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Contos-->Contrabando -- 11/10/2003 - 16:06 (Juraci de Oliveira Chaves) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

Estava uma linda manhã de verão, na mina Ouro–Vivo à beira do Rio das Velhas, no norte de Minas Gerais. O sol brilhava e prometia mais um dia de calor. Como era de costume aos sábados, o Sr. Carlos Marques Pimentel proprietário majoritário da mina, terreno recheado de minerais com predominância no ouro, e o gringo, seu sócio Sr. Teed Petterson – com apenas 20% dos lucros – faziam-se o balanço da mercadoria armazenada.
O armazenamento do produto era feito em sacas de couro, com cascalho e areia – usavam essa prática para dificultar o roubo das pedras - posteriormente levados para outro setor mais seguro, faziam-se a seleção do ouro; era transformado em líquido, colocado em prensas formando barras e comercializado de acordo com a cotação da bolsa.

- O que é isto, Teed? O Sr. Carlos Marques apontava para uma última pilha dos fundos.
- O que há de estranho Carlos?
- Estão faltando sacas nesta coluna. Puxa!... Estamos sendo roubados. Não percebeu?
- Hum!!! Estamos mesmo. Ou não? Talvez os empilhadores não formaram pilhas iguais.
- Tenho certeza que sim. Precisamos descobrir para onde está sendo desviada essa mercadoria. Deve haver bastante tempo. Está manso esse ladrão!
- Ou estão...

O Sr. Marques afastou-se com passos rápidos, com cara de poucos amigos, planejando como pegar o larápio das pepitas. Sabia que o gatuno estava no meio deles não podendo confiar em ninguém. Comprara esta mina aos poucos, dos desistentes do garimpo, possuindo atualmente apenas um sócio.
Morava na sede da mina com sua mulher dona Natália Pimentel, seu filho César Pimentel e a secretária doméstica Suze Prado; esta, muito inteligente, curiosa e com pretensões de ainda ser a esposa do patrão. Muitas vezes dava ordens até à patroa; arrumava os móveis de acordo com sua preferência, aproveitando-se da timidez, da insegurança e ausência diária da dona da casa.
Natália dirigia o escritório da mina e dificilmente olhava nos olhos das pessoas com receio de demonstrar o interesse que sentia pelo sócio, apesar de ter resistido, e muito, aos seus galanteios.


- César, hoje você vai pôr tocaia e descobrir quem está subtraindo as nossas
"sacas de cascalho" do depósito.
- Como percebeu isso, pai?
- No balanço semanal. Na recontagem descobrimos o furo. Faça tudo com o maior sigilo.
Muito obediente e esperto começou a arrumar os objetos de tocaia sem muitas perguntas.

Horas depois, armou sua rede na copa de uma enorme árvore e ficou a dormitar. O silêncio era rompido somente pelo barulho das águas sobre as pedras do rio onde era realizada a garimpagem. Rio esse, poluído pelas substâncias químicas utilizadas na extração de minerais.

Bem tarde da noite fria, percebeu a presença de alguém com andar trôpego parecendo-se embriagado, já com a saca nas costas.
Sem esperar, mesmo para identificação, puxou o gatilho e mirou à presa. Estampido... Erro de mira...
Percebendo a direção de onde partiu o projétil, o gatuno enviou outro para o mesmo percurso e... O corpo caiu quase sem vida; ainda agonizando murmurou para Mauro Lúcio que também estava investigando por ordem do Sr. Teed e correu para socorrê-lo.
- Foi...Foiii... Fo...
- Não fale, vou levá-lo para sua casa e logo estará medicado. Denunciarei ainda hoje esse atentado.

O assassino chegou por trás e... - Se abrir o bico haverá mais um morto neste garimpo. Seu sangue será misturado com o mercúrio e garimparemos muito ouro por aqui; não lhe darei tempo de provar o que denunciar.
Naquele mesmo instante, Mauro em disparada, correndo em ziguezague, prevendo ter a mesma sorte do outro, foi procurar socorro para o filho do patrão.

