De manhã a cidadezinha
Acordava tímida
Suspirando o Sol redentor
E nas ruas nada se via
E só o que se ouvia
Era o ronco de um bimotor.
E o Zé sentado,
Todo acanhado
Com o seu café em mão,
Respirava a felicidade dessa gente
Que passava em sua frente
No bar do Salomão.
E assim, pensava na vida
Que é tão mal vivida
E passa como um maremoto,
Enquanto a praça se enchia de alegria
Tal qual nunca se via
Desde um tempo remoto.
E lá voavam beijos,
Suspiros de desejo,
Iluminados por um céu azul.
A aurora assim brotava
Enquanto a criançada brincava
Banhadas pelos ventos sul.
E o Zé se levantou devagar
Sempre tentando notar
O que ninguém nunca notou.
E andou por toda a praça,
Cantarolando a desgraça
De quem nunca amou.
E andando tão sozinho
Procurava um caminho
Que outro alguém jamais trilhou.;
Mas avistou uma moça
Que, diferente de tantas outras,
Assim se apaixonou.
O Zé a olhou com atenção
E disparou o coração
Quando o olhar ela retribuiu.;
E do olhar nela fez-se um esboço,
E do esboço surgiu no rosto
Sorriso tal qual nunca se viu.
E nesse belo repente
se aproximaram lentamente,
E foram se apresentar.
Seu nome era Amanda,
E tal qual a flor que encanta,
Puseram-se a conversar.
E a tarde foi chegando,
E a praça esvaziando,
Com a brisa que sopra do mar.
O frio era cortante,
Mas nada naquele instante
Podia os separar.
Tocaram-se as mãos singelas,
E com as rosas belas,
O Zé lhe disse assim
Que se encontrariam às oito horas,
Para que sem demora
Tivessem uma noite sem fim.
E tomaram seu rumo,
Embora nada mais nesse mundo
Pudesse agora importar.;
E seus pensamentos se verteram
Para o amor que conheceram
E que nem Deus podia separar.
Amanda se fez bonita
Como nunca mais seria
Para outro homem qualquer.;
E o Zé se esqueceu da vida
que outrora era ferida,
Mas agora já não é.
Às oito, na praça amiga,
O Zé a viu, tão linda,
Que uma lágrima escorreu.;
E mataram a saudade,
O mundo era só felicidade.;
A dor antiga ali morreu.
E noite adentro eles dançaram umas
Danças silenciosas como a bruma,
que só quem ama pode entender.;
E se fizeram juras de amor,
A vida toda ao seu redor parou,
Quando as palavras cansaram de se dizer.
E quando as bocas se calaram
E os olhos se cruzaram,
Um beijo doce ali nasceu.
E a noite se tornou dia,
E o dia não mais nasceria
Depois do que aconteceu.
O Zé saiu cedo pela rua
Atrás do amor que era sua
Única razão de ser.
E depois de muita procura,
Descobriu a verdade dura.;
Viu a crueldade de viver.
Pois na noite outrora bela,
Tal qual o apagar da chama de uma vela,
O seu destino quis lhe trair.
Anjos desceram do céu até Amanda,
E levaram de volta sua alma insana
Por um amor que Deus não quis unir.
E o Zé chorou lágrimas
Que ninguém mais
Ousaria de novo chorar.;
E ele amaldiçoou o homem,
E seu Deus que, tão puro,
Era incapaz de amar.
Subiu ao alto do armazém da cidade
Procurando alguma verdade
Que pudesse o salvar.
E num momento desesperado,
Ouviu-se um grito abafado,
Quamdo Zé se lançou ao ar.
Com lágrimas nos olhos,
Avistou Amanda no horizonte,
E tentou suas asas alcançar.
Mas a imagem sumiu,
E toda a vida se esvaiu
Por entre as dores de amar.
E o povo da cidade não entendia
Por que ele alí jazia
Numa poça de sangue no chão.
Foi-se Amanda, e morreu José
Com o rosto marejado
E a mão no coração.
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