Olhando assim pela janela do vigésimo andar, não é possível distinguir a fisionomia das pessoas, mas vê-se claramente o que acontece lá embaixo, ao nível do solo. Um vai pra cá, outro vai pra lá, a procura de vaga para estacionar, vê-se o movimento em geral. Não raro uma batida de automóveis, mas nada sério.
Uma das coisas que noto diariamente é a movimentação das moças do Le Bom Café. Elas usam um boné branco que facilita a identificação. Andam muito estas meninas, entregando lanches variados, saciando a fome de todo o Setor Comercial Norte. Sua base é aqui no prédio, mas têm um raio de ação muito amplo para as pernas curtas de suas meninas. Elas vão daqui do Brasília Trade Center até o prédio da Varig, voltam rápido para uma entrega no prédio ao lado.
Não se trata de nenhum café parisiense. Ao que consta, não servem quiches nem cafés especiais com direito a creme de leite, cascas de limão ou um toque de licor. Não há música ao vivo e é mais frequentado por alemães do que franceses. Em seu favor, há que dizer que usam pão francês. O ambiente é aconchegante, um pequeno balcão para atendimento interno e algumas mesas na rua. Sua especialidade é o trivial, estes lanches que fazem a alegria dos funcionários e secretárias, se bem que o pão de queijo mereça registro. O café expresso também é bom, justificando o nome. Confesso que fiquei chocado quando fui lá pela primeira vez. É que algumas das moças, têm o hábito de chamar os clientes de meu amor. Ou de meu bem. É um tal de meu amor pra cá, meu bem pra lá. Após o primeiro impacto, percebe-se que desejam agradar. Querem e conseguem ser gentis, a despeito do tratamento incomum.
O lanche é honesto, destacando-se o pão e queijo. Talvez eu esteja sendo injusto deixando de elogiar inúmeras iguarias, mas não posso falar mais. Condenado à dieta eterna, deveria me limitar à água mineral. Nem deveria ter provado o misto quente, a coxinha, o sanduíche natural, o suco de laranja, o enroladinho de salsicha e o de presunto e queijo. Bom-bons variados então, nem pensar. Eu nem mesmo deveria saber que o misto quente pode ser feito com pão francês ou pão de forma. Nem mesmo o pão de queijo eu deveria apreciar. Como dizem nos filmes, ninguém é obrigado a depor contra si, de modo que me abstenho de maiores comentários sob pena de me incriminar em demasia. A questão aqui é a distància percorrida pelas meninas no atendimento à clientela.
Vão longe estas meninas.
Escrito em 25.10.2000
Publicado na Seção Comentários do Cidade Virtual Brasília em 28.10.2000