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Poesias-->3 últimos poemas eJuvenilia -- 31/05/2003 - 18:38 (Marcelino Rodriguez) |
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TAIGUARA
Parecias um leão de doçura
Com teu penteado comunista.
Eras o último guerreiro
De um ideal antigo.
Senhor de si
Nas notas do piano.
Este mundo não te merecia mais.
Por isso, partiste.
MULHER
Quando amo uma mulher
- Ainda que por uma noite -
Por que será que o sol
Nasce sempre novo
Na manhã seguinte?
Mulher, horizonte
E eternidade.
JUNHO 1994
Numa tarde de Corpus Christi
Meus vizinhos burgueses
Estão trancados nas celas
De seus apartamentos.
Em outra cena, na rua melancólica,
Os mendigos
Na tarde que não se repetirá jamais
Batem nas latas vezias
A aquarela do Brasil.
Prêmio Ação Cultural
USURA
Olho cair do céu
_ Cena intérmina _
O Crepúsculo horizontal.
O Céu me cansa.
O crepúsculo me cansa.
O coração, estagnado,
Se pergunta
_ Por que não cai do céu
Uma afeição sincera,
O único, supremo desejo?`
E tudo que tenho da tarde - ò usura-
è sua tristeza sem beijo.
RESGATE
Resgatar certa maneira
de caminhar na chuva,
Olhar a chuva,
Sentir a chuva.
Um certo gosto sutil
de molhar-se, dar-se,
Perder-se na chuva.
Resgatar
A comunhão antiga
Que eu tinha,
Antes de conhecer
Os olhos ávidos,
Que nunca choram
Nem se consolam
Ao ver a chuva cair
Como uma benção
Sobre a terra.
ENCANTO
O encantamento transforma
A estrada da vida
Num tapete de flores...
Vejo o paraíso: um peixe
Toca flauta no riacho.
Não perguntes meu sorriso.
sou poeta.
Radicalmente poeta.
CHE
Pensar em ti Guevara
Faz-me estremecer de amor.
Teu olhar aberto,
Vivo na eternidade
Não é a de um morto deposto.
Quando morreu Guevara
Nasceu uma estrela na América.
ELEGIA
Quem pode entender
A mágoa que vem de Deus?
A mágoa maior que a mágoa?
Lágrimas, cachoeiras, inutições,
A mágica tempestuosa da vida
È simples como a dor.
- Tortuoso é compreender.
CONFISSÃO
No dia em que fui confessar-me
(Era um sábado de fevereiro),
Ignorando a fumaça
Os prédios defronte
A improbabilidade
Um beija-flor
Veio à minha janela.
_ O perdão estava ali. -
Azul.
DOM
Não sei se entenderão.
Em todo caso, meus olhos são de assombro.
Minha inspiração é livre
Como a janela que abro: Jesus está lá.
Quem compreende?
Então, deixo-me ir, apenas ir
Como as folhas ao vento,
Os peixes ao mar, os pássaros ao céu.
SONHO
Certa Vez sonhei
Com uma moça loura.
Não lembro se conversamos,
Se dispensamos palavras.
Sei que acordei chorando
E a vida já não importava.
CREDO
Eu sempre fui romântico
E apreciava sorrir aos semelhantes.
Cantava como criança ao menor
Espetáculo da vida.
Um aniversário, livros novos, gibis,
Amigos não vistos a algum tempo
(Esses pequenos acontecimentos),
Comoviam-me até as lágrimas.
Cada movimento meu era alegria.
Cada pensamento uma festa.
Descobri, porém, que as pessoas não são românticas.
Ocupam-se com afazeres práticos, não com a vida.
Então, fiquei triste.
Mas romântico.
THE FOOL
Quando nasci, já lia nas entrelinhas.
A primeira palavra que aprendi: contramão.
Já imaginava estar ali meu caminho.
Pus cedo o pé na estrada,
Cantando minhas alucinações.
Segui.
Se o barato era surfar qualquer onda, mereci
Se o barato era ganhar dinheiro, mereci.
Então, descobri um universo simples na goma de mascar.
Hoje sou um mago animado, como nos desenhos.
Hoje, vivo em universos, porque segui a lenda.
E ainda sobrou-me tempo
Para mostrar-te o caminho.
A lição: desde que tenha pernas,
Qualquer caminho te serve.
Agora: magia.
Amanhã: deslumbramento.
Eu sou, eu fui, eu vou.
Não sou menos mágico
Que o coelho da Cartola.
Meu nome é Paulo.
Apóstolo.
ANDORINHA
(Canção de NInar a Lu)
Pouco sei do mundo,
Andorinha. Menos ainda:
Ignoro voar.
Só sei que te amo.
