Tarde de sábado, bate-papo com os amigos, a cerveja gelada no copo transpira sobre a mesa. Eu como não bebo - cerveja - estava com a minha, podemos dizer, cachacinha. A famosa pinga com limão, minha preferida dos botecos. O assunto era aquele de todos botequins: futebol, política, música, vida alheia da vizinhança... Conversa vai, conversa vem, surge então uma pergunta, por sinal sem resposta.
- Por que você escreve Marcel?
A pergunta me calou os lábios. A cachacinha que era mais divina que água benta começou a queimar no estómago. Eu não encontrava nos olhos de quem me perguntou uma resposta para a enorme interrogação que se formava sobre a sua cabeça. O número de curiosos aumentava: "É mesmo Marcel! Por que você escreve?" Deveria ser uma resposta simples? Não consegui responder.
Tomei o que restava no copo numa virada só. Meu rosto fervia com o álcool que subia à mente. As veias latejavam no ritmo do coração. Pedi licença aos meus amigos e fui para minha casa matutar até que eu pudesse dar uma resposta clara e espontànea. Simplesmente desliguei-me do mundo.
- Por que eu escrevo?
Porque me faz feliz. Ponto final.
Seria essa a tão esperada resposta? É claro que não. Nem sempre escrevo quando estou feliz, mas sempre fico feliz quando escrevo. A ação de expor palavras que fluem da mente ou das veias de um coração partido ou amado, traz uma sensação de alívio e desabafo. É como chegar a um destino tão longo e cansativo. Sinto-me mais leve, mais lúcido, mais tudo e ao mesmo tempo, o nada. Posso fazer uma criança sorrir ou um adulto chorar. Sou capaz de exterminar as guerras, a fome e ao mesmo tempo viver com ambas. Sou livre para amar ou sofrer. Torno-me um masoquista do mundo, sugo todas as dores possíveis e codifico-as em palavras. Sobrevivo entre o sim e o não, sem deixar um talvez. Transformo a madrugada em estrada e o nascer do sol em meu limite. Despenco num precipício de idéias mirabolantes que passam por mim, sem dar credibilidade à s leis da gravidade. Sinto-me livre e nada pode me impedir. Nada.
Enfim amigo, por mais que existam conclusões, não poderei responde-lo. Apenas prometo que dedicarei a minha vida à escritura e quem sabe nos confins dela eu tenha uma resposta - ainda que não seja exata - mas que possa esclarece-lo. Por enquanto, entenda que escrevo por alguns bons motivos: por existir um corpo, uma alma, uma mente, um grande coração, uma família, muitos amigos e um grande amor.