Rosalinda terminava o primeiro grau e Rodrigo estava passando para a terceira série do segundo grau.
— Estão dizendo que você está de paquera com três ao mesmo tempo.
— Quem estão dizendo?
— Os meus amigos.
— É mentira.
Rodrigo insistiu:
— Onde existe fumaça, existe fogo.
— Eles acendem a fogueira e querem dizer que eu forneço a lenha? Sai dessa, meu irmão.
— Quer dizer que você...
— Quer dizer que eu vou ficar na minha. Eu sei o que eles estão querendo. Eles acham que só porque estão mais adiantados e são mais velhos vão pegando todas as meninas da minha classe.
— Pelo menos duas eu já tracei.
— Você está jogando o verde pra colher maduro. Quer que eu pergunte quem foi. Aí vai querer confirmar se elas contam as coisas que fazem.
— Você está por fora. Só porque fez quatorze anos, pensa que sabe o que vai pela minha cabeça. Sai dessa você...
— Espere aí. Vamos esclarecer uns pontos. Você disse que traçou duas colegas minhas. Por que disse pelo menos: você não tem certeza de quantas foram?
— A Marisa e a Clarinha.
— Traçou nada. Essas duas não estão nem aí com colegiais. O negócio delas é com universitários. Você quer que eu dê bandeira. Então, eu preciso saber se você já conversou sobre sexo com o papai ou a mamãe.
— Claro que nós conversamos.
— E eles não disseram para respeitar as mulheres?
— Eles disseram para eu tomar cuidado com a AIDS.
Rosalinda não esperava a resposta, mas retornou ao tema que a estava interessando:
— Pois eu acho que você deve tomar cuidado com a língua, falando mal das minhas colegas.
— Voltamos ao começo. Eu vim conversar com você justamente porque estão falando de suas gentilezas. Um deles disse que estão chamando você de Dona Dadivosa.
— E você não brigou com ele?
— Ele veio falar comigo. Não ficou espalhando por aí, mesmo porque mexeram também com a irmã dele.
— E não é isso que os rapazes fazem? Um tem sucesso aqui, outro ali e logo dizem pra todo o mundo o que fizeram. Eu estou bem prevenida.
— Quer dizer que eles têm razão no que disseram?
— Três de uma vez? Você ficou maluco?
— Estou tentando tirar a limpo, porque não quero ver o nome da minha irmã na boca do povo.
— E quem é que vai tapar a boca do povo? Mas eu sei o que aconteceu. Se você prometer não ir tirar satisfação, eu conto o milagre e dou o nome do santo.
— Eu não posso prometer uma coisa sem saber do que se trata.
— Então, lá vai o milagre: um sujeito veio me dar uma azarada. Queria ficar comigo. Um galinhão conhecido. Boa pinta. Acha que vai levar todas pra cama. Comigo, não, violão, como diz a vovó. Deixei o cara na mão. Se as minhas colegas não estivessem perto... Ele me ameaçou pegar à força.
— O pai está sabendo disso?
— Claro que não. Você acha que eu não sei me defender. Pus o maior medo nele, que tive muitas testemunhas.
— Você chamou a polícia?
— Não precisou. Eu só disse que ia contar tudo pra mãe dele. Afinou. Mas deve ter descontado, falando mal de mim por aí, o miserável.
— Qual é o nome do santo?
— Vou ficar apenas no milagre.
Rodrigo precisou de alguns instantes para se refazer do susto. Finalmente, voltou à carga:
— Quer dizer que aqueles três que falaram, não existem?
— Claro que não. Só existe um: o Claudinho, você bem que está sabendo. Mas a gente ainda não passou de uns amassos. Quero ter a certeza de que ele gosta de mim de verdade.
— E isso interessa? Não basta a amizade?
— Você não entende nada mesmo.
— Gostaria de entender.
— O que eu preciso saber é se ele é carinhoso, se não vai me machucar, se aceita transar com camisinha. Essas coisas.
Rodrigo olhou espantado para a irmã. Sabia que a pirralha gostava de escandalizar as pessoas, mas pareceu-lhe que as atitudes estavam estabelecendo-se no cérebro dela com muita possibilidade de realização. Deu uma de conselheiro experiente:
— Pois você deve tomar muito cuidado, porque ninguém aprende nada com quem nada sabe. Na hora do vamos ver, ele pode pensar que está com uma prostituta e vai fazer tudo errado.
— Isso é coisa de dizer à sua irmãzinha?
— Pois eu acho que você está suficientemente desenvolvida para ouvir falar a respeito das coisas da vida, ainda mais porque não põe trava nenhuma na língua. Quem fala o que quer, ouve o que não quer.
— Por falar nisso, como estão as coisas entre você e a Glória?
— Terminamos. Ela só se interessa pelos artistas. Quando aparece alguém de carne e osso, cai fora.
— Você está curtindo uma boa dor de cotovelo.
— As mulheres gostam de fazer isso com os homens. Mas se você me garante que não está saindo com três...
Rosalinda abraçou o irmão, beijando-o no rosto, sem acrescentar mais nada.
Rodrigo se desvencilhou do carinho e rumou para o quarto, ruminando com dificuldade aquela indigesta manifestação de voluntariedade da irmã.