Publicado no jornal O POVO, dia 24 de julho de 2004
A tão propalada reforma do Poder Judiciário, aprovada em primeiro turno, traz a equivocada esperança de ver-se instalada uma Justiça nova e modelar
Antônio Marques Cavalcante Filho é presidente do Tribunal Regional do Trabalho (TRT - 7ª Região)
Após mais de dez longos e injustificáveis anos de tramitação congressual, vem de ser aprovada, embora em primeiro turno, a tão propalada reforma do Poder Judiciário. Nela, a equivocada esperança de ver-se instalada, com a promulgação respectiva, uma Justiça nova e modelar, inspirada na utopia de uma estrutura organizacional externamente controlada e interna e judicialmente subordinada ao pensamento jurídico dos Tribunais Superiores, livre, assim, e não me indaguem por que, dos tentáculos da morosidade e de outras mazelas, inegavelmente obliterantes da razoável fluidez e da proficuidade de seus processos e julgados.
Jogo cênico, simplesmente. Os atores, olvidados de seus verdadeiros papéis, simulam, ante platéia ignara e de fácil persuasão, atuação teatral de curso instigante e absorvente, mas sem desfecho compatível com a expectativa criada.
É que, em verdade, distanciada de meras formulações constitucionais, a solução dos graves entraves que emperram a máquina judiciária está na modernização do aparelho judiciário, no alargamento das possibilidades orçamentárias aos tribunais e na melhoria das condições de trabalho de juízes e servidores.
Demais disso, é mister, para a melhor prestação jurisdicional, sendo este o mais eloqüente anseio da sociedade hodierna, que juízes e advogados, enquanto indispensáveis à administração da justiça e, assim, compenetrados de seu relevante papel na persecução de tão conspícuo bem comum, conjuguem, no evolver de suas atividades forenses, as mais austeras gestões na busca da rapidez e da modicidade nas soluções judiciais, sem prejuízo, é bem de ver, da proficiência dos julgados.
A produção de provas desnecessárias, especialmente a juntada impertinente de copiosa documentação, o deferimento de diligências inúteis, as petições quilométricas, mais das vezes em termos repetitivos, onde a prolixidade verbal sobreexcede a substância fático-jurídica, ressumbrando o viso único de impressionar constituintes, os despachos judiciais que meramente postergam decisões merecedoras de pronta prolação, num desfiar pletórico de fale a parte contrária , não por amor ao contraditório, constitucionalmente assegurado, mas em lhe abusando, com flagrante prejuízo processual. Tudo isso, enfim, inclusive a indiferença, diria até, em alguns casos, a displicência e a pusilanimidade de juízes, coonestando ou instrumentalizando a chicana de astuciosos advogados, constitui, por excelência, a razão da crise judiciária porque passamos, explicando, em especial, a eternização dos processos e seu elevado custo ao Estado e, notadamente, aos jurisdicionados, de quem são cobradas custas e emolumentos escorchantes, que lhes obliteram o acesso ao Poder Judiciário, em patente negação de justiça.