Ensina a Teoria Geral do Estado que a Constituição de um Estado soberano tem três funções que lhe são essenciais e que, dada a importância desse diploma legal, nada mais lhe deve ser acrescentado. É, portanto, ponto pacífico na doutrina e fato facilmente observado, à simples leitura da Constituição dos países evoluídos, que a Carta Magna deve ater-se aos pontos específicos que a Teoria do Estado a ela atribui, quais sejam: a organização do Estado, o exercício do poder político e os direitos e garantias individuais.
Temos, assim, um quadro bastante claro em relação ao papel que a Constituição deve desempenhar no ordenamento jurídico do Estado. Em função da fundamental importância dos pontos acima citados, ocupa este documento legal o ponto mais elevado na hierarquia das normas jurídicas.
Façamos, pois, breve comentário acerca desta função da Constituição. Entende-se por organização do Estado estabelecer os Poderes que o constituem, bem como o papel que cada um deles deve desempenhar, para o pleno e harmônico funcionamento da administração estatal, no sentido de promover agilidade e justiça aos atos praticados pelos agentes do Estado, no interesse da sociedade como um todo.
O exercício do poder político, bem como a forma de se chegar aos postos que o compõem, também é matéria que somente pode ser tratada na Lei Maior, não resta a menor sombra de dúvida, de vez que consiste em definir-se como devem agir aqueles que governam o país e de forma serão escolhidos.
É sempre medida de bom alvitre que os direitos e garantias individuais estejam estabelecidos em norma hierarquicamente superior à lei ordinária, pois, se assim não fora, abrir-se-ia a possibilidade de que tais direitos e garantias fossem facilmente desrespeitados, ou mesmo extintos.
Dito isto, passemos a uma análise do que ocorre com a Constituição Federal do Brasil. Levados, talvez, por uma cultura um tanto estranha, mas há muitas décadas arraigada em nosso país, segundo a qual há leis que “pegam” e outras que não, como se foram vacinas, ou mera questão de modismo, os legisladores brasileiros costumam trazer ao bojo do texto constitucional os mais diversos assuntos, sob a discutível alegação de que, inserindo-os ali, certamente haverão de ser respeitados, ao passo que, se os colocassem na lei ordinária, poderia haver o risco que uma determinada lei não “pegasse”, o que poderia trazer sérios prejuízos aos interessados ao assunto em questão.
Assim, foi que, após cerca de um ano e meio de discussão na Assembléia Nacional Constituinte, chegou-se ao atual texto constitucional, que não só é por demais extenso, como também contém de tudo um pouco, descaracterizando totalmente a Constituição, que abriga artigos concernentes aos mais diversos assuntos, todos eles, verdadeiramente, objetos de lei ordinária, mas que, no Brasil, acabam sempre por fazer parte da matéria contida na Constituição Federal.