A sociedade não pode mais conviver com um Judiciário intocável e de tão difícil acesso. As resistências são muitas, mas é preciso vencê-las, em favor de um poder moralizado, democrático e acessível ao povo
João Alfredo Telles Melo
Deputado Federal
Publicado no jornal O POVO, dia 24 de maio de 2003
A palavra reforma tornou-se uma das principais referências do momento político que o Brasil atravessa. Divergências à parte sobre seu teor, elas constituem a base para mudanças profundas, visando a uma sociedade mais justa, com menos desigualdades sociais e melhores condições de vida para todos.
A quinta reforma, relegada a segundo plano por enquanto, é fundamental para acabar com a corrupção e com a impunidade que minam nossos recursos públicos, põem em descrédito as instituições e abalam a auto-estima do povo brasileiro. Mais do que isso, ela é indispensável para promover a justiça social e completar o processo de democratização política e institucional do país.
Trata-se da Reforma do Judiciário. O próprio presidente Lula clamou por ela ao comparar o poder a uma caixa preta . Com poucas palavras, nosso presidente resumiu a luta que vem sendo travada desde a Constituinte de 1988 pela democratização e moralização desse poder no país. Já derrubamos um presidente da República.; cassamos deputados e senadores envolvidos com corrupção. Só o poder Judiciário continua encastelado, fechado a qualquer controle por parte da sociedade.
Para dar resposta à mídia, ou por pressão da sociedade, como aconteceu no próprio Superior Tribunal de Justiça (STJ), alguns magistrados foram afastados, em caráter temporário, por se tornarem alvo de investigação interna. Mas, ao arrefecer o interesse da mídia, esses magistrados podem retornar impunes e reassumirem suas togas, como aconteceu com o desembargador Ernani Barreira, do Tribunal de Justiça de nosso Estado.
Os maus magistrados, que felizmente são minoria, acabam maculando um poder que é a última instância à disposição do cidadão para garantir seus direitos.
Há outros problemas, como a morosidade dos processos e a promiscuidade configurada pelos casos de magistrados aposentados e filhos seus que passam a advogar em benefício daqueles que têm dinheiro suficiente para bancar seus caros e eficientes serviços.
Os cartórios, por sua vez, estão dominados por feudos estaduais de magistrados, com uma rede de parentes e amigos que enriquecem às custas da cobrança de taxas extorsivas pelo mais simples serviço, como reconhecimento de assinatura, às estupendas quantias que o dono de um imóvel tem de pagar para conseguir uma certidão de propriedade.
A sociedade não pode mais conviver com um Judiciário intocável e de tão difícil acesso. As resistências são muitas, mas é preciso vencê-las, em favor de um poder moralizado, democrático e acessível ao povo.
O Executivo já deu sua deixa, ao criar a Secretaria de Reforma do Judiciário. Até membros da cúpula deste poder se pronunciaram em favor do controle externo, como o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Celso de Mello.
A própria sociedade começa a se organizar nesse sentido. A partir da experiência pioneira do Observatório do Judiciário do Ceará, já se tem notícias de iniciativas semelhantes no Distrito Federal, Rio Grande do Norte, Maranhão e Rio de Janeiro - onde deve ser criado o Observatório da Justiça Federal.
Falta o Legislativo entrar nessa cruzada, instalando a Comissão Especial para retomar as discussões sobre a reforma do Judiciário e aprovando as duas CPIs para investigar denúncias envolvendo membros dos tribunais superiores do País, na Câmara Federal, e do Ceará, na Assembléia Legislativa.
João Alfredo Telles Melo é deputado federal pelo Partido dos Trabalhadores (PT)