A preguiça é pecado,
Um dos vícios capitais,
Dizem que chega atrasada
Até para os comensais,
Se esconde, não aparece
Quando o dia escurece,
Mas vai cedo aos matinais.
II
Quem escuta meia missa,
Sai da igreja meio bento
E sabe que ao entardecer
Todo gato é cinzento,
Quando anoitece é pardo,
Conforme diz o brocardo,
Assim fala o velho vento.
III
Aprendi no catecismo
Que o homem preguiçoso
Vai sempre na contramão
Daquele que é ganancioso,
O certo é estar no meio,
A verdade até mim veio,
Foi-se e me deixou saudoso.
IV
Em nossa era moderna,
Tudo é por competição,
Vence sempre o mais forte,
Mesmo sem ter coração;
É a Lei do Capitalismo
Que empurra para o abismo
A nossa grande Nação.
V
A represa é uma barragem,
Barra cachoeira e cascata
E o cerrado vai morrendo
Pela sanha insensata;
A lei do mercado dita
E a moto-serra grita,
Chorando ao matar a mata.
VI
Mesmo assim o brasileiro
Acha razões para rir,
Seja em samba ou futebol,
Sempre aposta no porvir
E que viva o machismo!
Despreguiça-se o cinismo:
“Mulher é só pra parir”.
VII
Só não choremos em vão:
Sobrevive a classe média,
No auge a alta supera,
Geme no chão a tragédia
A baixa os seus lacrimais;
Sem esquecermos jamais,
Que a vida é uma comédia.
VIII
Toda piada para mim
Traz uma útil mensagem,
Aquela que conto adiante
É contrária à vadiagem,
Aquele que conta um conto,
Embora aumente um ponto,
Nunca perde a viagem.
IX
Em São Paulo, a Capital,
Fez-se um concurso recente,
Foi no Teatro da USP,
Por sinal bem concorrente;
No edital estava dito
Que o único requisito
Era a preguiça somente.
X
Entre tantos candidatos
Ficaram três finalistas:
Um mineiro e um carioca,
Outro um gaúcho de cristas,
Mas antes do julgamento
Houve um entretenimento,
Os três dançando em pistas.
XI
O mineiro dançou bem
Seu famoso arrasta-pé,
Carioca dançou um samba
E arrematou num axé,
Gaúcho na empolgação,
Dançou xote e vaneirão,
Terminou num chamamé.
XII
Aplaudiram os presentes,
O teatro estava lotado
De infantes até idosos,
Torciam pra qualquer lado,
Esperando os três na toca,
Crianças comendo pipoca,
Ouviram o anunciado.
XIII
O governador do Estado,
Na cerimônia presente,
Terminou com uma piada
Seu discurso comovente:
Ele ouvira de um sulista,
Que paulista é especialista:
"Alisa um pau bem contente."
XIV
A platéia delirou-se,
Entretanto o locutor,
Com a sua voz pomposa
Estrondou naquele ardor:
- Eu anuncio o desfecho,
Com chave douro eu fecho
Este festival de humor.
XV
Convoco aqui os finalistas,
Os preguiçosos, de fato,
Que já ganharam concursos
Até entre cão e gato,
Platéia é quem vai julgar
E também vai premiar
Quem é preguiçoso nato.
XVI
Chegou o auge do concurso
Vamos conhecer agora
O homem mais preguiçoso
Deste mundo de outrora,
Que aqui se apresente
Preguiçoso tão somente
E que diga aonde mora.
XVII
O locutor continuou
Com voz forte bem erguida:
- Chamo o mineiro e o carioca
E o gaúcho em seguida,
Os finalistas são três,
Apresento-os a vocês,
Cada qual conte sua vida.
XVIII
Filho de Minas Gerais
Mineiro pôs-se a dizer:
“Ceis nem vai acreditar
Acho que inté querão ver,
Uai! Num sei o que acuntece
Eu tenho mais num carece
Preguiça inté de comer".
XIX
O carioca foi dizendo:
- Nem sei como aqui venho,
Na verdade fui trazido
Por um amigo de empenho,
Todo mundo até vai rir,
Eu não deito pra dormir,
Tanta preguiça que tenho.
XX
O gaúcho apresentou-se:
Vou falar para você,
Embora o costume é tu
Lá no sul como se vê;
Mas eis que barbaridade!
Eu tenho é na verdade
Preguiça em catacrar, Tchê!
BENEDITO GENEROSO DA COSTA
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