Não se sabe como Pedrinho conseguia forças para suportar sessenta quilos de sacaria ou caixas de produtos industrializadas sobre seu corpo franzino e pequeno. Media pouco mais de um metro e sessenta e seu peso não chegava aos sessenta quilos. Sem vínculo empregatício conseguira a muito custo uma chapa que lhe conferia o direito de trabalhar como estivador. Fazia ponto, principalmente, na Avenida Getúlio Vargas e transitava com liberdade no centro atacadista de Picos. Gozava da confiança de grandes empresários como Pascoal Silva, Major, Cambito, Isaac Batista e Diassis e tantos outros da Rua São Benedito ode passava com menor frequência à procura de serviço. Além de não possuir a grande massa muscular necessária para lidar com objetos pesados, era coxo de uma perna, sequela de algum acidente ou deficiência na formação óssea. Com esse porte físico frágil desde que o conhecemos e debilitado pela escassez de recursos para ter uma alimentação saudável, sua vida útil como estivador durou apenas dez ou quinze anos. A partir daí, com as formas diminuídas não compunha mais , o grupo de sua classe profissional nas empreitadas para carregar ou descarregar caminhões, porque a escolha contemplava sempre os mais fortes, e com isso, Pedim ficava fora da equipe e sem trabalho. Embora carente e merecedor de ajuda, jamais pediu outra coisa, senão serviço, mas a oferta condizente com sua capacidade de trabalho se tornava, a cada dia, mais rara. Por contingência da necessidade, prestava-se para dar recados entre os comerciantes e entregar pequenas compras domésticas, empurrando um carrinho de quadro rodas - obra do artesanato criativo de algum marceneiro. O carrinho fora adquirido por um balconista do Armazém de Diassis e entregue ao chapeado para que pagasse em prestações suaves, com os fretes que conseguisse pegar.
Sentado nos degraus de acesso ao Armazém do Sr. Isaac, acompanhava o movimento dos fregueses que saíam com pacotes na mão, e oferecia seus préstimos para levar as compras, na expectativa de receber alguma gorjeta. Olhar triste, vontade e necessidade de trabalhar para ganhar o pão, observava seus companheiros descarregarem uma carreta de Cimento Nassau. Dois chapeados ficavam em cima da carga e, normalmente, três em baixo recebiam os volumes e os conduziam para o interior do depósito. Um dos estivadores empilhou alguns sacos de cimento na beirada da carroceria, a fim de agilizar a descarga. De onde estava, Pedim viu vários sacos de cinquenta quilos deslizarem da carroceria, no momento em que passava um estudante de aproximadamente nove anos. Sem vacilar, lançou-se contra a avalanche, escorando com sua cabeça a pilha de sacos que caía, antes que ela atingisse o garoto. Nesse ato heróico, usou as últimas forças que tinha, salvou a vida do estudante dando por ele sua própria vida. No acidente, quebrou o pescoço e teve morte instantànea.
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Nota do autor.
Chapeado, estivador credenciado a trabalhar em estivas (NE). Sua identificação se dava por meio de uma chapa afixada no chapéu, de modo que, só podia carregar ou descarregar caminhões, quem fosse chapeado.