Marina vestia um vestido, hum, pouco usual. Ia até embaixo do joelho e, na parte da saia, mudava de cor a cada cinco centímetros. Olhava-se no espelho quando Fernanda entrou. Fernanda, irmã mais velha de Marina, estava com os cabelos molhados, enrolada numa toalha. Acabara de sair do banho.
- Que PORRA é essa, Marina!? – Fernanda não fazia a mínima questão de ser gentil ou até mesmo educada com a irmã.
- Esta PORRA é a última moda. Não tenho culpa se você é desinformada – Marina, por sua vez, não era abalada pelo sarcasmo da irmã.
- Última moda aonde? Cabrobó?
E assim continuaram por quase uma hora. Era o aniversário de Marina naquele dia e ela já havia jurado para si mesma que nada no mundo tiraria seu ânimo. Afinal, Marina havia planejado aquela festa de quinze anos desde que ela tinha sete.
Seus pais fizeram tudo como manda o figurino e talvez estivessem mais animados que a própria Marina, já que Fernanda, para desgosto deles, preferiu debutar na lanchonete da esquina. Assim como todas as festas de 15 anos, a de Marina era brega e sem graça – pelo menos era isso que Fernanda achava. Ela sentou na mesa mais distante da música e dos convidados, e ficou lá durante um bom tempo, brincando com os rasgões do seu jeans.
Diogo a notava, apesar de estar sentado junto dos seus amigos, cujas mentes já estavam sob o efeito do álcool. Diogo, surpreendentemente, não acompanhou os amigos na bebedeira naquele dia. Brega como a festa, Diogo bolava uma cantada – não muito original – para Fernanda, que incluiria “estou embriagado com você”. Ele nem imaginou a sorte que teve quando desistiu de falar aquilo. Entretanto, não desistiu de falar com Fernanda, mas preferiu puxar um papo com ela.
- E aí, tás sozinha?
- Na verdade, eu estava conversando com meu amigo imaginário, Gasper.
- Ahh – Diogo achou aquilo originalíssimo, mas já era a quarta ou quinta vez que Fernanda falava aquilo para alguém que tentava uma conversa. – Tô atrapalhando, então?
- Exatamente. Dá pra sair? – e continuou abrindo buracos no jeans. Diogo ficou desconcertado, era a primeira vez que algo do tipo lhe acontecia. Acabou por sentar ao lado dela. Mudou a tática.
- Festa chata, né? – e rezou para que Fernanda não lhe desse mais uma patada.
- Chatíssima – respondeu Fernanda sem vontade, mas com pena do rapaz.
- Engraçado, tu não parece com as amigas de Marina.
- Vai ver que é porque eu não sou amiga dela...
- Ah, então é igual a mim, acho essa menina um pé no saco. Só vim aqui por causa da boca livre e bebida free. E tu, veio por quê?
- Porque sou irmã dela.
Diogo ficou branco. Azul. Amarelo. E, ao final, roxo. Tossiu, numa vã tentativa de mudar o clima. Suavemente, Fernanda levantou-se da cadeira e saiu em direção ao bar. Diogo não ousou acompanhá-la. Estava morto de vergonha.
Fernanda sentou num daqueles bancos altos de bar, ao lado de duas meninas vestidas praticamente iguais – ou seja, “na moda”.
- Qual o teu placar, Marcela? – perguntou, saltitante, uma delas.
- 3! Sem contar Rodrigo, que eu fiquei na calçada.
Fernanda não se segurou:
- Puta que pariu véi, isso é o cúmulo da futilidade. Vocês não têm mais o que fazer não?
As meninas se entreolharam e soltaram uma sonora gaitada.
- Minha filha, olhe só você e olha a gente. Se você não consegue ficar com ninguém problema teu – disse a tal Marcela
- Eu achava que pelo menos aqui a gente não ia se deparar com esse tipo. Quem te convidou, hein?
- Ninguém, ela é irmã de Marina – respondeu Diogo, já devidamente recuperado e disposto a reverter a imagem que tinha passado para Fernanda.
- Ui, Diogo, caiu de nível, hein? – tentava ironizar a menina do “hein”, puxando Marcela e indo embora. Foi aí que Diogo percebeu a cara enfezada de Fernanda. A respiração da garota poderia ser ouvida a metros de distância, tal a raiva embutida nela. Demorou um pouco até ela falar.
- Era TUDO o que eu precisava. Um mamão feito tu tentando me defender. Você não tem noção das coisas, meu filho? Acha que eu não posso me virar sozinha? Não pensa nos comentários depois? – E então, à contragosto, Fernanda calou a boca. Não porque a raiva havia passado, mas porque outra boca estava colada na dela. Era o seu primeiro beijo – mas outros sete vieram logo a seguir. E, de repente, ela passou a achar que ficar não era tão fútil assim.