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Contos-->A casa daquela rua -- 19/05/2000 - 17:23 (REGINA LUCIA A. FARIAS) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
O dia amanheceu nublado e cheio de mistérios a ser desvendados. Eu sempre passava naquela rua pela manhã. E neste dia não foi diferente. Andava a passos largos, para chegar rápido na esquina que descia para o ponto do ônibus. Algumas janelas das casas ainda estavam fechadas, como que avisando para ninguém perturbar o sono daqueles que lá residiam. As luzes nos postes continuavam acesas. Os pássaros já ensaiavam o côro de todas as manhãs. Vez ou outra, aparecia alguém encolhido por causa do frio e do vento. Avistei o leiteiro conversando com o jornaleiro, crianças prontas para irem à escola, desciam correndo à rua com medo de chegarem atrasadas.

Uma daquelas casas que ainda dormia chamava-me a atenção.. Ela era diferente das outras daquela rua. Parecia com casas retiradas das estórias infantis, daquelas que duram para sempre. Suas duas janelas eram de ferro já bastante envelhecido, notava-se que a muito tempo não havia sido pintadas, parecia que era mais por impossibilidade do que por falta da vontade de quem lá vivia. A porta era em forma de arco e também fora feita de ferro e, como as janelas, não recebia sinal de pintura a algum tempo. A cor das paredes já estava esmaecendo, o que dava um aspecto de total abandono. A área que dava para o portão estava coberta de ervas daninhas, misturando-se a elas, algumas pequenas flores silvestres, ora vermelhas, ora amarelas.

Sabia que lá moravam pessoas, pois quando voltava para casa, via luzes acesas e um som de vozes. Não sabia qual o motivo, mas nunca via ninguém à porta ou janelas. Isto eu percebia, por que, quando me defrontava com a casa, eu diminuía os passos até poder observar com bastante exatidão as suas características.


Um dia, voltando do trabalho pela mesma rua de sempre dei de cara com um velho. Ele empunhava uma bengala prateada. Parecia bem sofrido, pois seu semblante não era de uma pessoa sossegada, parecia estar buscando algo. De repente ele aponta-me sua bengala, impedindo assim, que eu passasse para o outro lado da rua. Fiquei frente a ele. Seus olhos brilhavam. Suas mãos trêmulas tentavam gesticular alguma coisa. Fiquei atônita, pois sabia que não poderia, naquele momento, me desvencilhar daquele homem. Não que estivesse com medo dele, mas sim pelo fato de não saber como ajudá-lo.

O ancião vira que eu não compreendia os seus gestos e deu um passo à frente. Seguiu caminho contrário ao meu. Fui andando rápido, com receio que ele retornasse. Cheguei em casa e lembrei-me da cena. Fiquei conjeturando os fatos. Seria aquele velho morador daquela rua? E se fosse, em qual daquelas casas residia? Não comentei nada com minha família, mesmo porque, não queria deixá-los preocupados.

No dia seguinte, prossegui para o trabalho pela mesma rua. Ao aproximar-me da casa, fiquei parada um pouco a observá-la. O silêncio imperava. Lembrei-me do velho. “Eu deveria pelo menos ter perguntado o seu nome ou onde morava,” pensei. "“Agora a Inês é morta.”" E recomecei a andar. Chegando ao ponto do ônibus, senti a forte presença do velho. Fui até detrás do abrigo para ver se ele estava lá. Senti no ar o mesmo cheiro da noite em que o vi. Era um forte cheiro de bálsamo. Não soube identificar de onde vinha naquele momento. Voltei para a frente do abrigo e olhei para as pessoas que lá se encontravam, como eu, a espera de um ônibus. Aspirei o ar, mas não senti mais o cheiro de antes.

Chegando ao trabalho, pus-me a pensar: “Será que ele hoje vai abordar-me com aquela bengala prateada?” “E se o fizer, o que lhe direi, ou o quê me dirá?” Aguardei ansiosa o fim do expediente daquele dia.

