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Erotico-->8. A PALESTRA -- 14/09/2003 - 06:43 (wladimir olivier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Margarida era amiga de malhar o ferro enquanto quente. Naquela mesma noite, conduziu o marido ao centro espírita, favorecida pela promessa num momento em que desejava ele impressioná-la.

— Nós vamos assim, sem convite e sem aviso?

— Hoje é dia de reunião pública. Se você pensa em que alguém vai reparar em nós, esqueça. Eu mesma conheço bem poucos.

— Quer dizer que você tem ido e não me disse nada?

— Fui duas vezes. Você ficava fazendo serão e eu ia com a Antonieta.

Antonieta era a vizinha que chamara a atenção de Margarida para os hábitos pouco saudáveis dos meninos.

Quando chegaram, a sessão havia começado há pouco, de modo que foram obstados junto à porta, enquanto, no auditório, o apresentador fazia a prece de abertura.

Não havia lugar para se sentarem e os dois ficaram no corredor da direita. Do outro lado, em toda a extensão, a parede estava ocupada.

Num rústico quadro-negro, ao fundo do palco, lia-se o tema da noite: “A responsabilidade paterna à vista das leis universais”. Lia-se também um nome: “Ariovaldo”.

Feita a apresentação do orador, subiu ao palco um senhor de meia idade, calvo, vestindo calça social e camisa de manga curta, fechada no colarinho.

Vamos dar a palavra a ele:

— Quem me conhece sabe que não pratico a mediunidade e que me esforço muito para produzir algumas idéias capazes de mexer com a inteligência e os sentimentos do público. Por isso, gosto de me sentir em casa e sempre pergunto coisas para que vocês me respondam. Por exemplo, quem aqui tem filhos?

Quase todos os adultos levantaram a mão.

— Muito bem. Vejo que não vou falar para um pessoal desinteressado. Outra questão: alguém conhece o costume dos animais terrestres de marcar o seu território?

Muitos ergueram os braços.

— Eu explico. Quando os machos se tornam capazes de procriar, procuram uma fêmea ou mais, dependendo da espécie, para constituir um grupo familiar. Muitas vezes, como eu me lembro de ter visto no filme Bâmbi, de Walt Disney, precisam até brigar com outros machos para conquistar a preferência das fêmeas. Quando se dão bem, marcam a região de seu domínio, quase sempre fazendo xixi em alguns pontos, porque é através do olfato que os animais vão respeitar aquela área ou, pelo menos, vão saber que estão invadindo um território reservado. Aí, vêm os filhotes e o pai defende a ninhada instintivamente. É a sua responsabilidade. Alguém duvida de que ele esteja agindo de acordo com uma lei universal?

Nesse ponto, ninguém levantou a mão. Plínio observou atentamente a ver se as fisionomias demonstravam satisfação ou tédio. Surpreendeu-se com o ar de aprovação da grande maioria.

“Esse daí deve ter seu fã-clube. Se eu levantar a mão duvidando, aposto que ele vai jogar os assistentes contra mim. Mas o que posso dizer em contrário? Parece que o que ele está dizendo é lógico, é coerente.”

Ariovaldo, depois da ligeira pausa, continuou:

— Quando se trata de seres irracionais, parece que todos concordamos que todas as ações são mecânicas, ainda quando os pais devoram os filhos alheios ou os próprios, como ocorre, por exemplo, quando existe excesso de indivíduos no bando, ameaçando o equilíbrio. Vejam bem que essa não é a regra geral, porque sabemos que, entre os ratos, a população cresce e se espraia, vivendo juntos em número quase infinito, quem sabe para fazer frente aos inimigos de outras espécies. Esses mesmos ratos, presos em gaiolas, em grande quantidade, atacam uns aos outros, mesmo quando alimentados com fartura. Alguém duvida que estejam agindo segundo as leis da natureza?

De novo, fez-se silêncio na platéia, contudo, desta feita, Plínio estava embebido nas informações, buscando entender aonde bateriam aquelas considerações.

Prosseguiu o orador:

— O que pareceu mais correto para vocês: a atitude de defender as crias ou o ato de devorar os excedentes?

Agora Ariovaldo não deu tempo ao povo que refletisse:

— Aplicando-se o modo moral de examinar os problemas dos relacionamentos, maneira própria dos homens e mulheres, seres racionais, posso afirmar por vocês que o certo seria sempre a defesa da prole. Contudo, vejam bem, cuidado com o que vou dizer em seguida: muitos pais existem entre os humanos que abandonam os filhos, esquecidos do princípio universal de proteção que trazem embutido em sua natureza. E por que fazem isso? Eis um problema muito sério que não pretendo esmiuçar, porque não vim com a intenção de ofender ou magoar ninguém. Aliás, peço perdão se aqui entre nós algum pai ou mãe se enquadra nessa categoria. O que desejo, verdadeiramente, é demonstrar que existe a necessidade, quase diria orgânica, de se protegerem as crianças, porque não têm meios de discernir, de compreender, de entender tudo o que a sociedade vem criando em termos de complexidade ambiental, para o mais perfeito equilíbrio, com vistas a dar segurança e tranqüilidade, para que todos que demarcaram o seu território, ou seja, constituíram o seu lar, construíram a sua residência, possam ter garantida sua soberania no exercício do que a lei chama de pátrio poder. Existe alguém aqui que desejaria saber como é que tais idéias se enquadram na doutrina espírita? Pois eu vou tentar demonstrar, embora a simples leitura de “O Livro dos Espíritos”, de Allan Kardec, o nosso Codificador e Mestre, possa fornecer todas as respostas. É que, antes de nascermos, existimos no plano espiritual. Ali forjamos, com a ajuda de orientadores mais experientes, o corpo ideal para cumprirmos as obrigações cármicas, segundo os débitos que trazemos do passado, quer de outras encarnações, quer de passagens pelo Umbral. Preciso fazer referência ao fato de que o Espiritismo se baseia, entre outras coisas, na evidência da necessidade de várias existências carnais, para o indivíduo progredir, aperfeiçoando-se para poder habitar outras esferas mais evoluídas?

