As formigas não têm nome, mas para identificá-la vou chamar esta pequena formiguinha de Marguerita.
Pois bem, a nossa Marguerita nasceu no alicerce de um grande muro.
Nasceu pequenina e aleijada. A pobre nasceu só com duas patas. Enquanto suas irmãzinhas caminhavam rapidamente de um lado para outro ela só podia rastejar.
As irmãs carregavam peso e tinham mil ocupações por dia. Ela só podia e quando podia rastejar da porta para dentro. Para ela tudo era proibido.
Então por que nascera? Antes tivesse morrido antes de nascer!
Tentara ajudar uma irmã a carregar uma folha.
Que nada! Tombara feito jaca madura!
E a propósito, o que viria a ser uma jaca madura?
Ela não sabia o que era uma árvore, na verdade ela não sabia nadinha de nada.
Sonhava em explorar o mundo e conhecer coisas.
Sonhava em subir numa árvore. Servia um arbusto.
Sonhava atravessar a porta de entrada. Mas se justamente ali havia o obstáculo maior!
A formiguinha sonhava e esperava que com o tempo aquelas suas patinhas aleijadas ficassem mais fortes. Aí então ela correria o mundo.
As irmãs diziam que era tudo tão lindo, mas tão perigoso!
Enquanto Marguerita ensaiava para sair da toca onde morava uma garotinha brincava ali perto, uma menina fuçadeira e curiosa.
Luana gostava da natureza e era louca por formigas. Adorava observar a longa trilha que elas faziam pelo quintal todo.
Ela ficava observando como eram fortes as pequenas formigas e nem sequer imaginava que existia uma tão frágil e que nunca pudera botar o corpinho para fora de sua morada.
Mas Luana era, como já disse antes, fuçadeira que só ela!
Descobriu onde as formigas moravam e começou a cutucar a pequena abertura no alicerce. Notou que uma formiguinha não conseguia sair e então pegou uma varinha menor e a deixou parada, bem quietinha para ver o que a tal formiguinha faria. Marguerita colocou toda sua força para se agarrar àquele graveto. Era só o que ela queria na vida, uma força para conhecer o mundo.
Luana viu que a formiga havia se agarrado ao graveto e trouxe-o lentamente para fora do alicerce. Marguerita continuava agarrada a ele com força.
A menina que além de curiosa era muito inteligente notou de imediato que havia algo anormal com aquela formiga.
Colocou o graveto com delicadeza no solo e ficou de boca aberta quando viu o aleijão da pobre.
Ajudou a formiguinha a caminhar e sentiu muita pena dela. Quis mostrá-la para a Tonha. Improvisou com uma folha de árvore caída, uma caixinha para levar a pobre.
__Tonha, venha ver o que encontrei!
__ O que foi Sinhazinha?
A negra trazia um avental amarrado à cintura e veio no seu passinho curto de encontro à menina.
Luana mostrou à velha ama o inseto aleijado e Tonha a aconselhou a levá-lo de volta ao lar.
__ A pobre morre se ficar por aí. Não vai demorar nada para ser esmagada embaixo do pé de alguém.
A menina sentiu um arrepio só de imaginar que a sua mais nova amiga pudesse morrer de forma tão cruel.
__Mas Tonha, acho que a pobrezinha nunca antes passeou pelo quintal. Deixe-me levá-la para conhecer a bica, a fonte, o nosso lindo caramanchão. Será que ela gostaria de ver o galo índio?
A velha ama disse à menina que toda formiga por si só já era vulnerável e aquela mais que todas. Que levasse a formiguinha para passear um pouco com cuidado, e que depois, a colocasse de volta bem perto da pequena abertura do alicerce, porque já era muito para um dia.
__ E o galo índio?
__ Ele vai querer devorá-la!
A menina arregalou os olhos e disse que nem passaria perto do galinheiro.
Passeou com a nova amiguinha um tempo enorme e depois a colocou com delicadeza no lugar em que a retirou. Prometeu voltar mais vezes para ajudá-la a sair.
Marguerita nem podia acreditar no que lhe acontecera. Só podia ter sido um sonho; um sonho bom demais.
Escorregou para dentro de casa e pensou que talvez nunca mais conseguisse ultrapassar aquela barreira, mas valera a pena!
Começou a pensar no susto que levara quando vira aquele ser estranho enfiando um pedaço de pau no buraco do alicerce. Depois entendera que ele só queria ajudá-la.
Já sentia saudades daquele ser que a envolvera com cuidado numa folha e a levara para realizar o seu sonho de conhecer o mundo.
Quando começou a contar a uma irmãzinha o que tinha lhe acontecido, esta zombou dizendo:
__ Você é mesmo uma boba. Aquela é Luana, é a filha do dono de tudo por aqui. É mulher, menina. É uma menina e tanto.
__ E aquele outro ser grande, com voz brava?
__ Aquela é outra mulher, é a mãe preta de Luana.
__ Como você sabe de todas essas coisas?
__ Eu tenho olhos e ouvidos, minha filha.
__ E patas perfeitas! __ retrucou a formiguinha.