João Luís Nogueira Matias é juiz Federal da 9ª Vara e Delegado da Associação dos Juízes Federais (Ajufe-CE)
Publicado no jornal O POVO, dia 11 de junho de 2003
Mais uma vez a sociedade brasileira discute a oportunidade de abertura de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar o Poder Judiciário. Muitas vozes, em tom solene, sob o pálio da autoridade, bradam contra a iniciativa, sustentadas em três argumentos básicos: a independência do Poder Judiciário e a necessidade de preservação da harmonia entre os poderes.; a atuação do Poder Legislativo baseada em pressupostos políticos, o que poderia ensejar que as investigações servissem de instrumento de perseguição.; e que o Poder Judiciário tem condições de investigar e punir os seus membros que pratiquem condutas desonrosas. Sem meias palavras: nada mais falso.
O Poder Legislativo atua sob critérios políticos, é daí que decorre a sua legitimidade. Os deputados são eleitos pelo povo e, pelo menos em tese, são seus legítimos representantes. Embora tenhamos falhas no processo de escolha, não se lhes pode negar legitimidade e poder de investigação.
O argumento de que a CPI pode servir de instrumento de perseguição não deve ser considerado. É que mentiras, acusações falseadas e afirmativas caluniosas não se sustentam, por mais que sejam repetidas. A verdade prevalece. Ademais, embora sejam a Câmara dos Deputados e a Assembléia Legislativa sejam casas políticas, o procedimento da CPI obedece rigorosamente a critérios jurídicos, sendo punidos os excessos.
A história tem demonstrado que o Poder Judiciário é incapaz de punir os seus membros, com raras exceções. É verdade que a atuação das Corregedorias tem melhorado substancialmente, contudo, a dinâmica das decisões colegiadas dos Tribunais obedece a lógica própria, nem sempre explicável. A investigação pelo Poder Legislativo permitirá maior amplitude na verificação de mazelas do Judiciário, alcançando lobistas, advogados e quaisquer dos que se beneficiam de decisões judiciais sob suspeita.
Afastados os argumentos contrários à CPI, é necessário suscitar a questão: quem tem medo da CPI? Vamos apoiá-la e esperar que dela surja um grande debate sobre o Poder Judiciário que a sociedade quer.