Ele abriu a porta do apartamento em silêncio. Lisa já deveria estar dormindo e agora não seria o momento apropriado para longa e complicada conversa. Tirou o paletó, o sapato, deitou no sofá. Sentiu o ar sufocando o pulmão, a garganta seca, o coração em ritmo acelerado. Teria que pensar seriamente no que falar, escolher palavras corretas, tentar explicar da melhor forma possível, sem magoá-la. Mas haverá alguma maneira de evitar tanta frustração? Lisa o ama quase que desesperadamente, sempre o amou, sempre presente e justa para esse amor…
Que fraqueza! Se ao menos tivesse tido a coragem de dizer logo de início, a honestidade necessária para com ele mesmo, uma simples coragem. Fechou os olhos, respirou fundo e seus pensamentos se misturaram com imagens de prazer que seu corpo tanto deseja. A mão acariciando o peito, o deslizar dos dedos, ereção…Com violento gesto levantou-se do sofá e acendeu a luz. Por alguns segundos seus olhos irritaram-se diante da abrupta iluminidade. A sala perfeita, a casa perfeita, fotografias de família e amigos. Sem saber a razão exata, procurou o livro que Lisa havia comprado quando pensou que estivesse grávida; “ Escolha o nome de seu bebé”. Abriu algumas páginas e ficou olhando os nomes marcados com lápis; pequenos corações feito por Lisa. Nada adiantou, o bebé não veio. Mesmo assim ela continuou amando-o, sem tristeza, rancor ou culpas.
Ficar assim não é possível. Agora que reconhece, aceita, o prazer em sua própria existência. Pedirá desculpas por nunca ter dito nada, pelo silêncio nas noites vazias, por não concluir que seu amor era outro, que sua intenção era outra. Pedirá desculpas pela falta de um filho, por dois anos mascarados em mentiras que ela nunca pensou existir. Se fosse mais fácil, se Lisa não tivesse tanta devoção…
Jogou o livro sobre a mesa, procurou pelo paletó, sapatos, saiu do apartamento como quem chega ao fim de um túnel…Tirou do bolso o celular, com a voz trémula falou : “ Paulo, preciso ficar com você! “