Muitos vão pensar que vou escrever sobre o preço do refrigerador ou sobre o pobre do velho que desejaria comprar ou trocar de geladeira. Mas, na verdade, o que me ocorreu , foi considerar um tema que vai se tornando importante para todos os idosos, Ã medida que o tempo passa : o velho no mundo. Os velhos de antigamente pareciam ser mais respeitados, considerados, valorizados e, portanto, mais felizes. Hoje, discretamente, o velho é posto de lado como se tratasse de alguma mercadoria ou produto inservível, mas que pode, quando muito, ser conservado em geladeira.
Aquilo que se conserva em geladeira, além de apresentar certas qualidades , exige alguns cuidados, não se aconselhando, por exemplo, um novo congelamento após o uso , etc. Então, observando-se essas vantagens do progresso doméstico, quer-me parecer que os irmãos mais novos aproveitaram essa idéia em relação aos irmãos mais velhos. Na verdade, o indivíduo não precisa ser velho para começar a sentir os sinais de rejeição. A partir dos 40 anos, se está desempregado, já se angustia com a discriminação. Com o tempo, vai verificando que o mundo atual é dos jovens, os quais vão tomando conta de tudo. Os papais desses jovens, advindos da época do rigorismo doméstico e social, onde quase tudo era proibido, afrouxaram todo controle, para serem considerados modernos, democráticos , liberais e deu no que deu.
Agora não podem reclamar de mais nada. Os jovens dominadores, mas ainda respeitosos e até amantes dos progenitores, não os desprezam ou os rejeitam totalmente. Inteligentes, astuciosos, adotaram a idéia da geladeira. Uma imensa geladeira, onde aos poucos vão colocando os seus antecessores, que não podem reclamar de nada, pois, a refrigeração bem feita conserva tudo... Haja vista até as experiências científicas de congelarem o ser humano à baixíssimas temperaturas para o fazerem ressurgir em época futura. A comparação é válida porque nota-se a preferência por tudo que é novo. Salvo as honrosas exceções, tudo que é novo têm preferência. Estaria certo esse posicionamento ? Claro que não. As reclamações sobre as dificuldades e desregramentos da vida atual são devidas em grande parte ao "congelamento" dos velhos, seres humanos mais preparados e experientes. Muitos idosos que poderiam ajudar com suas idéias, orientações, opiniões e até com o próprio trabalho, se encontram confinados na imensa geladeira cavilosamente preparada.
Que fazer ? Por tranca na porta depois que o ladrão entra na casa, servirá apenas para proteção futura. Mas, como reparar o prejuízo sofrido ? Como os "congelados" ainda não estão mortos, podem , de forma extraordinária - quem sabe -, cuidar do próprio descongelamento. Não é fácil, mas se conseguirem reacender a centelha divina esmaecida, poderão voltar à normalidade e - com as benesses divinas que não cessam de serem outorgadas -, ressurgirão para destruir aquela imensa geladeira, construída inadvertida ou propositadamente.
