma agendi, de caráter impositivo, que o obrigue sob pena de sanção.
7 – O dever moral e a obrigação natural dele decorrente, quando levam à prestação, não admitem repetição.
8 – Enquanto para todo dever corresponde um direito, para toda obrigação corresponde uma pretensão. A prestação é o objeto da obrigação, seja ela positiva ou negativa, de dar (coisa certa ou incerta), de fazer, ou de não fazer.
9 – Quanto aos direitos da personalidade, pode-se dizer que são inerentes à pessoa humana e dela indissociáveis. A despeito das discussões filosóficas acerca de seu caráter de direito propriamente dito ou de direitos esparsos de personalidade, o certo é que todos os seres humanos os possuem, restando delimitar-se a extensão e aplicabilidade desses direitos a cada caso.
10 – Todas as pessoas são passíveis de serem sujeitos de direitos e deveres, mas nem todos podem ser sujeitos de todos os deveres, em razão da incapacidade.
11 – Todos os que se situam no pólo passivo de uma relação jurídica, seja sela obrigacional ou não, têm o dever de prestar. O dever de prestar decorre do dever de não causar dano a outrem e impõe a reparação do dano independentemente de tratar-se de ato ilícito ou ato-fato jurídico, lícito ou ilícito.
12 – O ato praticado em estado de necessidade ou outra excludente de ilicitude penal, gera para quem o praticou o dever de reparar o dano causado a outrem, se este último não laborou com culpa para que o dano se produzisse.
13 – Mesmo no campo dos direitos subjetivos, ocorre um correspondente dever de prestar (atividade ou omissão) de todas as pessoas em relação ao titular do direito e qualquer dano causado, mesmo que no exercício de ato-fato lícito, deve ser reparado.
14 – Os incapazes, embora não possuam capacidade delitual, podem ser devedores e figurar no pólo passivo da relação jurídica. Podem ser sujeitos de direitos e obrigações, quando assistidos ou representados, conforme o caso. E quando atuam ilicitamente, sendo a incapacidade decorrente da menoridade, por eles responde seus pais, por culpa presumida.

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Notas:

1 Esta assertiva de De Plácido e Silva revela-se importante, pois significa tratar-se de termo jurídico isento de ambigüidades e livre dos inconvenientes gerados pela polissemia.
2 SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1973, pp. 522-523. V. II.
3 MIRANDA, Pontes de. Tratado de direito privado. Parte Geral. T. V. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1983, p. 422.
4 Idem, ibidem.
5 Cf. Pontes de Miranda, T. V., p. 435.
6 Idem, ibidem., p. 423.
7 RAO, Vicente. O direito e a vida dos direitos. 5. ed. (Anot. e atual. por Ovídio Rocha Barros Sandoval). São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 191.
8 Cf. ob. Cit., p. 794.
9 ROSS, Alf. Direito e justiça. (Trad. Edson Bini – rev. Técnica Alysson Leandro Mascaro). Bauru, SP: EDIPRO, 2000, p. 194.
10 Sujeito: Toda relação jurídica pressupõe intersubjetividade, ou seja, requer um sujeito ativo, que é a pessoa titular do direito e que pode exigir o cumprimento da prestação e de outro lado, um sujeito passivo, que é aquele obrigado a realizar esta prestação.
11 MONTORO, André Franco. Introdução à Ciência do Direito. 25. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000, p. 458.
12 KELSEN, Hans. Teoria geral do direito e do estado. (Trad. de Luís Carlos Borges). 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2000, p. 122.
13 FERRAZ JUNIOR, Tercio Sampaio. Introdução ao estudo do direito: técnica, decisão, dominação. 2.ed. São Paulo: Atlas, 1994, p. 165.
14 KELSEN, Hans. Teoria geral do direito e do estado., p. 88.
15 Cf. Pontes de Miranda. Tratado de direito privado, p. 441.
16 Idem, ibidem, pp. 423-425.
17 Pontes de Miranda define dever moral, como sinônimo de obrigação natural, quando referidos pela lei, como o elemento do dever moral que o sistema jurídico admitiu no suporte fático de alguma regra jurídica sobre eficácia (cf. ob. cit., p. 427).
18 RAWLS, John. Uma teoria da justiça. (Trad. Almiro Pisetta e Lenita M. R. Esteves). São Paulo: Martins Fontes, 2000, pp. 539-541.
19 Idem, ibidem, p. 541.
20 Cf. Pontes de Miranda, Tratado de direito privado, T. V, pp. 425-426.
21 RUGGIERO, Roberto de. Instituições de direito civil. Campinas: Bookseller, 1999, p. 60.
22 Cf. Pontes de Miranda, ob. cit., p. 425.
23 A edição consultada da obra de Pontes de Miranda, na página 426, segundo parágrafo, ao que parece, usou indevidamente a expressão “dever jurídico” em lugar de “dever moral”, o que seria contraditório pela própria disposição das idéias e dos termos ali empregados. Por estarmos crentes de tratar-se de equívoco, tomamos a liberdade de corrigir a redação no momento de reproduzir o pensamento do autor.
24 WALD, Arnoldo. Curso de direito civil brasileiro. Obrigações e contratos. 4. ed. São Paulo: Sugestões Literárias, 1974, pp. 19 a 21.
25 Cf. MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil. Direito das obrigações. 1. parte. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 1985, pp. 46-47.
26 Cf. Pontes de Miranda, ob. cit. p. 427.
27 COSTA, Mário Júlio de Almeida. Direito das obrigações. 7. ed. Coimbra: Almedina, 1998, pp. 53-57.
28 Cf. Pontes de Miranda, Tratado de direito privado. Tomo V, p. 438.
29 Cf. Pontes de Miranda, idem, p. 427.
30 GOMES, Orlando. Direito das obrigações. 12. ed. (At. Por Humberto Theodoro Junior). Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 6.
