Já era quase dia, quando uma delas, com os olhos suplicantes e coração apertado me acordou e disse:
- Mãe, eu estou com muito medo.
- Medo do que minha filha?
- Da hora do vento me levar.
- Não se preocupe, não sentirá dor. Apenas dançará no ar ao som do cântico dos anjos.
- Como sabe disso tudo, se você está sempre conosco e nunca saiu de perto?
- Também já tive esse mesmo medo, filha. Depois, passei por muitas e muitas transformações. Agora que sou uma árvore, meu tempo fincado na terra tornou-se mais longo. A natureza extraiu vantagem e colou sua sabedoria na minha pele. E sei que por um período deverei ficar só. Meu tronco e galhos ficarão nus e para que eu não sinta muito frio voltarei para dentro de mim. Por esta razão devo me desprender de todas vocês.
- O que será da minha vida e de minhas irmãs sem você?
- O que o destino já tiver traçado, filha. Com o sopro do vento você poderá voejar e apreciar toda a beleza do outono. Quando perder o fôlego, poderá então cair nas mãos de uma criança e ela brincar por horas e horas com você. No entanto, se cair no chão de terra deverá virar mofo e gentilmente oferecer nutrientes para ela. Lembra-se de quando você era verdinha e eu lhe contava a história do verde? Do mofo à terra, da terra ao mofo – o processo da vida? Pois é, desta forma você seguirá o seu destino. Como vê, não será tão difícil assim.
- E você mãe, como ficará sem nossa presença em teu corpo. Não sentirá muito frio?
- Sentirei muito frio sim, pois afinal, vocês me cobrem por inteiro e acabam por me proteger do vento. Mas seguirei meu destino, minha filha. Devo passar pela dor de ser confundida com a morte. Muitos desconhecem que se trata tão-somente do que aparenta ser. Ninguém nunca lhes disse que a vida se resguarda nas minhas raízes para retornar mais forte. É assim, na paciência, que eu aguardo o tempo e a sorte.