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Poesias-->OS TRÊS UMBRAIS -- 29/02/2004 - 03:00 (maria da graça ferraz) |
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Os três umbrais
mdagraça ferraz
Acordar e não saber
onde tu estás
Adentrar o vale profundo
negro opaco do abismo
Sentir-se privado de todos os sentidos
à beira de um precipício
Não poder ver, ouvir, tocar,
falar .; exceto adivinhar
Aceitar o desafio
A única coisa que tu sentes
é um pulso suave , rítmico,
asas, movimento débil
de sinos lentos
Compreender que este
movimento é tu mesmo
como se tu estivesses
dentro de teu próprio silêncio
És isto apenas:
um pêndulo que dilata e contrai
À seguir, descer, abrupto
Cair completamente
Cair absolutamente
Cair num vazio amplo
Cair sem peso
e não sentir nenhuma promessa
de chão. Porque tu sabes,
ìntimamente, tu sabes que
não há chão. Não há nada!
Só agora tu compreendes
que não tens mais corpo
Abandonaste-o às feras
famintas da terra
Tentas ainda assim, gritar,
mas não consegues
Tentas te desesperar, não podes
Estás envolto nas trevas
" Dominar-se"
Agarrar-se à um pensamento
de amor. Amor inteiro.
E confiar. E imaginar.
Não se sabe em quê
Não se sabe em quem
Não há nada
Não há ninguém
És agora apenas o teu Verbo puro
Definitivo. Intocado.
E...crer profundamente
Apenas simples Crer
Sentir-se como uma gota
clara densa caindo num
mar de lama sem se diluir
E se entregar completamente
como um sumo vivo
que escorre tranqüilo
Perscrutar a boca do funil
A estreita travessia
O primeiro umbral
O mais difícil
Saber que aqui sucumbiram
todos os profetas apocalípticos,
todos os poetas loucos,
todos os tolos filósofos,
os poderosos,
os orgulhosos, os vaidosos,
os que não foram fortes
o suficiente, os que não
acreditaram no Poder do Amor
Passarás? Passarás?
Humilde, Contrito,
tu és o louvor, a glória
És a vida infinita que te
foi concedida com triunfo
Sentes teu palpitar firme
Estás vivo! Aliás, descobres
que só agora tu realmente vives,
porque tu és a vida!
Entregas o segundo corpo
à todos os demônios
que te atormentaram
Cumpres o teu pacto
E, de repente, a Paz
desejada! A Paz
finalmente alcançada
A completude!
E tu, criatura pequena,
abençoada, chora-ri,
ri-chora, não sabes como,
porque não tens boca,
não tens olhos, mas é como se
chorasse-risse, risse-chorasse,
por todos os orifícios,
por todas as frestas,
além de todos os limites
O júbilo! O júbilo!
A liberdade!
E tu, então, explodes!
Explodes mas conserva-te
íntegro. Dilata-te
infinitamente sem nunca
acabar de te dilatar
Em ti, o reboar de
um milhão de trovões furiosos,
contínuos, cheios de ódio
Atravessas o segundo Umbral
O dragão já foi vencido
Está tombado. Morto.
O êxtase!
E depois o que te resta?
Flutuar
És uma maravilha flutuante
E não me perguntes
como é uma maravilha que flutua,
porque não sei mas sei que é
E tu agora não tens mais
medo de nada! NADA!
O único medo que sempre teves fora
o medo de tu mesmo
multiplicado
O mundo todo. Tu mesmo o criaste.
Este mundo todo.Tu mesmo o fizeste.
Só agora recuperaste tua
memória. Compreendes
o mistério de todos os mistérios
Mundinhos dentro de mundos
dentro de mundões .; roldanas e polias
em giros elípticos, centrífugos
ESTÁS DIANTE DO ÚLTIMO UMBRAL
Tu sabes que esta porta
só a Grande Causa poderá abrí-la
E tu permaneces diante dela
como uma maravilha que flutua
Estás neutro - nulo- sem efeito
Esperarás uma, duas eternidades,
e o que te importa tudo agora?
Poderás descer mais uma vez
Fizeste isto antes, tu recordas
Fizeste isto várias e várias vezes
Aguardas então a Grande Causa
te despertar do sono
Mas, de repente, tu sentes
o fogo intenso puro a te consumir
E tu te vais
Não reluta! Vais!
E entregas teu último corpo
ao teu Pai
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