Às exatas dezoito horas deixei o “tranco”. Peguei o ônibus que me deixaria naquele ponto.
Ao descer do ônibus, comecei a suar frio, o peito oprimiu-se e a pulsação acelerou. Chegando à rua, fui andando à passos largos. Mas foi por pouco tempo. Avistei a casa. E pasmem, ao lado dela, o velhinho estava em pé, com sua bela bengala. Fique engasgada, e neste momento, senti medo de verdade e pensei: “Será que ele mora naquela casa?” Fui chegando devagarinho e sentia que algo me empurrava para lá. Sem me dar conta, me aproximei da casa e do velho. Novamente a sua bengala foi-me apontada. Suas mãos tentavam-me dizer algo. Então, eu perguntei: ‘Senhor, precisa de ajuda?” Não obtive resposta. Foi se dirigindo lentamente para os fundos da casa e, nenhum gesto fiz para impedi-lo. Talvez gostaria que o seguisse, não sei. Não apostei para ver. Segui meu caminho. Cheguei em casa e ouvi uma das minhas irmãs dizendo: Mamãe, quando eu vou para a escola eu não gosto de passar naquela rua que vai dar no ponto de ônibus, pois os meus colegas de classe que moram lá, disseram que lá tem uma casa cheinha de fantasmas, será verdade?”. Sorri daquelas palavras de minha maninha. Toda criança fantasia um pouco as coisas, mas será que os seus amigos não estavam cobertos de razão?. Durante o jantar entabulei uma conversa com a família, e a pequena Brenda retornou ao assunto de antes e perguntou-me: ‘Marina, você não tem medo de passar todos os dias naquela rua quando vai trabalhar?” E eu respondi com um sorriso terno querendo acalmá-la: “Não Brenda, não há motivos para isso. Esqueça essas histórias que lhe contaram sobre aquela casa.” Todos se calaram. Terminamos o jantar e mais tarde fui dormir com a intenção de acordar bem cedinho e averiguar melhor os fatos, pois à noite quando voltasse, talvez não teria coragem.

Acordei bem disposta, com vontade de abraçar o mundo. Tomei meu café, beijei minha mãe e seguir para o “tranco.” Ao chegar naquela rua, me concentrei: “É hoje que eu descubro este mistério”. Apressei o passo. Aproximei-me da casa. Prendi a respiração e soltei-a bem devagar. Agora estava beleza. Bati duas vezes na porta em forma de arco. Ninguém apareceu. Bati três vezes. Esperei. Ouvi passos. Alguém com chinelos soltos nos pés vinha se encaminhando para a porta. Senti o perfume de bálsamo. Cheiro de velas queimando. De repente, vi a maçaneta girar. Meu coração bateu acelerado. Mas não arredei o pé de onde estava. Eis que a porta é aberta. Eis que surge uma velhinha, cabelos todos brancos, um sorriso meigo cheios de dentes ainda bem saudáveis. Perguntou-me em voz baixa: “O que deseja mocinha?”

Eu quase não consigo responder. Com muito esforço disse: “Minha senhora, desculpe-me estar batendo à sua porta neste horário, pois ainda é muito cedo. Porém não deu para esperar.” Então, contei do encontro tido com o velho senhor, e de como ele tentava me dizer algo. Ela ouvia tudo muito calma, sem interromper. Foi quando criei coragem e perguntei: “Senhora, por acaso este senhor de quem falei mora nesta casa? Você o conhece?” Pairou um longo silêncio. Aguardei alguns segundos até que ela resolvesse falar.

A minha ansiedade estava nas alturas. Aquela senhora encarava-me como se estivesse vendo um alguém muito querido. Pegou as minhas mãos nas suas e disse-me: “Minha filha, eu moro aqui há mais de 50 anos. Vim parar nesta casa assim que casei. O meu esposo se foi para junto de Deus a mais de 10 anos. Mas, antes de ir, jurou-me que ia encontrar alguém de bom coração para fazer-me companhia. Em vida, não conseguiu. Acho que agora ele o encontrou, eu só a estava aguardando, pois ele havia me dito, ontem à noite, que eu teria em breve uma visita e descreveu-me você. Não, não se espante, eu sempre falo com ele, mas de uma forma abstrata, ele nem sempre aparece em matéria. Quem passa perto daqui, pensa que mora mais de uma pessoa, o que não é verdade. Eu moro só. Vamos entrar e tomar um café?” Aquele cheiro de bálsamo se acentuou ainda mais quando entramos naquela casa. Parei no centro da sala e dei de cara com um enorme retrato na parede e ao seu pé velas queimavam. O retrato era daquele ancião com sua bengala prateada.

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