***
- Não cerre os dentes ainda filhinho do papai; não antes de eu garimpar esses dentes de ouro que possui; não pode voltar para a terra, tive muito trabalho para extrai-lo do solo quando era pedra bruta.
O canivete afiado adentrava nas gengivas do rapaz, fazendo o sangue perder a cor ao misturar-se com a areia do local.
Na primeira extração o corpo tremeu rigidamente; um gemido longo acompanhado de um suspiro mais longo ainda, indicavam que a alma estava indo procurar outro espaço para sua encarnação.
E foi...
***

Naquele dia era só tristeza, com muitas lamúrias e arrependimentos; o pai não se conformava em ter enviado o filho para enfrentar o perigo. Sentia-se responsável pela sua morte.
O sol já estava alto quando o inspetor Kalonge chegou para dar início às investigações. Pretendia elucidar o caso em tempo recorde, mediante oferta polpuda recebida pelo pai da vítima para não deixar o caso sem solução. Com o seu jeito sisudo e de poucas palavras, mirava todos os presentes, que não eram muitos.

A sala estava empestada com o cheiro das velas. Folhas de laranjeira dentro d água numa bandeja prateada e cravos amarelos decoravam todo o recinto. Um crucifixo de braços abertos, à parede, abençoava até o criminoso. O silêncio era profundo. As pessoas falavam em voz baixa quase num cochicho com receio de se denunciarem ou de falar algo que os tornassem pessoas suspeitas.

O representante da lei, de vez em quando, fazia pausadamente algumas anotações. Descobriu logo que se tratava de um 38, de acordo com o furo provocado pela bala, nas imediações do coração e precisava encontrá-lo. Fora ao local do crime acompanhado do Sr. Marques e nada encontrando resolveu voltar e continuar as investigações, em casa, ao lado da vítima. Tinha quase certeza que o criminoso estaria ali colocando areia nos olhos para provocar lágrimas.

O inspetor observava com insistência, à secretária da casa, Suze Prado, que exagerava nos cuidados com o patrão, deslizando pela casa como se fosse ela a patroa e não a Sra. Natália Pimentel. Essa, encostada num sofá, chorava em silêncio trespassada pela dor. Apesar de marcada pela tristeza, sua elegância e beleza causavam admiração a todos.
Não passaram despercebidos também ao inspetor, os lânguidos olhares de Teed Petterson e o seu esmero cauteloso em consolar a senhora que perdera o filho drasticamente.

Natália Pimentel dividia o seu precioso tempo entre a casa e o escritório da empresa. Fora ai que não resistiu ao assédio do gringo quando prometeu levá-la para o exterior e recomeçarem nova vida, já que ao lado do marido, era mais uma escrava. Muitas e muitas noites ficava no escritório sob qualquer pretexto à espera de mais uma explosão amorosa proibida, ou fazer a escolha das melhores pepitas e ocultá-las no esconderijo do jatinho de Teed. Muito tímida, sempre triste, cabisbaixa, preocupada em ocultar sua cumplicidade, sua traição à flor da pele. Percebia que estava navegando em mares proibidos, sem limites; não era mais dona de sua razão, de seu ser.

_Trabalha com essa família há muito tempo Srta. Suze ?
_Cresci junto com o César, Sr. Inspetor. Com a morte de minha mãe - a empregada da casa - continuei morando aqui e agora sinto-me impotente sem poder fazer nada; enxugava as lágrimas com um lenço branco bordado com as iniciais C.M.P. Era uma rapariga simpática ainda jovem aparentando ter seus vinte e poucos anos.
- Rejeitei os insistentes convites do César para passear, jantar, fazer piqueniques.
- Brigavam muito ou eram bons amigos ?
- Todo mundo briga; nossa briga maior era quando ele me chamava de madrasta... Sei não... Ele não suportava mesmo era o Sr.Teed, sócio do pai. Sempre discut... não terminou a frase; percebeu que não estava sendo mais ouvida. Leu rapidamente quando o inspetor anotou: " em cada bolso dele há uma manchinha de sangue".

