A Tradutora Alemã
(por Domingos Oliveira Medeiros)
A palestrante era loira. De Berlim, da antiga Alemanha Ocidental. Só deu para ver este detalhe. Pois, logo que começou a falar, o tema tomou toda a minha atenção.
Ela domina muitos idiomas. Esteve na Polônia, na França e em Berlim. Registra passagens e fatos interessantes durante a Segunda Guerra Mundial. Presenciou a violência dos campos de concentração. E a violência da invasão e dominação de países contra países.
Ela reclama que, com as guerras, se viu obrigada a aprender vários idiomas. Contra a sua vontade. De maneira impositiva. Para sua sobrevivência. Assim, falou em russo, por algum tempo; em francês, inglês, e, ultimamente, português, quando resolveu, trinta anos atrás, vir para o Brasil, por vontade própria, como voluntária num trabalho de assistência a menores carentes.
Hoje, na cidade de Alto Paraíso de Goiás, a 150 quilômetros ao norte de Brasília, DF, desenvolve um grande trabalho, numa fazenda, com jovens que não têm mais família, e outros que, de igual maneira, possuem algum tipo de problema com drogas, tráfico, crimes etc, praticando o que ela chama de cultura da paz.
Cultura, segundo ela, calcada na solidariedade, basicamente. E no restabelecimento da auto-estima.
Na fazenda, todos têm o que fazer. Trabalham a terra para o seu sustento. Aprendem a interagir e a colaborar uns com os outros. Mas, o detalhe mais importante desta cultura de paz é a nova língua, não imposta, que os adolescentes aprendem: o Esperanto.
Sim, o esperanto como segunda língua. Neutra, em relação aos aspectos culturais de cada adolescente. Preservando, portanto, no caso dos brasileiros, o conhecimento e a prática da língua portuguesa, com toda a riqueza de sua cultura.
Aliás, este procedimento é válido para todos os adolescentes estrangeiros que desenvolvem as mesmas atividades no mundo inteiro. Noruegueses, australianos, franceses, enfim, que vêm ao Brasil para troca de experiências, não têm problemas com a comunicação: todos falam em Esperanto, a língua da paz, segundo a tradutora.
Preserva-se, portanto, as línguas de origem dos povos, e suas respectivas culturas, evidentemente; mas, ao mesmo tempo, acaba com a hegemonia desta ou daquela nação, que tenta impor a sua língua a sua cultura, a sua religião, e o seu modo de compreender o mundo, conforme hoje presenciamos em relação à língua inglesa.
Os adolescentes gostam disso. Sentem-se cidadãos do mundo, ao viajarem para todos os lugares e estabelecerem uma troca de informações culturais, usando o mesmo idioma neutro. Uma linguagem que, a rigor, não é deste ou daquele país, mas de todos os países. Daí chamá-la de linguagem da paz.
Um tradutor reclamou pelo fato de que poderia perder o seu emprego, caso o esperanto se tornasse universalmente aceito, em proporções gigantescas. A loira sorriu: “diziam o mesmo do automóvel em relação às carroças; da televisão, para com cinema; dos livros para os disquetes e DVD’s, e assim pior diante.
Não se pode parar o progresso. O processo de adaptação do homem é grande. Sempre há lugar para todos.
E eu acrescentaria: a moeda, também, deveria ser única. Acabar com a hegemonia do dólar ou do euro; ou de qualquer outra moeda. Acabar com a tal da variação cambial. O que deveria variar e dar o tom do comércio exterior seriam os preços de mercado; a qualidade dos produtos e serviços oferecidos;
Quanto à moeda, não deixaria de ter sua função de mercadoria, com relação aos empréstimos, por exemplo. Mas, até mesmo nesses casos, o que valeria era a concorrência. Quem oferecesse juros menores, ou melhores condições de pagamento, emprestaria mais, e ganharia mais. A economia voltaria às suas origens: produzir bens e serviços para o bem-estar da população. E não, como hoje: produzir especulação e miséria.
Não se pode, por fim, travar o desenvolvimento; ainda mais no caminho da paz, por conta de interesses menores.