
Cabeça de Cuia
Nem tudo que Corina viu e aprendeu, veio das cercanias da fazenda Campo Grande. Ela tinha impressões de viagem do Rio de Janeiro ao Piauí, fuxicando com a neta o Centro-oeste, parte do Sudeste e todo o Norte de Minas para recontar sua história. Ela e Cláudio Manuel eram duas pessoas e uma só carne, uma realidade ou uma lenda?
A Carimbamba, por exemplo, a mulher de Cláudio achava que era invenção do marido. Ele contava que ninguém do sertão ou do mar, jamais viu a carimbamba. Só à noite se ouvia seu lamento triste, semelhante ao clangor da acauã canglorando, canglorando, agourando morte na aldeia, sem parar.
O povo dizia que na lagoa morava um pássaro sanhoso, sanhudo, que trazia agouro em seu canto. Quem o visse cantar, ficava menino se fosse velho e ficava velho se fosse menino. E assim, quando Yula Maria nasceu, o pai dela prometeu casá-la com a carimbamba, para quebrar o encanto. Dizem que a carimbamba que há três mil anos cantava, tinha cabeça de gente e asas que não voam. Era igual em malvadeza ao Cabeça de Cuia queSete Marias[1]precisava tragar. Sete virgens comer pro encanto acabar...
Era quase escuro quando Yula ouviu cantar: “amanhã eu vou... amanhã eu vou...” Curiosa, adentrou a mata e ao pisar o junco à beira do brejo, a vegetação se abriu e a lagoa encantada apareceu. A mocinha viu a carimbamba e nunca mais voltou para casa. Assim, daquele tempo até hoje, corre o boato que uma velha encurvada grasna em noites de lua cheia na lagoa, que não é mais encantada.
[1]Cabeça de Cuia.Folclore do Piauí. Canção atribuída a Bentinho.
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