Seu Cirilo Maranhão
Saiu da Santa Teresa...
Tinha consigo a certeza
Que ia comprar feijão,
Arroz, farinha, sabão,
Azeite e outras misturas.
Montou na cavalgadura,
Tomou o rumo de Solânea,
Devagar, fazendo manha,
Madrugada ainda escura.
Chegou cedo na cidade.
Já estava armada a feira.
Andou por ela inteira,
Regateou à vontade,
Mesmo sem necessidade.
Comprou o que precisava...
Às nove horas, já estava
No banco da barbearia
E as notícias do dia
Ouvia, enquanto aguardava.
Logo chegou a sua vez –
A barba estava crescida.
O barbeiro, em sua lida,
Conversava com o freguês.
Falou-lhe do outro mês -
Do dia em que seu Cirilo
Tinha feito isso e aquilo
Com o cachorro de um senhor,
No qual, com raiva, atirou,
Quando este estava a segui-lo.
Cirilo, então, se lembrou
Do caso como ocorreu:
O cachorro lhe mordeu
E ainda continuou
A segui-lo, com furor.
Sem um pedaço de pau
Para afastar o animal
Que bastante o molestava
Sacou a arma que usava
E atirou no bicho mau.
“-Pois o dono do canino -
advertiu-lhe o barbeiro -
Disse que muito ligeiro
Vai vingar-se do assassino.
Que o seu cachorro era fino;
Animal de estimação,
Criado só com ração;
Auxiliava-o na caça
E que ao autor da desgraça
Vai matar igual ao cão”.
Cirilo ficou vexado.
Não sabia o que dizer,
Nem havia o que fazer
Para explicar ao coitado -
O dono do cão danado
Que o procurava matar...
O jeito era se cuidar
Mostrar que não tinha medo
Foi pra casa até mais cedo
Para ao outro não encontrar.
O seu sítio era pertinho.
Não ia viver fugindo...
E por onde tinha vindo,
Voltou, não mudou caminho;
Trotava devagarinho,
Quando, num ponto da estrada,
Viu uma pessoa montada
E, mesmo sem chegar perto,
Seu Cirilo estava certo
Que fizera a coisa errada.
Ao caminhar mais um pouco
Reconheceu o sujeito
Que com uma arma ao peito
O aguardava como louco.
Sentiu Cirilo um sufoco
Apalpou-se na cintura
Sentiu a coronha dura
Do revólver trinta e oito
Sacou-o num gesto afoito
E apontou-o à criatura
O outro sorriu, contente -
Tudo trazia pensado...
Não podia dar errado
O plano que tinha em mente
E desmontou calmamente,
Com a arma sempre à mão...
Nem chegou a pisar o chão,
Caiu com o corpo inteiro,
Vítima do tiro certeiro
Que Cirilo deu-lhe então.
Já livre do lambacé
Olhou Cirilo o sujeito:
Não tinha lesão no peito
Nem em outra parte qualquer.
Pensou, então: “-Como é
Que esse cabra morreu?
Não foi pelo tiro meu.”
E acreditou, sem custo,
Que o cabra morreu do susto,
Na explosão que se deu.
Hoje, vem um neto seu
(Que eu sei ser homem correto)
Dizer que acertou no reto
O tiro que o avô deu.
E jura que o que ocorreu
Estava fora dos planos...
A vítima só sofreu danos
De natureza interna
Porque ao levantar a perna
A bala lhe entrou no ânus.
© by Escrivão Joaquim, dezembro de 2004. Jpoão Pessoa-PB
* * * * *
|