Usina de Letras
Usina de Letras
20 usuários online

Autor Titulo Nos textos

 


Artigos ( 63467 )
Cartas ( 21356)
Contos (13307)
Cordel (10364)
Crônicas (22586)
Discursos (3250)
Ensaios - (10766)
Erótico (13601)
Frases (51968)
Humor (20212)
Infantil (5645)
Infanto Juvenil (5003)
Letras de Música (5465)
Peça de Teatro (1387)
Poesias (141391)
Redação (3379)
Roteiro de Filme ou Novela (1065)
Teses / Monologos (2444)
Textos Jurídicos (1975)
Textos Religiosos/Sermões (6387)

 

LEGENDAS
( * )- Texto com Registro de Direito Autoral )
( ! )- Texto com Comentários

 

Nossa Proposta
Nota Legal
Fale Conosco

 



Aguarde carregando ...
Cronicas-->EXTREMA IMPOTÊNCIA -- 04/09/2006 - 16:23 (Délcio Vieira Salomon) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
EXTREMA IMPOTÊNCIA

Délcio Vieira Salomon


Naquela cadeira acolchoada e de longo espaldar, lá esta ele. Resignadamente sentado. Cercado de almofadas de veludo e coberto por duas grossas mantas. Pressão e temperatura corporal baixas, sente o frio brotar das artérias e lhe penetrar cortante as entranhas. Urge protegê-lo. Há dias está constantemente febril. A respiração ofegante faz-lhe contrair cada vez mais os enfraquecidos músculos da face. O inexorável já o corroeu por dentro e lhe exauriu a tessitura interna dos pulmões. O que destes resta permite-lhe apenas puxar, em comovente esforço, o ar que entra pela janela semicerrada da sala. Tomou-lhe, qual avaro, o ouro derradeiro da esperança que ainda teima em gotejar nos interstícios dos alvéolos empastados pela escura nicotina. Durante trinta anos aspirou-a quase ininterruptamente. Intumescidos e petrificados, o fígado e os rins já não funcionam. Os ossos começaram o surdo trabalho de romper a amarelada pele e ostentar chagas em diversos pontos do corpo. Rosas vermelhas implodem no peito para revelar, às trevas de nossa ignorància, a alvura guardada secretamente por aquela compleição, não faz muito, atlética e esbelta. Invejada por muitos homens e cobiçada por inúmeras mulheres. Enquanto isso, o coração apenas lateja. Diante do espetáculo indesejado, ninguém pronuncia a palavra maldita. Mas ineludivelmente é ela o novo proprietário daquela situação. Ele simplesmente continua ali firme, resignado, estóico. De espartanidade comovente. Com esgar contrafeito a revelar misto de sorriso e dor, a tudo suporta e, em inversão de papéis, parece querer nos confortar. Leve e arfante queixume quase inaudível lhe brota do peito: - A hora está chegando. Bem o sei. Mas o que me incomoda é que vou desfeito com esta ferida enorme que se abriu em minhas nádegas de tanto ficar sentado. Vem o enfermeiro e lhe aplica pela última vez a morfina tão aguardada. Afugenta-lhe a dor. Mas ela não se esvai perdida pelo espaço. Atinge a todos nós e seu dardo penetra fundo nosso peito contraído. Sem cerimónia nem aviso prévio. E passa a ser só nossa. Coletivamente nossa. Assumidamente nossa. A dor de vê-lo ir embora, sem nada podermos fazer. Ali, à frente daquela cadeira, diante de tanta fortaleza, registra-se nossa extrema impotência.
Comentarios
O que você achou deste texto?     Nome:     Mail:    
Comente: 
Renove sua assinatura para ver os contadores de acesso - Clique Aqui