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Contos-->A entrevista. -- 17/10/2000 - 13:10 (Manoel Carlos Pinheiro) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Verificou tudo outra vez e, apesar de inquieto, ficou satisfeito. Todos os papéis organizados e classificados por ordem de prioridade. Não tinha certeza de que poderia abordar todos os assuntos. A reunião mais importante de sua vida. Não precisava dizer a ninguém, mas jamais fora à capital. E hoje seria recebido pelo próprio governador. Apesar da tensão e do nervosismo, uma ponta de júbilo.

O terno de linho branco estava impecável. O cabelo bem penteado, com um pouquinho de gel para não assanhar. A gravata ligeiramente apertada, mas já se adaptara e conseguia disfarçar o desconforto. Sapatos brilhantes, confortáveis. Custaram uma fortuna.

Um longo caminho para chegar ali. Origem humilde. Família desestruturada. Pais analfabetos e dependentes do álcool. Muitos irmãos. Mal alimentados e quase desabrigados. Surrados por tudo e por nada. Agarrou-se a cada oportunidade como a uma tábua de salvação.

Ingressou no seminário, única forma de poder estudar. Coitadas das irmãs que se orgulhavam dos diplomas adquiridos: Olívia corte e costura, Mariana datilografia, Josefa culinária. E os irmãos, Arimatéia sapateiro, Eutrópio caminhoneiro, Joaquim mecânico, Augusto marceneiro. Faleceram, ainda pequenos, Eulina, Sebastião e Paulo. Perdeu o contato e as amarras. Nem sabe onde foram parar os irmãos. Imagina que os pais tenham morrido.

Era evidente a sua falta de vocação para o sacerdócio. Lamentou perder as viagens para a Itália. Saiu do seminário e começou a trabalhar no comércio. Do sertão para o agreste, escriturário de fábrica. Ainda tentou o curso técnico comercial, impossível. Melhor assim. O dom da oratória o fez um rábula respeitado. Por acanhamento, jamais usou o anel de advogado. Neste aspecto, os filhos é que realizaram o seu sonho: médico, engenheiro e, a caçula, advogada.

Engoliu muito sapo. Manteve a dignidade, mas, lá no fundo, tem dúvidas. Há momentos em que acha que capitulou. O ingresso na política fora determinado pelo envolvimento com as questões sociais. Inconformado com a injusta situação fundiária, a exploração, a miséria, a fome.

Derrotou as oligarquias políticas. Sangue novo, ousadia, determinação. Fez o sucessor. Foi traído. Voltou a ser prefeito. Mais experiente e pragmático. Necessárias algumas articulações para a viabilidade do projeto político. Dar os anéis para manter os dedos. O projeto já desfigurado. Base de sustentação política ampliada.

Mas continua respeitado pelos seguidores. Graças ao trabalho: sério, constante, árduo. Honestidade e transparência absolutas no trato da coisa pública. Pouco a pouco transforma-se em uma legenda.

Por isto foi chamado pelo governador. A sua esperança é tratar de questões administrativas. Teme a tentativa de cooptação. Considera-se preparado para não cair no canto da sereia. O governador é uma raposa. E ele duvida de sua própria habilidade em não aderir sem se indispor. Tentará ações protelatórias. Espera que o governador não lhe bote a faca no peito.

A reunião mais importante de sua vida. Apenas para si reconhece: não há dois caminhos. Não é possível a conciliação e o meio termo. O projeto político e o projeto pessoal estarão em oposição antagônica.

Manoel Carlos Pinheiro
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