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 | Poesias-->VELHO CASARÃO -- 23/03/2009 - 23:24 (Tarcísio José Fernandes Lopes) |  |  |  |  |  |
 | VELHO CASARÃO 
 
 
 I
 
 Casarão, velho saudoso,
 
 Meu avô te fez erguido,
 
 Mas pra educar os filhos
 
 Por meus pais foste vendido
 
 – A razão da minha ausência,
 
 Sem que eu tenha te esquecido.
 
 
 
 II
 
 Sob ti não fui nascido,
 
 Mas na infância fui criado.
 
 – Um bom tempo em que eu
 
 Desfrutei no meu passado.
 
 Mas alguém te abandonou,
 
 Hoje, estás desmoronado.
 
 
 
 III
 
 Eras muito freqüentado
 
 Quando havia animação:
 
 Ia gente lá do Saco,
 
 Do Ingá, do Sanharão,
 
 De João Gomes, de Maretas,
 
 Doutros clãs da região.
 
 
 
 IV
 
 Pra brincar um bom São João
 
 Teu terreiro era ideal.
 
 Tinha até "gato no pote"
 
 E também "maneiro-pau"
 
 E, num campo bem à frente,
 
 Futebol dominical.
 
 
 
 V
 
 Teu alpendre um bom local
 
 Pra debulha de feijão.
 
 Nele amigos se juntavam
 
 E, formando mutirão,
 
 Debulhavam noite à dentro,
 
 Sob a luz dum lampião.
 
 
 
 VI
 
 Também tinhas um sótão,
 
 Bem no alto ele ficava.
 
 Era sempre bem fechado,
 
 Como cofre funcionava.
 
 Nossas coisas de valor
 
 Nosso pai nele guardava.
 
 
 
 VII
 
 Sob o sótão se encontrava
 
 Grande quarto assoalhado
 
 Onde a gente nele punha
 
 O legume ensilado,
 
 Sal, açúcar e rapadura.
 
 Tudo em cima dum tablado.
 
 
 
 VIII
 
 Vou fazê-lo detalhado,
 
 Como se eu fosse chegando
 
 Pela frente de teu todo
 
 E em ti fosse entrando,
 
 Para que se entenda bem
 
 Como estou te detalhando.
 
 
 
 IX
 
 Inicio, mapeando
 
 Tua localização:
 
 RN – o Estado,
 
 Auto-Oeste do Sertão,
 
 Entre Encanto e Pau dos Ferros,
 
 No Cantinho – Um CASARÃO.
 
 
 
 X
 
 Entro em tua construção
 
 Pelo alpendre, pro nascente.
 
 Nesse teu alpendre grande
 
 Abrigaste muita gente.
 
 Nele sempre havia festa,
 
 Missa, drama e repente.
 
 
 
 XI
 
 Do alpendre sigo em frente.
 
 Quando eu em ti adentro,
 
 Um quartinho à esquerda,
 
 Uma sala bem ao centro
 
 E um quarto à direita,
 
 Outra sala mais pra dentro.
 
 
 
 XII
 
 Se um pouco mais eu entro,
 
 À esquerda, um assoalhado,
 
 À direita, outro quarto,
 
 De casal, denominado.
 
 Mais à frente, à esquerda,
 
 Um casebre anexado.
 
 
 
 XII
 
 Do casebre anexado
 
 Me lembrar inda consigo.
 
 Eram três compartimentos
 
 Que serviam de abrigo
 
 Para um trabalhador
 
 Ou um hóspede amigo.
 
 
 
 XIV
 
 Concluindo, velho amigo,
 
 Essa tua construção,
 
 À direita, a cozinha,
 
 Com fornalha no fogão.
 
 Bem à esquerda, a despensa
 
 Te completa, casarão.
 
 
 
 XV
 
 Com terreiro em cada oitão,
 
 À direita, o dos poleiros;
 
 No da esquerda, existiam,
 
 Bem cuidados, dois chiqueiros.
 
 No da frente se brincava
 
 Os momentos mais festeiros.
 
 
 
 XVI
 
 Para os animais leiteiros,
 
 Bem à esquerda, um curral
 
 Com a frente em pau-a-pique
 
 E o resto de varal.
 
 À direita, um flamboaiã,
 
 Cedros e um matagal.
 
 
 
 XVII
 
 Tu mudavas meu astral,
 
 Pois te via um paraíso
 
 A me dar felicidade,
 
 Paz e calma pro juízo.
 
 Hoje, és parte das lembranças
 
 Que pra mente canalizo.
 
 
 
 XVIII
 
 Ah! Lembrar inda é preciso
 
 De um pé de tamarindo
 
 Que ficava bem na frente,
 
 Dava cada fruto lindo!
 
 E um pé de trapiá
 
 Que cresci nele subindo.
 
 
 
 XIX
 
 Se de ti ia partindo
 
 Era sempre sem vontade
 
 Por que lá eu desfrutava
 
 Tempos bons na mocidade.
 
 Quando lembro desse tempo
 
 Dá no peito uma saudade!
 
 
 
 XX
 
 Pra revê-lo deu vontade,
 
 Mas não tive a coragem.
 
 Hoje, já não posso mais,
 
 Pois só resta tua imagem
 
 E a saudade que me faz
 
 Te render esta homenagem.
 
 
 
 XXI
 
 Repassando tua imagem,
 
 Chega até me foge o sono
 
 Ao pensar que o senhor
 
 Que depois foi o teu dono
 
 Te usou por algum tempo,
 
 Mas deixou-te num abandono!
 
 
 
 XXII
 
 Que te fez teu novo dono?
 
 Quantas missas celebraram?
 
 Quantos dramas, no alpendre,
 
 Bons atores encenaram?
 
 Violeiros repentistas
 
 Sob ti inda cantaram?
 
 
 
 XXIII
 
 Mês de junho, inda brincaram
 
 Um São João bem fogueteiro?
 
 Inda há "gato no pote"
 
 E "maneiro-pau" caseiro?
 
 Aos domingos, inda há
 
 Brincadeira em teu terreiro?
 
 
 
 XXIV
 
 Sob a luz dum candeeiro,
 
 Inda há uma debulha
 
 Com alguém contando história
 
 Ou então dizendo pulha?
 
 E o teu fogão à lenha
 
 Inda queima e fagulha?
 
 
 
 XXV
 
 O teu sótão inda se orgulha
 
 De ser cofre sem dinheiro?
 
 O tablado inda esquenta,
 
 Evitando o meladeiro?
 
 E teu TUDO, casarão,
 
 Inda tá TODO inteiro?
 
 
 
 XXVI
 
 Disso, aí, foste celeiro,
 
 No meu tempo de menino,
 
 Mas a venda para outro
 
 Mudou todo teu destino.
 
 Mas ainda continuas
 
 O meu casarão divino!
 
 
 
 XXVII
 
 E quem sabe o destino
 
 Pode a sorte te mudar
 
 E talvez um outro dono
 
 Possa te recuperar.
 
 Só assim terei coragem
 
 De um dia a ti voltar.
 
 
 
 XXVIII
 
 Mas enquanto eu não voltar
 
 A ti, velho casarão,
 
 Vou ficar me contentando
 
 Em sentir recordação.
 
 Só assim eu me transporto
 
 Para ti em ilusão.
 
 
 
 XXIX
 
 És o mesmo, casarão,
 
 Do meu tempo de criança.
 
 Se não és mais na verdade,
 
 És ao menos na lembrança.
 
 De um dia reerguer-te,
 
 Inda tenho a esperança.
 
 
 
 - Fim -
 
 
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