31 Cf. Orlando Gomes, ob. cit., p. 6.
32 Idem, ibidem.
33 Idem, ibidem.
34 Cf. Orlando Gomes, Direito das obrigações, p. 6.
35 Tanto é assim que Pontes de Miranda cuidou de tratar dessa espécie de ônus, que denominou de atos para aquisição ou perda, dizendo: “Não é dever o que é apenas pressuposto para a aquisição ou perda de algum direito, ou para o exercício dele” (cf. ob. cit., p. 447).
36 E aqui o qualificativo “jurídica” se faz relevante, visto que também há outras espécies de normas não jurídicas, tais como as normas éticas, as normas técnicas e as normas de ordem moral.
37 BOBBIO, Norberto. Teoria do ordenamento jurídico. 9. ed., (Trad. Maria Celeste C.J.Santos). Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1997, p. 31.
38 Idem, pp. 47-48.
39 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. São Paulo: Martins Fontes, 2000, p. 4.
40 BOBBIO, Norberto. Teoria della norma giuridica. Torino: G. Giappichelli Editore, 1958, p. 35.
41 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 1999, pp. 82-83.
42 A publicação é o ato pelo qual a norma adquire existência e passa a viger. Trata-se a publicidade de princípio constitucional que se aplica a todos os Poderes, em todas as suas esferas. Publicada no órgão oficial e circulada, a norma tem marcado seu início de vigência (se outra coisa não dispuser em seu texto), presume-se de conhecimento de todos, não se lhe podendo alegar ignorância e marca o termo inicial dos direitos e deveres que encerra em seu bojo.
43 DINIZ, Maria Helena. A ciência Jurídica. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 1995, p. 47.
44 Sobre os planos de validade, vigência e eficácia da norma jurídica, ver DAL COL, Helder Martinez. Classificação das normas jurídicas e sua análise, nos planos da validade, existência e eficácia. Artigo publicado na Revista Tributária e de Finanças Públicas, nº 42, Rio de Janeiro: Editora RT, jan/fev/2002, pp. 9-23 e na Internet, pelo Site Jus Navigandi: http://www.jus.com.br.
45 BITTAR, Carlos Alberto. Teoria geral do direito civil. São Paulo: Forense Universitária, 1991, p. 108.
46 TEPEDINO, Gustavo. Temas de direito Civil. Rio de Janeiro: Renovar, 1999, p. 31.
47 OLIVEIRA, J.M. Leoni Lopes de. Direito civil. Teoria geral do direito civil. 2. ed. V.2. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2000, pp. 176-179.
48 Cf. J.M. Leoni Lopes de Oliveira, ob. cit., pp. 185-186.
49 Cf. Pontes de Miranda, ob. cit.. T. V., pp. 443-444.
50 Idem, ibidem, p. 431.
51 Idem, ibidem, p. 432.
52 Idem, ibidem, p. 432.
53 Idem, ibidem, p. 433.
54 GOMES, Orlando. Direito das obrigações. 12. ed. (At. Por Humberto Theodoro Junior). Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 7.
55 Cf. ob. cit., T. LIII, p. 48.
56 Art. 160. Não constituem atos ilícitos: I – Os praticados em legítima defesa ou no exercício regular de um direito reconhecido. II – A deterioração ou destruição da coisa alheia, a fim de remover perigo iminente (arts. 1.519 e 1.520). Parágrafo único. Neste último caso, o ato será legítimo, somente quando as circunstâncias o tornarem absolutamente necessário, não excedendo os limites do indispensável para a remoção do perigo.
57 Cf. Pontes de Miranda, ob. cit., T. LIII, p. 46.
58 MIRANDA, Pontes de. Tratado das ações. 1. ed. (atual. Vilson Rodrigues Alves). Campinas: Bookseller, 1999, pp. 147-148. T. 5.
59 Em sua obra “Tratado das Ações”, p. 29, T. 1, Pontes de Miranda define ato-fato jurídico, dizendo: “Os atos-fatos jurídicos são os fatos jurídicos que escapam às classes dos negócios jurídicos dos atos jurídicos stricto sensu, dos atos ilícitos, inclusive atos de infração culposa das obrigações, da posição de réu e de executado (ilicitude infringente contratual), das caducidades por culpa, e dos fatos jurídicos stricto sensu. Abrangem os chamados atos reais, a responsabilidade sem culpa, seja contratual seja extracontratual, e as caducidades sem culpa (exceto o perdão). Ainda quando, no suporte fático, de que emanam, haja ato humano, com vontade ou culpa, esses atos são tratados como atos-fatos.”
60 Cf. Pontes de Miranda, Tratado de direito privado, T. V, p. 437.
61 DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995, p. 63. V. I.
62 Cf. Cf. Pontes de Miranda, Tratado de direito privado, T. V, p. 449.
63 Idem, ibidem, p. 449.
64 Idem, ibidem, p. 448.
65 Idem, ibidem, p. 450.
66 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade civil. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1994, p. 89.
67 FILHO, Sergio Cavalieri. Programa de responsabilidade civil. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 1998, p. 110.
68 JOSSERAND, Louis. Derecho civil. (Traducción para el español de Santiago Cunchillos y Manterola). Buenos Aires: BOSCH Y Cia. Editores, 1950, p.380. T. II, V. I.
69 Cf. Pontes de Miranda, Tratado das ações, T. V., p. 149.
70 Cf. Tratado de direito privado, T. V, p. 432.
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