Hoje acordei sentindo falta de ar. Havia dormido tanto... Talvez compensado o que não dormi a semana inteira... Sonhei com tantas coisas, passeei por tantos mundos e senti tantos novos sentimentos que acordei querendo não acordar. Me olhei decepcionada, acordando no mesmo lugar, na mesma hora, no mesmo dia da semana que passou e do ano que passou e da minha vida toda que de tão vazia poderia ter sido resumida aos mesmos fatos de um dia meu. E é tão automático, tão maquinal.. É tão regrada a minha vida que me faz mal sonhar de noite...Porque acordo sempre tão triste, com uma certa dor no peito, em asfixia... Hoje acordei sentindo uma dor no rosto, como quando a gente recebe algum tapa ou alguma batida qualquer, sentia meu rosto ardendo, formigando, coçando...Eu tremia, pedindo por algo que me tirasse esse desconforto, essa irritabilidade, pedindo por algo que me atirasse longe daqui, em algum outro lugar, livre de qualquer coisa, de horário, de compromisso, de rotina, de corpo, de moral... Logo, meus olhos ganham lágrimas... Lágrimas por não ter a coragem de fugir, de colocar uma mochila nas costas e dizer a todos que vou-me embora porque quero ser livre como nos meus sonhos... Percebi que eu nunca amei ninguém porque revendo todas as pessoas com quem eu estive, eu amava os minutos de liberdade que eu tinha com aquelas pessoas, os minutos em que eu saia do corpo, e passava por algo longe de regras ou qualquer coisa que me ate neste chão tão sujo... Amava imaginar que um dia eu estaria longe com essa pessoa, porque aí sim seria livre, em outro lugar, talvez mais alto e mais perfeito que este e teria alguém para compartilhar este sonho, um alguém sem rosto mas de alma bela... É tudo tão corrosivo, feroz e mau... Esta sociedade, meu corpo, meus pais, meus traumas, meu quarto, minha casa... Me representam tudo um grande grilhão que me prendem nessa baixeza e me fazem querer fugir de tudo e não acordar de meus sonhos... E sinto este tremor e este calor na alma agora porque sei que um dia lerão este texto e não entenderão, ou ainda pior, farão alguma crítica baixa e ignorante ou então se prenderão em algum detalhe efêmero querendo desvendar algo sobre mim, como se pudessem.... Este texto mais nada representa do que minha vontade de fugir e ponto. Um breve momento de fraqueza e que é possível que um dia, sabe se lá quem serei, eu chegue a não reconhecer mais dentro de mim. Mas agora tudo é prisão, tomara, passageira. São olhares, comentários, roupas, corpos, costumes, educação, tradição, crenças, horas, consciência... Suspiro... Coisas reais que me prendem... Sinto nada mais que uma vontade de permanecer em meus sonhos, mergulhada em algo que não tenha definição e seja concreto apenas na vontade, no desejo, na paixão e no amor... Um lugar que eu possa ser livre e que não existam lágrimas que possam atingir meus olhos e que não existam leis imaginárias que possam me repreender... Um lugar onde eu possa sorrir e falar sozinha, andar nua, se eu quiser, deixar acontecer qualquer coisa, não me importar, não sentir vergonha, ou então ir visitar alguém muito querido numa madrugada qualquer... Um lugar onde não exista loucura porque todos fazem o que sentem vontade e todos estão tão mergulhados em bondade que a liberdade de ninguém tenha limites... Um lugar onde a realidade de agora seja nada mais que um pesadelo e que nossos sonhos sejam a verdadeira vida, onde tudo é legítimo, fiel, puro e inocente... Inocente porque é verdadeiro... Um universo inverso deste... Onde fazer amor nada mais é que amor, onde nem se note que já é dia, que já é tarde e temos que ir embora, um lugar onde não exista perdão porque não existe falta, porque falta é fazer o que te faz mal e isto é inconcebível, um lugar onde não existam álibis e segundas e terceiras e quartas intenções, onde não existam desculpas ou mentiras que possam ser realizadas, sequer imaginadas, porque não são necessárias, porque existe compreensão e querer bem mútuo... Onde a gente não é tão egoísta... Um lugar onde este texto inspiraria muitas pessoas e faria uma menina que treme e chora como eu, ser confortada por alguém sorrindo, ou alguém a beijando e a levando a algum lugar novo e bonito.
Ieda Marcondes - 11/05/02 |