Plínio estava fascinado, não tanto pelas idéias, mas pela facilidade com que o expositor discorria. Notou, porém, que a pergunta era mero artifício para poder tomar um bom gole de água e respirar, readquirindo a disposição para seguir avante.

— Vejo que ninguém deseja contestar. Isso é maravilhoso. É sinal de que o primeiro passo está dado na direção de Jesus. Estou falando sério, porque não é hora de brincar. Quando as pessoas são sinceras e dizem tudo o que sentem de verdade, sem se preocuparem com a opinião alheia, também adquirem a força moral de ouvir e, como sabemos, benditos são os que ouvem e os que vêem, porque sabem utilizar os seus sentidos. Mas agora vou precisar ir um pouco além. Devo referir-me ao caso menos evidente de que os familiares se reúnem com duas finalidades. A primeira é a de se amarem, quando já se amavam no plano espiritual, dando seqüência a vidas proveitosas e felizes, trabalhando em prol uns dos outros. A segunda é a de se amarem, quando nunca antes se deram bem, em qualquer plano, uns exigindo dos outros o resgate de débitos, por desavenças e outros problemas existentes em seu relacionamento. — “Ué!” — vão vocês exclamar — “as duas coisas se resumem numa só, isto é, a finalidade é sempre a de se amarem os que se unem por laços de sangue!” Não explica o Espiritismo que todos evoluem no interesse de alcançar as regiões quintessenciadas, onde residem os espíritos de luz, os anjos e arcanjos, os querubins e serafins, com o perdão dos sacerdotes presentes, por eu usar palavras religiosas?!... Pois, então, como progredir, se uns seguram os outros pelas dívidas que não se saldam?!... Não é absolutamente sensato admitir que os santos, ou seja, as pessoas virtuosas, cumpriram todos os artigos das leis morais e espirituais?!...

Nesse ponto, Ariovaldo fez uma pausa muito mais prolongada e encarou as pessoas, fazendo questão de endereçar o olhar para dentro dos olhos dos demais, como a lhes vasculhar as almas. Plínio percebeu o gesto impositivo do orador e disfarçou, volvendo a cabeça para o lado, como a observar as reações do público. No fundo do coração, revolvia a impressão de que errara, esquecendo-se desses aspectos transcendentais na educação que deveria ter dado aos filhos.

Quando Ariovaldo voltou a falar, foi ainda mais instigante:

— Eu acredito que muitos aqui estão imaginando, como eu mesmo imaginava ao ouvir estas conversas espíritas, que o objetivo dos irmãos que se postam perante tanta gente é o mesmo dos padres que, do alto do púlpito, ficam falando em pecados, provocando sentimentos de culpa nos fiéis, exigindo reparações por meio do confessionário e da penitência, obrigando a assistirem às missas e aos cultos “et cetera”. Entendam nesse “et cetera” o compromisso da espórtula ou do dízimo e o credo nos dogmas e na infalibilidade do Papa e, por extensão, da Igreja. Aqui, em nosso ambiente, desejamos fazer crescer o amor entre as pessoas, por isso damos esclarecimentos e oferecemos ajuda. Se alguém sair preocupado porque não vem cumprindo cabalmente as determinações contidas nos “Evangelhos”, leiam “O Evangelho Segundo o Espiritismo”, de Allan Kardec, e discutam com os familiares os princípios morais que lá são explicados. Se lhes faltar entendimento, se algo ficar obscuro, se se sentirem canhestros, obtusos, incultos, porque fugiram da escola muito cedo... Estou sendo injusto, porque nem todos têm condição de cursar sequer a escola primária, porque precisam colaborar com o orçamento doméstico desde muito pequenos. Não quero perder o fio da meada, mas vou aproveitar para dizer que, muitas vezes, a necessidade de uma ocupação profissional afasta os menores dos vícios e essa é outra responsabilidade dos pais. De qualquer modo, “retornando à vaca fria”, ainda está na hora de colher alguns frutos da árvore da sabedoria e nós estamos em condições de emprestar a escada, o cesto e demais apetrechos, aos que nos procurarem às sextas-feiras, quando temos reuniões de pais cujos filhos estão dando trabalho.

Se Plínio tivesse prestado atenção à prece final, nós a reproduziríamos. Todavia, estava confuso com a análise de sua própria maneira de ser, tão justas tinham sido as palavras do orador, como se tivesse preparado a palestra somente para ele e para Margarida.



Um dedinho de prosa com os leitores. Prometemos, ao final do capítulo anterior, examinar os problemas em seus aspectos técnicos. Deu para entender que o fizemos? Deu também para inferir que suprimimos as citações comprobatórias da doutrina, por duas ponderáveis razões: porque queríamos encurtar o capítulo e porque gostaríamos de ver os leitores pesquisando nos livros que possuem?

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