_ Posso ajudar em alguma coisa Sr. Kalonge? Ofereceu Teed Petterson procurando disfarçar o seu nervosismo.
_Tem algum suspeito Sr. Teed?
_ Não, não tenho. Pobre César!... Sempre o alertava para ter cuidado com sua boca dourada, isca para ladrões.
_ Pelo que pude observar não havia tanto ouro assim em sua arcada dentária. Acredita que o mataram para roubar seus pequenos caninos? Só quem nada possui, arriscaria ser descoberto por apenas dois dentinhos de ouro maciço.
_ Sabe que tem razão Sr. Inspetor? Presenciei uma discussão entre o falecido e o motorista que se recusava fazer uma viagem para buscar mantimentos, fora do horário de trabalho. Com a ameaça de ser despedido realizou a tarefa.
- Hã!... E quem era o motorista?
- Aquele que está na cabeceira do caixão, chorando copiosamente; deve ser remorso...
- Qual o nome dele?
- Ele se chama Francisco; o Chico. Chegou aqui há uns dois anos. Gosta muito de uma cachacinha, prejudicando até o seu trabalho. Os carros estão sempre amassados, faróis trincados...
- Já devia ter sido despedido, não?
- Falta motorista qualificado, na mineração. Todos querem ficar na cidade.
- Hum!!! Vou dar uma palavrinha com ele. Mas... Para onde ele foi?...

Não demorou muito, o cortejo prosseguiu para o cemitério e na casa vazia escutava-se os soluços queixosos da mãe que profanava ao criador por ter levado o que lhe era mais sagrado.

***
Um mês depois, numa estrada de rodagem...

- Pensou que ia ficar impune Sr. Francisco? Nunca deixei escapar um suspeito. Por que fugiu naquele dia do velório?
- Fiquei apavorado Sr. Kalonge. Todos me olhavam...
- Já sei que matou o César.
- Eu!!!
- Sim, você. Percebi os sinais de sangue ao guardar os dentes no bolso da sua calça. Esqueceu de lavá-los antes. E a arma onde está? Por que e a mando de quem?

Ao ser algemado, apavorou-se e sem muita delonga comentou: - Fui mandado selecionar as pedras pela Srª Natália Pimentel. Sempre faço isso para eles. Ela não sabia que o filho estava naquele dia, na espera. O morto seria eu, mas ele errou o tiro e eu acertei.
- Pela Srª Natália? Seu Canalha!
Recebeu vários pontapés por todo o corpo principalmente nos testículos, fazendo-o contorcer-se de dor.
- Isso é para não brincar com a lei e ficar levantando falso testemunho às pessoas de bem.
- Não estou mentindo! Eu pegava a saca de cascalho misturada com o ouro, cessava, separava e levava o mineral para o Seu Teed com a ordem de dona Natália.
- Por que para o Sr. Teed?
- No seu jatinho, há um esconderijo de pepitas de ouro. Ouvi um plano deles preparando para fugir, se já não fugiram.
- Você é um cretino mentiroso... Vou averiguar agora mesmo mas, se estiver mentindo... Sua pena será dobrada...

Empurrando o algemado para dentro do carro seguiram para as proximidades da mina. Lá chegando, desenterraram a arma tendo escondido em seu cano , os dentes extraídos e roubados da vítima.
Mais tarde, foram recebidos pelo Sr. Pimentel que ouviu horrorizado toda a estória relatada pelo assassino sem nenhum arrependimento. Mal podia acreditar no relato daquela tragédia quando observou que fazia horas não sabia onde andava a sua esposa.
Minutos depois ouviram o jatinho do Sr. Teed roncando no ar. Saíram para o terreiro para observarem o que estava acontecendo, quando certificaram-se que os dois estavam fugindo.

De repente, perceberam que alguma coisa rolava do aparelho para baixo esborrachando-se no chão. Correram para lá e a Srª Natália já não respirava mais. No seu decote um papel escrito: " Dessa mina só queria o seu ouro. Já tenho o bastante. Devolvo-lhe sua mulher. Adeus!... TEED PETTERSON."

Arrasado, o Sr. Pimentel murmurou: - Mais um, impunimente, levando nosso ouro para o exterior...

Juraci de O. Chaves
Pirapora MG
www.jurainverso.kit.net
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