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Contos-->TALENTO -- 03/11/2003 - 12:43 (José Alves Garcia Santos Silva) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
O sol se pusera bem cedo naquele dia de inverno que assim se parecia somente pelos dias mais curtos, já que frio mesmo só fazia uma ou duas vezes no ano quando os ventos glaciais contornavam os Andes e baixavam os termômetros até o Planalto Central do Brasil. Nos demais dias o calor causticante fazia suar na sombra enquanto o vento seco e morno emprestava um ar de estufa àqueles campos gerais.

Ivan Marion Tulov olhou o contorno das serras chapadas contra o céu violeta nem-noite nem-dia, aqui e acolá a silhueta torta de uma árvore de cerrado decorando o perfil da serra. Ficou assim, olhando calado, taciturno, aquele horizonte amplo até que, pouco a pouco, ele foi sumindo, esmaecendo na noite sem lua.

Entrou em casa e comeu arroz com pequi, feijão e farinha-de-mandioca. Foi até a sala, olhou os livros na estante, passou a mão grossa na lombada de "Os Sertões", pensou em Canudos, na luta dos sertanejos, na peleja dessa vida e teve sono. Foi para o quarto e se deitou na cama dura porque molas e espuma nunca lhe deram conforto. Dormiu o sono dos justos.

Enquanto dormia sentiu que era arrebatado suavemente em direção a um pilar de luz que sustentava um ser angelical de inominada beleza. Morrera, compreendeu. Então morrer era assim, suave? Sem estertor nem gritos e aquele lugar tranqüilo, aquela paz inerente... se aproximou da luz e perguntou calmamente:
- Aqui é o Paraíso?
- "O paraíso de qualquer coisa está em sua perfeição." Respondeu a entidade, com uma voz tão agradável aos ouvidos como Ivan jamais ouvira.

Ivan ficou pensando no que ouvira e tentando entender onde estava, tornou a perguntar:
- Se acho que está perfeito então estou no Paraíso?
- A perfeição do seu ser é o seu próprio paraíso. Tornou a responder o anjo.

Agora ficava mais claro mas, começava a ficar assustador. Se a regra era: "Sede santos como o Vosso Pai é Santo" Ele não estaria tão perto do Paraíso quanto gostaria. O jeito era perguntar mais:
- A questão é ser Santo?
- O caminho é esse.
- Mas, fui fiel toda a vida.
- Também conta...
- Criei bem os meus filhos, ensinei-lhes os valores da vida, o trabalho, a oração, o poder da palavra.
- Faz parte, faz parte...
- Como, faz parte? O que mais poderia?
- Os talentos, Ivan - era a primeira vez que falava seu nome - Os talentos, o que fez com os seus?
- Tinha boa inteligência e estudei, com o estudo trabalhei com afinco e eduquei 8 filhos, comprei coisas, vendi, escrevi uns poemas, alguns contos e tal... eu lutei o bom combate. Lutei o bom combate!?...
- Lutou mesmo?

Ivan começou a ver sua vida passando diante de seus olhos como um filme em sua mente, em alta velocidade, ao final um calafrio percorreu-lhe todo o corpo. Estava ali sendo instado a prestar contas de seus atos como tantas vezes havia imaginado que seria, inclusive sobre os talentos mas, o tom inquiridor daquele ser etéreo ao dizer Os talentos, o que fez com os seus? estava incomodando-o e, por mais que se esforçasse, não conseguia falar dos seus dotes e todas as coisas que realizou com eles. Havia um bloqueio em sua mente. Seguiram-se momentos de angustiante silêncio.

Com muito custo balbuciou: - mas... o que mais poderia ter feito.

- A terra Ivan. Falou o ser com voz tão grave que ficou ecoando na sua cabeça enquanto lembrava as glebas que poderiam ter sido plantadas mas não foram . Compreendeu que poderia tê-las cedido a meeiros ou consentido que seus filhos plantassem. Um turbilhão de idéias passou fruir em sua mente e, simultaneamente, recordava todas as técnicas de conservação do solo e a saga de John Steinbeck em As Vinhas da Ira , os conceitos de zootecnia do seu tempo de faculdade e sua pesquisa sobre os cupins. Nem um livro publicado... nem um acre plantado... nenhuma multiplicação. Os pensamentos giravam em sua cabeça alternando com imagens da sua vida e a alta velocidade do giro lhe provocara tonturas. Tudo ao seu redor girava, agora à mesma velocidade das idéias e Ivan caiu ao chão suplicando à luz repetidamente: eu queria o melhor... eu queria o melhor... .

As imagens formavam agora um cilindro de luz. Exatamente como o pilar que sustentava aquele ser misterioso e Ivan oprimido com a idéia de que poderia ter feito mais, suando frio e agitando a cabeça de um lado a outro acabou acordando com sua própria voz repetindo:
- Eu queria o melhor... Eu queria o melhor...

Compreendeu então que estava sonhando. Mas parecia tão real que isso o assustou. Levantou-se e olhou pela janela a lua crescente que ia alto no orbe celeste. Ivan compreendeu muito mais do que apenas isso pois a partir do amanhecer um outro Ivan haveria de rever a ocupação da terra, a gestão dos bens, o desenvolver talentos.

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