Antes de tudo, parabéns pelo seu texto “O Clubinho Cor de Rosa”. Você conseguiu descrever com perfeição o nosso retrato íntimo...
Estou fazendo o que você me pede, simplesmente porque não nos conhecemos pessoalmente e penso que não nos conheceremos jamais. Faço isso, porque leio muito do que você escreve, e sei da seriedade que trata todos os assuntos. Também porque sei que não fará nada que não tenhamos combinado, como parece ser do teu feitio... Aliás, parabéns por ter me encontrado de forma tão genial.
A pergunta que me fez deve mesmo ser muito intrigante para os outros, mas não pra mim. Tenho a vida toda pra pensar sobre o assunto, e creio que vá entender muito bem a minha posição.
Creio que você seja uma pessoa “normal” do ponto de vista sexual. Um “macho” pelo que posso perceber. E se não estou enganado nisso, você como todas as pessoas normais, se olha no espelho e pode ou não gostar do que vê. A maioria das pessoas normais, não gosta de alguma coisa em si: da sua altura, ou de seus cabelos, ou do seu peso, etc. E algumas dessas coisas que as pessoas (normais) não gostam, podem ser mudadas. Por exemplo, ela pode ir ao salão, ao cirurgião plástico, ou à academia, para dar uma corrigida, ou fazer qualquer outro exercício para mudar o seu visual. Concorda?
Porque é que uma pessoa normal quer mudar o que não gosta no próprio corpo? Não é justamente porque é normal? É porque não vê totalmente refletida em si a imagem perfeita dessa normalidade que lhe foi passada por conceitos...
Uma outra questão: As pessoas normais gostam de pessoas do outro sexo. Isso é normal, não é?
Bem, mas você pode pensar que uma pessoa de repente sinta que não está no corpo certo. Ainda estou falando de pessoas (quase) normais. Suponhamos que alguém seja, por exemplo, um anão. Ele se sente num corpo errado a vida toda (e pode mesmo estar num corpo errado). Um aleijado de nascença também pode pensar que a sua vida está destruída, porque está no corpo errado. (E ninguém pode condenar um aleijado por querer ser “perfeito”).
É justamente o que eu sinto. Estou no corpo errado. Nasci com o sexo trocado, e nada mais que isso. Tenho a mesmíssima culpa de ser assim, que tem um outro por ser epilético... E o que me deu mais coragem de escrever, foi que você disse que somos mais o que pensamos que o nosso próprio corpo. E se é assim, eu penso que o que está errado em mim é meu corpo, e não meu pensamento. Se eu fizesse uma transmutação de sexo, estaria fazendo o que minha consciência pede, porque desde que tive consciência de minha vida, que tenho uma estranha sensação de que estou numa “casa” errada.
Sei que algumas pessoas podem estranhar o que estou dizendo, mas quando a maioria se deu conta, já era um menino ou uma menina. Os cromossomos determinaram isso muito antes delas terem essa consciência. Mas comigo as coisas foram trocadas. Minha mente é “XX” enquanto meu corpo é “XY”. E é justamente isso que acontece conosco (os “cor de rosa”), e não temos culpa. Mas o mundo nos culpa por esse erro que não fomos nós quem cometemos.
Quando digo que quero mudar de sexo, é só para fazer com que entendam. Mas na verdade, não quero mudar. Quero o meu sexo que recebi trocado... Como uma mãe que quer o filho que foi trocado na maternidade. É o filho dela e ela não se conformará com argumentos que é pecado desejar a criança que já está registrada em cartório, em nome de outros pais.
Pense bem no que vou dizer: As pessoas não vêem meu cérebro que é mais importante que meu corpo segundo você mesmo me o disse. Aí elas querem que eu faça um tratamento para mudar meu cérebro, mas não se conformam de que eu queira mudar o corpo que é menos importante, e que tem como ser mudado.
Minha alma é mulher e meu corpo, homem!... E como a minha alma é mulher, ela gosta de pessoas do outro sexo, como toda pessoa normal. Concorda?
Data: Sat, 14 Feb 2004 09:01:52 -0300
De: maren braga
Assunto: Re: UM TRANSEXUAL QUESTIONA DIREITO À CIRURGIA
sou transexual também e posso dizer o que sentimos:
é terrivel quando as pessoas nao vêem que tem uma mulher aqui dentro...
quando a família ou os amigos insistem em nos ver de um jeito que não
somos. isso é uma dor forte que gera nagente um desejo de lembrar a todo
instatne que somos mulheres, sim.
noa basta ter um corpo feminino depois do processo de hormonização.
precisamos nos sentir bem com nosso gênero, e precisamos de reconehcimento
social a isso.
a família é um fator essencial. Infelizmente a minah família não me apoia,
apesar de me tolerar. é triste isso, mas nao se pode fazer nada.
um número alto de transexuais se mata por nao conseguir ter o
reconhecimento social íntimo de ser aceita do jeito que realmente se é.
e nesses casos, sem a ajuda das amigas, fica dificil resistir.
infelizmente o mundo das transexuais é dividido em duas faixas:
1 - as que tem apoio da familia ou possuem bens pra se operar,
2 - e as que não possuem apoio da familia e não tem dinheiro.
é muito dicotomico ver isso, pois quem tem apoio ou grana geralmente tem
mais estabilidade emocional na medida em que possui reconhecimento social
de alguma forma, seja pela família, seja pela sociedade.
axo que deveriamos lutar aki na lista pra conhecer o povo trans.. nos
conhecermos e nos apoiarmos...