Pensava em rosas, quando se deparou com uma árvore, lindamente repleta de flores. Eram de cor amarela, bem clara. Um brilho surgiu em seus olhos, com a visão.
Com passos lentos, braços ao longo do corpo, cabeça erguida, foi em direção àquela árvore. Quis imaginar o vento levando a ela uma daquelas flores, que poderia estar pra cair, quem sabe. Não importava. Quis que viesse o vento e ele veio em forma de brisa leve e fria. De olhos fechados, continuou a imaginar. E viu-se a correr pelo campo, de sorriso largo, a ter sua mão tocada pela de seu pai. Brincariam de pega-pega, com seus cabelos ao ar, a respiração ofegante, o coração mais feliz que nunca. Faziam isso quando era pequena. Via-se correndo novamente por todo o lugar. Pôde ouvir as músicas que tocava no piano. Na época, tinha começado a aprender e era incentivada pelo pai, exímio violinista.
Estava bem próxima da árvore, quando abriu seus olhos. Respirou profundamente. Sentiu uma lágrima escorrer por seu rosto. Uma grande tristeza tomou conta de seu coração. Seu pai era tudo, tudo que mais amava na vida. Sua partida era esperada, sua idade estava avançada e trazia fraquezas que ninguém poderia evitar. A cabeça baixa fez com que os cabelos pretos lhe cobrissem os olhos, enquanto novas lágrimas caíam com dor. O peso do sofrimento fez com que se abaixasse. Uma vertigem a fez sentar-se na grama verde. A saudade fez com que se prostrasse. Chorava muito. Mais que isso, sua alma sofria como nunca.
Não quis que ninguém a acompanhasse quando saiu pela manhã. Seus filhos até quiseram insistir, mas sentiram as mãos do pai, tocando seus ombros. Era o recado de que precisariam ficar distantes de sua mãe, naquele instante. Ela precisava ver-se sozinha, com seus medos e perdas. Precisava.
Já um pouco refeita, foi tocada pela brisa novamente. Abriu seus olhos para observar à sua volta. Via que tudo estava do mesmo jeito de antes. Seu pai tinha ido embora, para nunca mais, e mesmo assim, tudo permanecia intocado. Como isso poderia ser possível, se para ela nada ficou no lugar? Não teria mais as tardes de domingo, o café fresquinho, o cigarro de palha, a rede, o calor daquele abraço. Tudo tinha terminado enfim.
Novamente uma lágrima quis surgir. Até que ao longe pôde avistar dois pássaros pequeninos que brincavam, dançando no ar. Eram verdes, como o oceano, e se tocavam ligeiramente durante o vôo. Aproximaram-se rapidamente e quando deu por si, estavam na árvore. São beija-flores! Que lindo! Meus filhos iriam adorar vê-los tão de perto! E o vôo se prolongou por um tempo, enquanto encostavam delicadamente os bicos nas flores da árvore. Iam de flor em flor, calmamente. Estavam felizes. Depois de alguns instantes, os dois se encontraram de novo no ar e foram embora. Que paz isso me trouxe... Que paz....
Quando percebeu, uma flor, uma das que foram "beijadas", caiu em seu colo. Um sorriso estampou-se em seu rosto. Sentiu um alívio no coração e a lembrança dos filhos lhe veio com mais intensidade. Como estariam depois da perda do avô? Deus, não os deixei virem comigo! Levantou-se com força, sem vertigens, sem a lágrima que não caiu. Começou a caminhar apressadamente no caminho de volta à casa. Meus filhos...
Não havia o que se dizer, e por isso, só houve um abraço demorado, entre eles. Não havia o que entender. Simplesmente tudo foi compreendido. A vida teria que continuar, porque amava seus filhos, porque tinha uma família, porque existem as flores, porque existe o vento... Porque era preciso. Não foi necessário dizer nada. Absolutamente nada.