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Contos-->Tarde de Sábado -- 18/05/2002 - 08:13 (Wesley Nogueira) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Era uma tarde de sábado, uma das poucas que ele estava de folga; o trabalho sempre o absorvia demais. Ele, sem companhia, pensou em ir ao cinema, passear pelo shopping, enfim, ter alguns momentos mais agradáveis do que estar se preocupando com projetos e prazos. O filme em cartaz o atraiu, mas só começaria em cerca
de hora e meia, fazer o que, então?

Uma livraria estava ali, a sua frente, os lançamentos expostos na vitrine, ele resolveu entrar, viu logo um livro importado, sobre aviação, sua paixão de infância, apesar de seu inglês sofrível, ele logo se interessou em folhear um pouco, os desenhos coloridos o atraíram, as descrições técnicas. Mas isso foi só num primeiro momento, pois algo mais o atraiu: duas mulheres conversavam alegremente no final do corredor; eram semelhantes, talvez mãe e filha pela forma de conversarem. Ambas muito bonitas, a mais nova tinha o frescor da juventude, aparentava vinte e poucos anos, o cabelo loiro era convidativo, jogado sobre o ombro, se vestia de forma mais casual, bem jovem, sua roupas que evidenciavam uma boa grife pelas etiquetas, o corpo bonito e um jeito sensual e alegre de ser. Ainda assim, ele se dedicou mais à outra mulher.

Ela se vestia mais convencionalmente, aparentava uns quarenta anos, mas se a garota fosse sua filha, deveria ser pelo menos um pouco mais velha, um fino e discreto óculos de armação dourada que dava a ela uma expressão
altiva e confiante, o conjunto de saia e blusa tinha um corte discreto, mas muito charmoso. Era mais baixa que a filha, mas o sorriso dela
impedia-o de comparar alturas.

Ele gostou também do som da sua voz, da forma como ela falava, de como ela sorria enquanto ouvia as respostas da filha. Ele perdeu completamente o interesse pelo livro, e passou a observa-las, num voyerismo quase descarado. De seus trinta e poucos anos, seria até natural ele se interessar pela filha, principalmente depois de ver a aliança no dedo da mãe, mas era a mãe que o atraia, cada vez que ela falava, cada vez que ria. Ele tentava disfarçar o interesse, mas quase inconscientemente chegava cada vez mais perto das duas, folheava outros livros da prateleira, só para despistar.

Ele não sabia porquê, mas estava até meio nervoso, se sentia meio adolescente, nem parecia que já morara com uma mulher por dois anos e que a atual namorada passava os fins de semana com ele no seu apartamento, aliás. Pensou na namorada, com um pouco de culpa: ela estava num seminário, durante todo o fim de semana, razão da liberdade momentânea dele. Se ele analisasse friamente, não haveria razão para culpa, afinal ele sequer olhara diretamente a charmosa dama nos olhos. As duas começaram a movimentar-se. A filha, com um livro na mão e tentando abrir a bolsa; a mãe, um pouco atrás, falando algo sobre o cartão de crédito.

Ele as seguiu com o olhar, curioso para ver qual livro ela levava, passou os olhos pela estante, pela cor da capa, o identificou na prateleira: era um livro sobre ética, ética na imprensa, talvez ela estudasse jornalismo, quem sabe. Ele, inconscientemente, tentava imaginar a filha, mas seus pensamentos sempre voltavam para a mãe. Elas agora estavam no caixa, a mãe convencia a filha sobre quem deveria pagar a compra, a filha puxava o cartão de crédito, de cor azul, enquanto a mãe puxava o dela, dourado, tentando com o gesto onerar menos o orçamento da filha. Ele admirou o gesto, intimamente a admirou mais por isso, uma mãe dedicada, ele pensou. Ele nem sabia qual era o nome dela , nesse momento ele quis ir ao balcão, para observar o nome do cartão, apressadamente ele puxou uma revista da ponta da gôndola, sem mesmo ver o título, e se dirigiu ao balcão, ficou próximo a elas, com a revista na mão, ainda sem saber qual era.

