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Erotico-->22. A DECISÃO -- 19/06/2003 - 07:59 (wladimir olivier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Dizer que Lourival acordou para o plano espiritual satisfeito seria, no mínimo, forçar-lhe os sentimentos de compaixão para consigo mesmo. Tinha, é claro, muito para agradecer, no reconhecimento de que fora ajudado por inúmeras criaturas amigas e por protetores que não foi capaz de identificar.

A mim, particularmente, estendeu afetuosamente a mão, em comovido aperto, como se promessa fora de solidariedade e de companhia perene, no amor do Cristo. Era a fraternidade que se selava, para além dos limites da dor e dos resgates que alguém pudesse cobrar. Era a compreensão da necessidade de integral reconciliação. Era a percepção de que trabalhara eu com afinco, para poder ele alcançar tal nível evolutivo.

Mas havia decisões importantes para serem tomadas junto aos que se encontravam encarnados.

Lourival queria saber se todos os seres de seus relacionamentos lhe perpassaram pelas lembranças ou se havia esquecido quem permanecesse hostil.

Informamos-lhe que havia entidades profundamente encalacradas na maldade, as quais não teria sido conveniente trazer das profundezas das trevas, dado que não viriam sozinhas, o que complicaria deveras o trabalho socorrista, sem adiantar um passo na direção do que objetivávamos, ou seja, predispô-lo a enfrentar as crises conscienciais, para conhecimento mais intenso de si mesmo, no intuito de fazê-lo alterar o rumo do destino na presente encarnação, como ainda para propiciar-lhe condições de resgate de débitos, após o desenlace.

Explicamos-lhe, também, que havia amigos encarnados, mas sem possibilidade de alcance, para proveitosos encontros “cármicos”.

De qualquer modo, não era hora para profundas explanações a respeito, dado que urgia o tempo da reintegração familiar. Cuidasse dos mais próximos e exercesse mais evangelicamente o apostolado mediúnico e espírita, que era essa a missão com a qual concordara.

Se quisesse, poderíamos revelar-lhe a causa mais profunda de todos os problemas na carne, com o internamento hospitalar e o coma profundo de tanto tempo.

Assustou-se um pouco com a perspectiva de algum choque emocional, mas garantimos-lhe assistência fluídica prévia. Se quisesse, poderia ser levado à cena do acidente como espectador, para não reviver as sensações psicológicas, agora amainadas.

A alternativa agradou, de modo que pudemos magnetizá-lo para o efeito anímico.



Naquela noite, Lourival havia estado com o amigo Zezinho e com Isabel. Ernestina tinha ficado em casa para cuidar dos preparativos do Natal, de forma que o papo com os bons católicos iria estender-se até de madrugada.

Não desistia o amigo de fazer ver ao casal que o espiritismo estava com a razão, quando afirmava que existia local em que se curtiam as maldades, para regresso à carne. Enfatizava que a lei da reencarnação existia para exaltar a divina justiça, ao contrário dos postulados católicos.

Zezinho ameaçava-o contudo com algo muito mais terrível: as chamas infernais, mas fazia-o sem convicção, para fomentar o discurso de Lourival, na ânsia de demonstrar que a eternidade da pena era meio de separação entre pessoas que se estimavam, bastando que um fosse para o Inferno e o outro para o Purgatório. Gostaria Zezinho de se separar de Isabel?

Está claro que as risadas indicavam que a conversa era pândega e que os gracejos demonstravam o valor das amizades.

— Para que outro lugar pensa você que Isabel vai ser mandada? Já pensou a minha completa felicidade no Céu, harpejando com os anjos? Vou esquecer todos os sofrimentos que tenho passado com ela...

— Como você quer me mandar para lá também, pelo menos faremos companhia um ao outro...

— Da mesma forma que Ernestina, indo para junto do Senhor...

Não adiantava formular pensamentos muito sérios perante tanta facilidade material. Lourival lembrava-se dos filhos tragados pelas águas. Era quando buscava relaxar das lembranças tristes, tomando uns tragos a mais. Naquela hora avançada da noite, na boa companhia dos amigos, seguro de que cumprira os deveres espíritas, naquela mesma noite, junto ao centro, deixou-se embalar por certa confiança em que tudo já fizera na vida.

Há algum tempo, o tédio vinha assumindo-lhe grande parte dos pensamentos e emoções. Parecia tudo já visto. A vida se desenrolava da repartição para casa. As sessões de desobsessão eram muito movimentadas, mas os sofredores traziam problemas fáceis de resolver. Bastava que se integrassem em turmas de estudo evangélico, como muitas de que ouvira falar, espalhadas pelas colônias espirituais. Era assim que definia as dores: falta de ter o que fazer. Seguissem os benfeitores da espiritualidade e teriam sucesso no conhecimento dos carmas.

