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Erotico-->20. ARI -- 26/09/2003 - 06:40 (wladimir olivier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Já é hora de nos ocuparmos do espírito de Ari, que permaneceu durante alguns meses sob tratamento fluídico, em nosocômio de uma das muitas colônias espirituais.

Chegou em estado lastimável, tendo perdido a oportunidade de crescimento através do resgate dos débitos que contraíra, em épocas anteriores, em relação às pessoas da família. Como se integrara na carne completamente, o que ocorre aos perispíritos por volta dos sete anos de idade do corpo físico, teve um período de educação amorável que deixou de aproveitar.

Estas reflexões apenas se deram no âmbito dos responsáveis pela subjugação dele às diretrizes do carma, uma vez que a tomada de consciência da situação moral haveria de custar-lhe muitos anos de sofrimentos e frustrações, na recitação do “miserere” compungido de quem percebe, enfim, que poderia ter feito muito mais.

Chegou Ari como se não tivesse desencarnado. Em todo caso, foi possível aos socorristas manterem-no alheio aos contundentes efeitos das drogas no organismo perecível, porque, desde que imergiu nos sonhos e fantasias da alienação psicotrópica, passou a julgar a realidade como o produto das sensações de poder ou de domínio sobre a organização espiritual. Em termos mais simples, conservaram-no com a perturbação que trouxera da vida, para poderem exercer uma linha de cuidados com o objetivo de lhe assegurar, paulatinamente, que estava sendo merecedor da atenção de seres cuja qualidade moral não era difícil de conceber.

Se tivesse arribado no Umbral sem assistência e se os seus mais diretos adversários não estivessem encarnados, cairia, indefectivelmente, nas garras de espíritos maldosos, os chamados obsessores, cujo comportamento está ainda muito longe das prescrições evangélicas, porque retêm apenas ódio nos corações. Sob esse aspecto, até que a morte o desobrigou de novas realizações contrárias às leis de evolução, de amor e de trabalho, principalmente.

Margarida, que trazia o coração enlutado, crente de que causara os principais problemas que culminaram na morte do filho, adotou o sistema de pedir por ele durante todo o tempo em que se mantinha em vigília. Procedia como autômato, desligada do mundo, mas sem rancor, sem falsa piedade de si mesma, sem acerbas acusações contra os desmandos finais do filho querido. O enfraquecimento orgânico fora contornado a tempo, de modo que, quando Ari acordou no leito hospitalar, Margarida também despertava para a necessidade de compreender os mecanismos do carma, tanto que, um dia após a fuga de Ovídio, Plínio encontrou-a entre os freqüentadores do centro espírita.

Interessa-nos, no momento, porém, seguir um pouco adiante com Ari, para depois volver ao plano terreno.

— Quem se julga no direito de me prender aqui? — foi logo perguntando ao homem vestido de branco ao seu lado.

— Você não está preso. Precisou ser internado por causa de uma dose excessiva de drogas. Você está lembrado disso?

— Quanto tempo faz desde que isso aconteceu?

— Vários meses, ou melhor, quase um ano.

— E como é que estou me sentindo forte? Eu não devia estar um trapinho?

Realmente, durante aquele tempo, foram feitos muitos esforços no sentido de dar ao corpo espiritual a aparência de quando o menino estava saudável. Por outro lado, o socorrista responsável por assisti-lo em sua recuperação estava preparado para desencadear a metamorfose das recordações da última peregrinação terrena, amparando-o, caso se visse de novo sob as feições anteriores ao encarne.

— Onde você pensa que está?

— Num hospital de desintoxicação do governo. Quando vou poder sair daqui?

— Você poderá sair quando for capaz de raciocinar com clareza a respeito de tudo o que tem feito.

— Só tenho feito o que acho o melhor para mim.

— Essa conclusão é bem plausível.

Interrompemos o diálogo porque julgamos oportuno esclarecer que o pensamento de Ari correspondia ao de um ser adulto. O que trouxera de infantilidade ao etéreo residia no campo das emoções. De fato, mesmo quando vivo, o seu raciocínio se pautava por uma lógica quase irrepreensível. Para não gerar confusão, devemos firmar o ponto em que errara: nas premissas, ou seja, nos fundamentos sobre os quais elaborava os raciocínios e extraía as conclusões. A partir do momento que elegera as drogas como a saída para o prazer e para a contingência da vida, todos os seus atos se deram no sentido de efetivar aquela conquista. Pensamos que não será muito difícil de entender que, no etéreo, os princípios mentais, vamos assim dizer, diferem bastante daqueles do comum dos mortais.

— Meus pais têm vindo visitar-me? E meus irmãos?

— Quais são as suas lembranças quanto a cada um deles?

— Quanto a meu pai, sei que perdeu o emprego. Ovidinho estava preso. Cleto desapareceu. Minha mãe endoidou.

A derradeira informação não poderia ter sido arquivada enquanto vivo. Foi-lhe fornecida em estado sonambúlico, nas várias ocasiões em que Margarida, enquanto dormia, veio ter com ele.

— Seu pai está em vias de formar um escritório de contabilidade. Seus irmãos estão juntos numa cidade do interior e trabalham para viver. Sua mãe está quase recuperada dos destrambelhos mentais. E você, como é que se sente?

— Posso falar a verdade?

— Mentir é que não pode.

— Acho que vou precisar de uma dose...

— Você tem sido conservado em estado letárgico por sedativos leves, para que os médicos possam induzi-lo a recuperar a lucidez mental. Quer dormir novamente?

Ari não esperava tanta condescendência mas não foi capaz de preservar a mente aberta ao diálogo. Os remédios que lhe deram aqueles minutos de clarividência esgotavam o seu poder, de forma que a vontade indômita do adolescente rebelde iria chegar à superfície das ações dentro em breve. Foi assim que perdeu o sentido da existência, mergulhando fundo nas reminiscências da derradeira romagem carnal.

Em lugar de lhe aplicar o costumeiro tratamento de repouso forçado, o amigo com quem conversara resolveu dar-lhe uma descarga de caráter energético, suficiente para mantê-lo sob a impressão de que estava justamente no lugar em que se imaginava, com as pessoas que julgasse presentes, como se a ilusão fosse a realidade. Veremos logo mais a que visavam os cuidadosos socorristas, que desejavam livrá-lo da sobrecarga dos vícios, compenetrados de que o suicídio involuntário se dera por ignorância, por força da impregnação à personalidade de péssimos valores mundanos.

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