Não sei aonde vais,
Andorinha, quando dormes.
Me chamava outrora
Aos teus sonhos.
Nâo mais agora?
Quem és tu, andorinha,
Que me trouxeste de volta
Para meu sudeste
E Não mais retorna?
Quem és tu, andorinha?
O ANJO DO AMOR
O anjo do amor
Veio à minha casa.
Com jeitinho serelepe
E bolsinha preta nas costas,
Veio trazer-me a poesia
Que eu pensava esquecida
No cemitério dos velhos amores.
O anjo do amor
Tem cabelos vermelhos,
Corpo esbelto
E um rosto
Que me faz pensar em Deus.
Fora isso tudo, é meio louco:
Ri de coisas estranhas
E zanga de coisas tolas.
O anjo do amor é meu anjo.
Sempre foi e sempre será
Inconfudivelmente
Eternidade afora,
Além das estrelas ainda.
SUL DE MINAS
Gosto de ti
Do tamanho do sol
E da lua.
Gosto de ti
Antes e depois
Da chuva.
Gosto tanto de ti
Que se mais gostasse
No mundo nao caberia.
Vendo uma estrela,
Fugitivode ti,
Na alma veio
Palavras cadentes
Nas frias Minas Gerais.
Carmo da Cachoeira, Sul de Minas.
junho de 1999
BEM
A pureza de menino
Que ainda nao perdi
Chora comigo
O mundo nao ser sempre azul.
O anjo que me vela
Sabe que preciso
Muitas vezes ser sozinho
Para nao ferir
Por estar ferido.
Por isso, minha menina,
Ainda que o mundo acabe,
Ainda que eu esteja aflito,
Profundamente abatido
Ou quase morto,
Deixes de ser meu brinquedo,
Meu vale lindo de sonhos...
Pois so Voce e meu bem.
So por ti parto ou regresso,
Seja qual for a viagem,
Pois so meu bem e eterno.
14.09.1999
INTUIÇÃO
Desce a tarde tristonha.
Infância, mocidade, velhice morte.
O eterno girar do mundo!
De onde vem a esperança,
Se não a vemos no que temos?
Ò crepúsculo ancestral!
A angústia do eterno, que não vemos,
Porém pressentimos como uma necessidade.
E chega a noite, serena.
LIRA
Quis o destino
Fosse eu o cantor
Desse momento suave
(Como se a alma voasse,
Cantando como ave.)
Não sei se sonhei o passarinho
Que não vi, aqui, passando.
Há horas que não sei se caminho
Ou se ando voando.
O EXILADO
Olho a Praça
Afonso Pena
Como se não fosse
Desse mundo.
De onde vim,
Vim exilado
Pra breve
Escala
no mundo.
E aqui estou:
Solitário,
Alheio a tudo.
A NOIVA
Bebo a morte no café.
Leio-a nos jornais. Vou com ela ao desemprego.
Encontro-a nos trabalhos. Assisto-a na televisão.
Durmo com ela nos sonhos.
Somente, quando morrer,
Quero casar-me definitivamente
Com a fiél companheira de vida.
HABITAT
Caminho sob o sol tórrido de São Cristovão.
Faz décadas e tantos
Que desfilo por aqui minha melhor poesia
E a mais tiste (canção silente da rotina).
Também foi por essas ruas
Que aprendi a persistência.
E hoje, sob este sol,
Percebo que sou deste chão
Como um lagarto nativo.
A MOSCA
Numa manha de domingo
Em que eu contemplava
Coisa alguma pela janela,
Absolutamente icomunicável,
Um mosca pousou perto de mim.
Cri que aquela mosca era sinal
De Raul Seixas ou Valéria.
Então, decidi tentar o diálogo.
Desafiei a mosca de olhos benignos a falar-me.
Indaguei se ficaria sozinho:
_ Não, disse a mosca,
Com sua maneira de dizer,
Pousando em meu punho.
Depois, fiquei vagando a poesia...
A mosca? Foi-se embora, com Deus!
OS LÍRIOS DO CAMPO
Marcelino nada faz.
Marcelino nada espera.
Recebe o que o vento traz,
Aceita o que o vento leva.
Profissão: Observador de Pardais.
RICHARD BACH
Porque tenho
O dom de voar,
Sei que o paraíso
È uma questão pessoal.
Sei que ilusão
È viver fora do céu.
Para mim, no entanto,
Que vivo na ponte para o sempre
Longe é um lugar que não existe.
ETERNO MENINO
Cato a poesia
Como o menino
Que brinca
Com pedras no rio.
Na verdade,
È dentro de mim
Que o rio nasce.
PRANTO
Vejo passar a juventude
Em dias de tédio doloroso,
Onde o sonho mais glorioso,
A esperança mais alentada,
Seria a alma partir da estrada
Que não acolhe sua virtude.
