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Ensaios-->Literatura e realidade -- 22/01/2002 - 00:48 (Leonardo de Oliveira Teixeira) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
“Duas vezes foi criada o mundo: quando passou do nada para o inexistente; e quando, alçado a um plano mais sutil, fez-se palavra” Osman Lins, in: Nove, Novena


Ensaio de Neruze de Jesus Magalhães (bacharelanda em Letras pela UFG e Leonardo de Oliveira Teixeira (escritor




Literatura e realidade


Pode-se afirmar que a verdade remete a algo que exista na realidade com exatidão e princípio certo. Segundo Nietzche aponta no livro Além do Bem e do Mal, a verdade é gerada pela pura forma do bem e que tem a propriedade da universalidade, da necessidade e da objetividade. Para ele a realidade é constituída por estruturas inteligíveis, como: formas, essências e o ser ,como participante da essência inteligível e aparentado a ela. Essa noção demonstra que o homem em seu momento de razão, teve a necessidade de criar algo que o significasse enquanto ser aparente e criou a linguagem. A realidade, torna--se, portanto, construída pela linguagem, pois ela produz símbolos/referentes (signos) que representam a realidade do homem, seus atos, suas vontades e anseios. No entanto, observa-se que o homem não se restringiu a revelar o mundo do modo como já existe, mas também pretendeu, através da linguagem, criar coisas as quais não se pode chegar. O homem quis, então, satisfazer anseios pela arte e além de criar a arte musical, plástica, criou a arte literária, que é, em princípio, uma arte produzida com linguagem escrita, com a litera, a palavra. A quem pinta um quadro é dado o nome de pintor, e a quem faz uma obra literária, um poeta; mas qual seria a necessidade do homem/poeta em usar a Linguagem que é a priori, um meio de comunicação, para estabelecer sobre ela uma criação artística? Qual seria a função da arte literária? O designativo já induz a algo. Sendo a literatura uma arte, ela não corresponde somente à utilidade, como acontece com a linguagem para fins de comunicação cotidiana, mas engloba duas funções primordiais, a de ser útil e a de proporcionar prazer; A arte literária é útil no sentido de ser séria por possuir um poder de instrução e uma seriedade estética; é doce porque é aprazível no sentido que alimenta as necessidades emocionais do ser humano.
Para melhor entender a questão da função da literatura, é preciso compreender o que a literatura representa. Desde os gregos e romanos já havia interesse e discussão nesse sentido. Platão concebia que a literatura era produzida em terceiro nível da realidade, pois para ele o real/verdadeiro existia no mundo das idéias e o que havia no mundo era a representação das idéias; o fazer do poeta era nada mais que a cópia do que representava a idéia. Platão considerava a arte poética inútil porque acreditava que ela era subversiva ao homem, e o poeta um possesso por ele imitar uma realidade depreciativa que não induzia o homem ao bem. A teoria platônica pode ser entendida por sua forte influência sobre política na República, pois numa República, não deveria haver homens fracos e por isso ele não valorizava a arte poética. Aristóteles, como sucessor de Platão, foi mais coerente quanto a mimesis artística. Ele valorizava tanto o poeta quanto a sua produção. Para ele a imitação é um processo de representação artística e é realizada através do homem, sendo a este natural imitar desde criança a realidade, porém ele teorizava que o poeta não copiava a realidade, ele apenas utilizava da verossimilhança, a qual permite que a imitação aproxime-se do real e não copie a realidade assim como faz a história. Este conceito de Aristóteles pode ser considerado a essência da imitação (mimesis), pois permite falar da realidade e tratar do fatos que poderiam acontecer, qualificando ainda a arte como predecessora.
É na grande obra Odisséia, escrita pelo poeta Homero, percebe-se o quanto a literatura fala da realidade, sem copiá-la, mostrando como o poeta pode criar sobre o que já existe. A partir de um fato, a volta de Ulisses à sua pátria após a guerra de Tróia, Homero faz um poema a esse respeito de modo criativo que nos leva a uma conclusão: nesta obra funde-se a proposta substancial da literatura em sua função de ser útil e doce.
“… De Ítaca reduzi-lo ao seu amigo,
onde novos trabalhos o aguardavam;
…mas a aflição de Ulisses me compunge,
que, há tanto longe dos amenos lares…” (fala da Deusa Minerva)
Neste fragmento da Obra, há a presença do maravilhoso, uma convivência possível entre o humano e o sobrehumano e isso deleita o leitor, lhe dá prazer.
Enfim, tanto para Platão como para Aristóteles, a Obra Poética deve manter relação de semelhança com uma realidade natural já existente. Esta visão foi discutida ao longo dos anos e das novas Obras literárias que surgiam, levando os teóricos a abordarem novamente a teoria imitativa (Mimesis), mas por um outro angulo. Aristóteles já afirmava que havia um grau de distanciamento entre literatura e realidade e que esta, servia apenas como referente para presidir a Obra do Poeta, pois nenhuma obra atinge o que o ser realmente é. Atualmente, há um redimensionamento do conceito de mimesis, em que a Obra não reflete mais a realidade e sim ela mesma. Para Rolan barthes, a realidade não é o referente utilizado pela Literatura, sendo o seu referente um produto das semiosis; a relação não seria mais entre a linguagem e o mundo e sim entre um signo e outro signo, um texto e outro texto. Esta teoria desnaturaliza a teoria Aristotélica e se nega ao mesmo tempo, pois a referência pressupõe uma existência, algo deve existir para que a linguagem possa referir a ela. A teoria de Barthes faz do referente uma ilusão estar calcada na teoria de Baktine, onde se diz que todo enunciado mantém relação com outro enunciado, sendo a intertextualidade um diálogo entre textos. A toda essa relação percebe-se a desnaturalização da mimesis, vez que, não se imita mais a realidade de modo natural do homem, e sim, uma realidade cultural dada pela sociedades através do diálogo de textos e obras.
A partir das teorias expostas acima, é preciso ter cautela sobre como segui-las, pois a radicalidade, muitas vezes nos torna ignorantes. Deve-se ser flexível, especialmente quando se trata de teoria sobre literatura e sua respectiva relação com a realidade.
Como já disse Niestche, “supondo que queiramos a verdade, por que não, antes, a não verdade, o erro, a incerteza?”.
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