Só agora, já na segunda semana de fevereiro, me dou conta de que estamos no ano 2000. Vejo aliviado que, tirando alguns passageiros de ónibus, trem ou avião, o mundo não acabou. Esta conversa de final do mundo é como voar de avião. Há quem tenha muito medo e há quem não tenha medo algum. A maioria contudo, por via das dúvidas, sempre fica em silêncio na decolagem.
É certo que todas as previsões falavam no novo milênio e não propriamente no ano 2000. Após alguma negociação ficou decidido que 2000 é o último ano do segundo milênio e não o início do terceiro, como muitos pensavam. Na realidade, houve uma batalha entre os puristas e os festivos. Os primeiros invocaram a precisão conceitual, como se a contagem estivesse correta. Os outros, mais festivos, acharam bonitinho o número 2000, assim redondo como se diz. De qualquer forma os festivos só concordaram com a decisão após comemorarem a virada. Com isto ganham mais um motivo (como se fosse necessário) para cascatas de fogos e apoteoses em geral no final do ano. Pra quem gosta, não chega a ser ruim. Hecatombe adiada, temos o ano todo para uma preparação mais adequada.
Considerando nossa índole descansada, ainda é cedo para se tomar qualquer providência, mesmo porque, como acontece sempre, este ano só inicia em oito de março. Após o meio dia, é claro. Assim, de certa forma estou adiantando os acontecimentos achando que já estamos no ano 2000. Precipitação.
Na realidade estamos em um período muito peculiar. Esta época do ano é uma espécie de hiato. Inicia no primeiro dia do ano e vai até o término do carnaval. Aí temos outra imprecisão, mas a maioria concorda que este ano o carnaval termina no dia sete de março. Há os reticentes que insistem em prosseguir até o início das festas juninas mas são uma minoria, não mais que uns vinte milhões. Este é o período de recessos variados. Os gaúchos vão à praia, os cariocas montam alegorias e os baianos lavam duas ou três igrejas, esperando o dia do carnaval oficial. Desnecessário lembrar do legislativo e do judiciário.
Com isto, fica difícil iniciar o ano, sem falar naqueles que estão presos em nevascas do hemisfério norte. Não são muitos, mas de um modo geral são os que mandam no dinheiro.