Mais vasta que a vida, a alma
Não cabe na estreita terra.
E na solidão que aterra
Quer tornar-se mais leve, voante.
Este seu sonho incessante.
Estando presa faz pena.
A PALAVRA
Na noite sem ti,
Perto da morte,
Procuro no silêncio
A palavra de ouro.
Sem asas, sem abrigo,
Tanto do sul
Quanto do norte
Só faz frio,
Muito frio.
Eu só queria dizer-te
A palavra sussurrada
Que vem da eternidade
_ Além da morte_
Para meu peito
Tão longo, tão forte.
No dicionário não há,
No corpo só não cabe
A palavra definitiva.
E para dizê-la certo
(bem de perto o que é de longe)
Melhor fora que chorasse,
Porque dizer com os olhos
È mais dizer, sem mentira.
CANÇÃO DO NENÉM
Eu ia pela cidade, na tarde brasileira,
Com acobracias na mente,
Pensando uma declaração inacreditável
Para te impressionar
Definitivamente.
Chamá-la de anjo, pássaro, andorinha,
Já não seria original. Nem de doidinha.
Somos cúmplices da loucura.
Pensei falar de prédios, países, constelações,
E pela mente atordoava-me escrever
O maior poema da literatura.
Quanta loucura, meu bem!
Quanta loucura, Neném.
Eu atravesando princesa,
A Avenida Rio Branco tão perdido
Na inspiração inacreditável
Quanto fico quando cantas
Aquela canção francesa.
Cantas pra mim, meu bem?
Cantas pra mim, neném?
E pesquisei na livraria, tentei de tudo,
Tentando me inspirar... tentando me perder...
Tentando me encontrar...
Vi os pobres na calçada, pensei no presidente,
Sonhei uma revolução individual
(Tudo tinha que caber no maior poema
de amor da literatura universal.)
Quando dei por mim, estava perdido,
Completamente perdido
Sem encontrar a palavra, a elegia,
A ode, o soneto, que equivalesse
Ao sonho que me trazs, namorada,
A sonhar tanta loucura
Que me deixas, quando partes
E que curas, quando regressas.
Quando dei por mim, já era...
Estava tão perdido de amor
Quem nem percebi que a primavera
Chegara com setembro entre tuas mãos.
E sinto muito, minha querida,
Nesse êxtase de vida
O maior poema da literatura
Fica para outro poeta,
Ou para outra vida.
O SOBREVIVENTE
A cidade passou por mim,
Ficou atrás
Como a fumaça da locomotiva.
A memória carrega no ombro
A mágoa do último combate.
Não mais sorrio, não mais choro.
Dois ou três amigos
Sabem que sobrevivi
E não me denunciarão.
Logo que descer do trem,
Subirei a montanha
Na escalada interminável,
Porém não cansativa,
Que me levará ao meu rebanho,
Onde sou mais uma ovelha.
Os anjos estarão conosco
E nunca mais permitirão
Que nos cheguem rumores da guerra.
E logo o ombro estará livre
do fardo das lembranças.
INICIAÇÃO
Alto quero o pensamento,
Que são minhas asas.
Minha alma pede estrada
Que leve ao firmamento.
Tenho em mim lágrimas
De estranho contentamento.
Os que amo estão comigo:
Coração e pensamento.
E se conheço a viagem
Para o vôo infinito,
É que os mestres deixaram
Os atalhos escritos.
LIÇÃO
Até aqui,
Tenho sobrevivido
Entre a palavra,
Palavra que silencia,
A solidão, o suplício.
Poeta, irmão do mito,
Minha vida
Me ultrapassa.
Sofrer é meu ofício.
Porém, já me conformo
De ser o homem um equívoco
E a vida não ser
Um sol extraordinário.
PÃO E VINHO
Tenho pedido à divindade
Que, ao deitar-me, logo adormeça.
Eu nunca quis a guerra:
Sou poeta.
No entanto, ela estava
Onde quer que eu virasse o rosto.
Queria amor: guerra.
Queria amizade: guerra.
Queria meu pão, meu vinho,
E o que recebia?
Guerra. Guerra. Guerras...
Ganhei batalhas
Inimagináveis.
Nunca, porém,
Senti-me vitorioso por vencer,
Cantar a rosa.
Na verdade, perdi.
Sou apenas um moço triste,
Humilhado, cansado de covardias.
Senhor, vos imploro
Um colo de mulher para chorar,
Sem que ela me pergunte o motivo.
Numa guerra não há vencedor
Nem vencidos, mas equivocados.
Um colo de mulher:
Eis todo meu desejo.
tre últimos poemas de Juvenília
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