Não colocava paixão nem amor nas palavras. Era o simples cumprimento de tarefa, muitas vezes até bastante desagradável, mormente se os médiuns se deixavam dominar pelos obsessores.

Lourival lembrava-se de que lera muito para entender a filosofia de Kardec, mas não se convencera de todos os pontos. Era rebelde em diversas questões doutrinais. Durante as discussões dos grupos de estudos, opunha Kardec a Kardec, lembrando-lhe as assertivas relativas ao contínuo progresso por que tudo passava no mundo, inclusive as idéias e os fenômenos de caráter espiritual. Em suma, se não era dissidente, ao menos julgava que os companheiros não se dedicavam com afinco à reflexão recomendada pelo mestre de Lyon.

Despediu-se acabrunhado, pensando em mais um Natal paupérrimo, ele e a esposa junto à árvore e a umas poucas peças do presépio, na recordação do nascimento de Jesus e das crianças, na felicidade perdida.

O carro deslizava rápido pelas ruas escuras e vazias. A cabeça zunia com o vento da janela aberta. O frescor da noite embriagava-o, fazendo-o esquecer-se da hora, do momento, do tempo, da vida... Percebeu que o carro se desgovernara, mas não envidou esforços para recompor o trajeto sobre o asfalto. Viu a árvore, o poste, o portão da casa, na sucessão das batidas. Pela mente lhe passou a necessidade de se reencontrar com os que partiram. Se fosse preciso, apresentar-se-ia sofredor perante os médiuns, para as explicações e encaminhamentos de praxe...



Lourival chorava copiosamente. Entendera que estivera muito perto do suicídio. Se tivesse tido um tumor ou qualquer outra possibilidade de passamento, ainda assim seria considerado suicida voluntário.

Rememorou rapidamente as alucinações no etéreo e verificou que o trabalho dos benfeitores fora muitíssimo bem sucedido. Era capaz de avaliar até os falsos julgamentos em relação às atitudes de Zezinho, que aparecera para levá-lo para o abismo. Compreendeu a alusão metafórica em relação à separação do casal. Deu com a importância da projeção das idéias no futuro, vestindo-se de velho para o efeito de passado que se realizaria, se prosseguisse agindo daquela maneira inconseqüente. Percebeu a necessidade da hipnose para o tratamento das afecções espirituais, pois, em sã consciência, não teria recursos para fugir do ramerrão das idéias comuns de encarnado desprovido de interesse pela vida.

Durante os dez últimos dias, pudera estabelecer, com clareza, os vínculos das diferentes encarnações, para a caracterização dos pontos evolutivos seus e de quem mais pudera ter sob exame, dado que nem todos os elementos estavam sob controle. Mas valia a pena retornar à carne para reajustar os caminhos, rumo à perfeição possível dentro dos campos sagrados do espiritismo. Definiu a personalidade como falha e os sentimentos como egoístas. Deu nota muito baixa ao intelecto e zerou o aproveitamento dos estudos. Se pudesse reassumir todo o domínio do corpo e da mente, iria apresentar-se como ser espiritualmente rejuvenescido. Lembrava-se de ter lido a respeito das pessoas que saem do corpo durante atos cirúrgicos e das deliberações de viverem mais intensamente. Queria a mesma sensação.

Acrescentava, agora, o débito do suicídio. Iria trabalhar para resolver os problemas provocados junto às outras pessoas. Iria...

Nesse ponto das promessas, interrompemos, para não lhe dar excessivas responsabilidades. Antes de volver aos braços da esposa e dos amigos, teria de anuir com a divulgação do relato que estávamos elaborando a respeito dos acontecimentos que se deram durante seu afastamento temporário do corpo.

Lourival demonstrou-se apreensivo, especialmente porque iria evidenciar-se que atentara contra a vida, o que poderia facultar às pessoas a emissão de vibrações hostis contra ele. Julgava que precisava ser convencido, caso contrário não se responsabilizaria pelas conseqüências desastrosas junto aos relatores.

Entregamos-lhe as anotações rascunhadas até o capítulo anterior. Que lesse, que meditasse, que julgasse, que formulasse questões, que tergiversasse, que discutisse, que enfrentasse novamente as nuanças temperamentais dos tempos do degredo da matéria. Voltaríamos a encontrar-nos.

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