A filha, inesperadamente o olhou, e por um momento sorriu para ele, num cumprimento bem casual; ela realmente tinha o rosto muito belo. Esse fugaz momento tirou sua atenção e o impediu de ler o nome da mãe no cartão, que foi guardado na bolsa, enquanto ela assinava a fatura. Os lábios dele devem ter mexido em uma expressão de descontentamento, pois a filha apressou-se em mudar o olhar e sorriso, que na mente dela ela não tinha sido bem aceito. Ele, envergonhado pelo constrangimento causado, também virou um pouco o rosto e encarou a mãe, ela sorria, e ele olhou os olhos dela através dos finos óculos de armação dourada, que, por um momento brilharam, fazendo com que ele se esquecesse do mundo, retribuindo o sorriso. Ela, mais confiante, lhe pergunta :é para sua filha? Ele não entende, a princípio, olhar nas mãos a revista e ler o título... Barbie... ele desarmado e meio confuso balbucia, - não tenho filhos, é pra minha sobrinha....

Ela recebe o pacote e o entrega a filha, dá outro sorriso e deseja uma boa tarde a todos mas ele
secretamente espera que seja só pra ele e, em seguida paga a revista que, agora, pretende mesmo dar à sobrinha mais velha, pensando na confusão das outras meninas, quando só esta receber a revista, fazendo uma anotação mental para comprar mais duas revistas ou livros para as sobrinhas menores. Mas não agora, porque de forma descarada, ele procura as duas com o olhar pelo shopping, as segue pelos corredores com a fina revista balançando no saco amarelo da livraria; já nem lembrava mais do filme que ia ver, aliás, passa pelo cinema sem sequer se lembrar de conferir no relógio o horário. O par de mulheres
continua seu périplo entre as lojas, atravessam a praça de alimentação e param num quiosque onde pedem duas xícaras de café.

Ele passa pelo corredor oposto e para na vitrine de uma loja de sapatos, onde o reflexo lhe permite observá-las um pouco mais, sem ser notado. Recrimina-se por aquele comportamento descabido, mas não consegue se conter; do ângulo que está, vê mais o rosto da mãe, embora tenha uma visão melhor do corpo da filha, muito bonito, por sinal, a calça que ela veste, um tanto quanto justa dá uma bela visão das pernas grossas e dos quadris perfeitos, mas ele prefere contemplar o rosto da mãe. Por um momento ele fantasia que ela também o observa. Mas o frugal drink chega ao final e elas saem novamente, agora em direção a saída do shopping, ao estacionamento.

Ele novamente as segue, dessa vez mais de longe, a consciência pesada por estar interferindo na liberdade de alguém, numa vigilância sem cabimento,mas que ele não consegue evitar. Elas se aproximam de um pálio verde, a mãe toca no transponder do chaveiro e as luzes do pálio piscam, destravando o alarme, a filha entra pela outra porta e elas saem da vaga.

Ele ainda admira a perícia dela de sair de uma vez só de uma vaga tão apertada, o carro contorna o canteiro e vai para saída do estacionamento, por um momento o carro se aproxima um pouco dele e ele a encara, joga tudo num momento de coragem, e abre um sorriso pra ela, que retribui, e ele sente que o carro passa mais devagar do que deveria, mas não para. Ele não sabe bem o que fazer, o que dizer e vê o pálio verde contornar outro canteiro: nota o adesivo no vidro, OAB, ela, ou talvez o marido, pertença a ordem, e o pálio sai do estacionamento, pegando a rua com pouco movimento, enquanto ele o acompanha com o olhar até sumir de vista. Nesse momento, ele sente um certo vazio, quase um desespero: como, numa cidade enorme, encontrá-la novamente? Teve vontade de ter decorado a placa, mas não teve a presença de espirito para isso.

Melhor assim, ele pensa, a harmonia e o sorriso dela, passeando com a filha, a amizade demonstrada pelas duas, deixava transparecer que ela é uma mulher feliz, deve ter um casamento perfeito, uma boa vida, fazendo-o, neste momento, sentir uma inveja, não a inveja mesquinha e simples, mas aquela que dá uma ponta de vontade de ter a mesma sorte, a mesma sorte de quem ofereceu aquela aliança de ouro que estava no dedo dela.

Ele entra novamente no shopping, olha com um certo desalento para o cinema ainda vazio, confere o horário no relógio e de repente ele perde toda a vontade de entrar, seria só gastar o dinheiro, pois sabia que não iria prestar a menor atenção na fita. Melhor era ir para casa, tomar um bom banho, ligar o televisor, melhor ainda, deitar na rede e ouvir o Cd do Djavan, ou do Milton Nascimento, e pensar na dama charmosa que ofuscou o brilho de sua linda, jovem e loira filha.
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