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Ensaios-->Taiguara - Que As Crianças Cantem Livres! -- 01/10/2003 - 20:30 (Silas Correa Leite) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Taiguara: Para Que as crianças Cantem Livres

'Só feche o seu livro
que já aprendeu...'

(Taiguara)



Eu era um jovem imberbe e muito saradinho ainda, cabelo na testa, botinha sem meia, calça calhambeque, o país do milagre (que não houve) vivia a época charmosa dos festivais, caminhando e cantando e seguindo a canção, eu reparei num jovem que, no festival Universitário da TV Cultura era a própria imagem do boêmio com talento e lucidez, além do nome diferente e do poema-canção salpicando de lamento nosso chão, em Helena, Helena, Helena... Um hino ao amor.

Bons tempos aqueles.

O jovem Taiguara era ótimo e simpático cantor, bonito e de presença iluminada em palcos e shows, além de músico de vários instrumentos e, pasmem, ainda excelente letrista, fora de série mesmo. Quem não se lembra de Hoje, Universo no Teu Corpo e outras canções eternas, inesquecíveis. Confesso, do fundo do meu coração, estava lhe devendo essa crônica, até já generosamente pedida por um amigo virtual que banca um site pra esse Taiguara Brasileiríssimo Pela Própria Natureza de Ser Grande...

Tive a oportunidade - muito tempo depois, já migrante de vinte e poucos anos em Sampa - de morar no mesmo quarto que ele morou numa pensão no Bixiga, na Rua Nestor Esteves da Natividade, Bela Bela Vista, num quarto adjacente que ele repartia em áureos tempos com o Vandré, do hino Para Não Dizer Que Não falei de Flores...

Eu tinha orgulho disso. Sabia de cor e salteado as belas canções dele, com os arranjos magistrais, com a sua produção maravilhosa e sua voz limpa como um céu de primavera de setembro da Estância Boêmia de Itararé.

Entre forfés e noites de gandaia, imitando Milton Nascimento, Caetano Veloso ou Elis Regina nas noites de reinações & farras no Bixiga, eu discutia Taiguara, contava lendas sobre ele, mas não tinha coragem de imitá-lo porque ele, todo próprio, tinha uma magia única, um brilho todo próprio. Mas eu sabia as músicas Viagem, Berço de Marcela, Teu Sonho Não Acabou, Maria do Futuro, e, principalmente Amanda. Acho que se eu tivesse uma filha, teria o nome de Amanda. 'Amanda, perdi pela Viagem/A força e a coragem...'

E ele gravou ainda Ivan Lins, Ruy Maurity, Dolores Duran, Alberto Land, Garoto, Vinícius de Morais, Chico Buarque, Sérgio Bittencourt, Luiz Viera e Renato Teixeira. Pelo rol de seus compositores prediletos, sendo ele mesmo um, imaginem os discos deles. Todos raros. Valiosos. Tenho todos os long-plays que pra mim valem ouro.

Num desses, na capa, ao lado de um portão agreste, com um violão e uma cabana tosca ao fundo, Taiguara parece dizer o que ele era exatamente: um guerreiro procurando paz, porque tinha luz toda própria na harmonia, melodia e ritmo, mas, principalmente nas letras altamente poéticas, criativas, diferentes, especiais, ou na voz que, com seu timbral avelã subia e descia tons, levando e trazendo imagens e emoções.

Ele deve ter milhões de fãs. Conheço centenas de Amandas. Vende muito também hoje. Seus cedês são procurados e seus discos em vinil valem ouro no mercado negro. Mais: como ele faz falta, pois morreu tão cedo...

Lembro-me que, um dia, lendo o Jornal da Tarde de Sampa, soube que ele estava internado num hospital da cidade, e que preparava repertório para lançar um novo disco, pois estava com seus trabalhos fora de catálogo, tinha lançado algumas obras por uma gravadora independente de Curitiba, era acompanhado por seu pai um tocador raro de bandoneon, e, as suas últimas criações tiveram a produção de um conterrâneo famoso meu, da Estância Boêmia de Itararé, o Maestro Gaya, tido por muitos experts como, junto com Pixinguinha, um dos melhores do Brasil arranjadores , aliás, premiado várias vezes nos famosos festivais da Record, em arranjos maviosos, plangentes como de A Banda (Chico Buarque), Ponteio (Vandré) e outros.

Como um humilde compositor anônimo de banzos-blues, autor do Hino ao Itarareense, de algum rock louco de uma ou outra banda clandestina, marginal, ou de uma escola de periferia que enfeitei com a minha criação local, de presto, à época enviei várias letras para o Taiguara conhecer e sondar colocar música, aos cuidados do hospital.

E fiquei sonhando, esperando reposta. Meu ídolo, um nome daqueles, um mito, era sonhar muito.

Meses sem notícias. Das letras e do Taiguara admirável.

Muito tempo depois, minha mulher recebeu um telefonema e fiquei sabendo. Taiguara tinha morrido de câncer. As letras estava com essa sua última companheira. Queria meu endereço para devolvê-las. Ele tinha elogiado, prometido musicá-las, mas não tivera tempo, Santo Deus! Tinha chegado sua hora, sua viagem para o berço de Deus, ninhal de todas as luzes e talentos.

Sempre ouço sua músicas, procuro reportagens, gravações raras, quando tocam em ótimas rádios seus sucessos ainda paro para ouvir, como se voltasse no tempo, curtindo como se fosse criança outra vez, e lembro de suas frases, de suas tiradas poéticas, de seu talento acima da média. Um artista e tanto.

Sua Majestade Taiguara não teve a sorte, ainda, de merecer um editor de visão que bancasse um book seu, um livro contando a sua vida, pautando obras, cifras e poemas-canções. Se eu tivesse contato com seu pai que, me parece, ainda está vivo e forte, eu tomaria essa empreitada de próprio punho. Seria uma honra.

Como não nos conhecemos pessoalmente, quando posso, nas escolas da vida onde leciono e ensino letras de rock, canto meus banzos-blues, declamo meus poemas ou de Bandeira ou Drumond, vez em quando ensaio o hino-balada 'Que as crianças cantem livres...só feche seu livro quem já aprendeu...eu preciso muito de você...nós precisamos sim...eu de você, você de mim...'

E mais não digo porque choro. Sou um herdeiro de Taiguara, um órfão dele, talvez o maior fã dele.

Choram Marias e Clarices. Taiguara é uma saudade forte, viva, altiva. E como dói. Por onde eu andar nesse mundo sem porteira, com meus mantras tupi-davídicos, enquanto eu existir como buscador num campo de centeio, levarei um universo na minha vida. E esse universo será a magnífica viagem de Taiguara.

O rádio nesse instante, como se num milagre, solta a canção que enche a minha casa de música e poesia:

-'Eu desisto/Não existe essa manhã que eu perseguia...'

(FIM)



Poeta Prof. Silas Corrêa Leite
Site pessoal: www.itarare.com.br/silas.htm
E-mail: poesilas@terra.com.br
Romance Virtual ELE ESTÁ NO MEIO DE NÓS no site
www.hotbook.com.br/rom01scl.htm


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