Recordar é viver duas vezes, dizia-se antigamente. Não entendo bem assim. Todavia, recordar é como remexer em velhas fotografias e- dependendo do estado de espírito -, sentir a saudade, indefinível conceito ou "a flor mais triste da vida", segundo Pittigrili. A saudade poderá ser boa, poderá ser má, dependendo do direcionamento da consciência. Boas recordações fluidificam as doçuras da alma, elevando-nos para o imperturbável infinito. Más recordações trarão o amargor do erro, do fracasso, do pecado, do crime - se chegamos a tanto -, e poderão nos lançar no abismo das tristezas e do desespero.
Nossa memória funciona como imensa coleção de fitas de vídeo. E´ só escolher a fita a ser reproduzida e apertar o botãozinho de partida . Noto, então, que podemos classificá-las por épocas, justamente correspondendo as etapas das nossas vidas: infància, juventude, maturidade, excluída a velhice que, naturalmente, somente poderá ser relembrada na vida eterna. Nessa volta ao passado, encontramos cenas cheias de encantamento : a formatura, o casamento, as férias, os filhos pequenos, os amigos, os esportes, os sonhos, as vitórias. E, como é bom detalhar certas passagens, por exemplo, viagens em manhãs cheias de sol e de vida, onde o cheirinho do mato é delicioso, a tranquilidade é grande, as disposições exuberantes. Às vezes, porém, por engano, colocamos para rever, a fita das tristezas, dos sofrimentos, dos fracassos e desilusões. Não podemos deixar de chorar.
Felizmente, somos despertos para a realidade - o presente que se tornará passado - e procuramos nos direcionar para o futuro. Constatamos, então, as dificuldades do momento, as horas insossas e paramos. Precisamos rezar o Pai-Nosso : seja feita a Vossa vontade, assim na terra como no céu... Voltamos a colocar uma fita mais agradável : na maturidade, cheio de entusiasmo, conversando com parentes próximos (que já partiram para o outro mundo) , bem como com colegas e amigos, num final de tarde amena e apelativa da felicidade!
Ainda estamos presos à s recordações passadas que jamais poderão ser revividas ! O que fazer ? . Não dá para continuar muito tempo no mundo das lembranças. Mas, recomeçar, com a melhor das orações : venha nós o Vosso Reino, não nos deixeis cair em tentação.
Ainda há tempo de construirmos boas coisas, pois a virtude, o aperfeiçoamento é escopo maravilhoso, nos induzindo à conquista de coisas nobres, elevadas, dignificantes.
E o mundo continuará a ser tão perverso ? Óh, saudades, quantas saudades...