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Poesias-->POEMAS DE ANIBAL BEÇA -- 16/07/2002 - 12:57 (Anibal Beça) |
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5 SONETOS AMOROSOS
E 1 ESPELHO DO RESCALDO
Anibal Beça
BOLERO DAS ÁGUAS
O passo no compasso dois por quatro
acode meu suplício de afogado
afastando de mim sedento cálice
em submerso bolero de águas tantas.
A sede dança seca na garganta
curtindo signos, fala ressequida
para a língua de couro, lixa tântala,
alisando palavras rebuçadas.
Quanto alfenim no alfanje que se enfeita
para montar as ancas de égua moura.
Lábia flamenca lambe leve as oiças,
é rito muezim ditando a dança:
no dois pra cá me levo em dois pra lá,
nas águas do regaço vou-me e lavo-me.
(H)ARAS DE SARA(H)
Nas areias do Saara sei-me potro
corcel bebendo o fogo do deserto.
Nas almofadas dunas tão macias
me deito ao sono sonho cavalgando.
Arrebatado sigo sem miragens
teu trote gracioso nesse oásis
de ver nas anchas ancas tantas águas
e sei que a minha sede tem abrigo.
Sedento garanhão de antiga Arábia
no solo de Israel lua de alfanje
brilha na tenda a estrela de David.
Iluminada alcova ardendo em sândalo
a sarça da paixão demove intrigas
e rega no seu vinho nossos corpos.
CHUVA DE FOGO
Meus olhos vão seguindo incendiados
a chama da leveza nesta dança,
que mostra velho sonho acalentado
de ver a bailarina que me alcança
os sentidos em febre, inebriados,
cativos do delírio e dessa trança.
É sonho, eu sei. E chega enevoado
na mantilha macia da lembrança:
o palco antigo, as luzes da ribalta,
renascença da graça do seu corpo,
balé de sedução, mar que me falta
para o mergulho calmo de um amante,
que se sabe maduro de esperar
essa viva paixão e seu levante.
SONETO
DA SENTIDA SOLIDÃO
A falta é complemento da saudade,
servida em larga ausência nos ponteiros,
bandeja dos segundos que se evade,
em pasto das desoras, sorrateira.
Estar é seduzir sem muito alarde,
no avaro aqui agora companheiro,
o porto da atenção que se me guarde
o ser presente da sanha viageira.
Partir é sentimento de voltar,
liberta, eu sei, no vento e seu afoite,
navega a sina em rasa preamar.;
ela, essa ausente, é dona e meu açoite,
no seu impulso presto em navegar,
vai se enfunando em névoa pela noite.
DIONYSIO
Ungido para o fado e a nova festa
Meu carnaval profano já celebra
As quarentenas dívidas da carne
Na cela de costelas das mulheres.
Como devasso réu, confesso fauno,
No vinho das delícias me declaro
Sem culpa e sem pecado original
Pois nessa pena sou igual a tantos.
Já disse certa vez em cantoria:
De nada me arrependo e reconfirmo
Agora que o meu tempo é só de gozo.
A vida que me dou não dá guarida
Nem guarda desalentos de tristeza
Somente na alegria é que me morro.
ESPELHO
Aníbal Beça
O que sobrou de mim são essas sombras
Sobrada sobra, cinza dos minutos,
Que me alimenta os ossos da memória.
Nessa voragem vaga, um mar de calma
Lambendo vem a pressa em que me aposto
Na duração que escorre nessa arena.
Do fim regresso fera não domada
Ao mesmo pouso de ave renascida
Para o sol da surpresa nas janelas
Escancarando um solo transmutado.
De baixo para cima é que renovo
As vestes da sintaxe que componho
Clara inversão da jaula das palavras
Para fechar sem chave a minha sina.
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Para fechar sem chave a minha sina
Clara inversão da jaula das palavras
As vestes da sintaxe que componho
De baixo para cima é que renovo.
Escancarando um solo transmutado
Para o sol da surpresa nas janelas
Ao mesmo pouso de ave renascida
Do fim regresso fera não domada.
Na duração que escorre nessa arena
Lambendo vem a pressa em que me aposto.
Nessa voragem, vaga um mar de calma
Que me alimenta os ossos da memória.
Sobrada sobra, cinza dos minutos,
O que sobrou de mim são essas sombras.
BALADA DAS MÃOS
Anibal Beça
"a mão que afaga é a mesma que apedreja"
Augusto dos Anjos
Para Carlos Heitor Cony
As mãos são reflexos do instante
iluminando gestos mágicos
na transitória encenação
títeres de um palco de acasos.
As mãos são sentinelas rápidas
estrelas desenvoltas de afagos
do murro em sua fúria intérpretes
atentas aos raios e ataques
As mãos inventam ventos dóceis
desenhando signos nos gestos
fala de nuvens desgarradas
texto descrito nos contextos:
Àquele adeus mais doloroso
último ramo em oferenda,
que sabe a dor com suas cores
inscrita no arco-íris da agenda.;
toque roçado em corpo manso
as mãos semeiam as nervuras
no sulco em pele oferecida:
paixão de arrepios e juras.;
são essas mãos abençoadas
ajudando os nossos milagres
que trazem o grito primal
da vida por inteiro ávida.;
por vezes desencaminhadas
ao mando de momentos tortos:
como o rebenque vergastando
o lombo de cordeiros-lobos.;
eram as mesmas mãos divinas
que curavam coxos e cegos
mãos milagreiras lazarinas
indo em contramão ao evangelho.
ENVIO
Por fim declaro nesta oitava:
não dou a mão à palmatória
nem a direita nem esquerda
escrevo sem buscar a glória.
Da vida não contei as perdas
nem tenho culpas no cartório
na trilha que se sabe lerda
sou peça sem valor no empório.
Manaus, 27 de junho de 2002
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