Robert aproximou-se. E por impulso beijou-a meio sem jeito, meio fora de prumo. Ravenala tremeu. Suou frio.
Desajeitado, ele disse alguma coisa sem nexo: — Viste A Lagoa Azul? Ela teve vontade de dizer que viu estrelas e um raio de fogo percorrer seu corpo. Mas, aprendera que se deve responder apenas o que foi perguntado. — A Lagoa Azul, é uma linda história que se passa numa ilha. Às vezes viajo na imaginação, e me sinto numa ilha deserta... — Ficar vendo o pôr do sol todo dia? Pássaros... e o ribombar das ondas. Sempre a mesma coisa todo dia. Monótono demais! — Nem tanto monótono, se virmos o raio verde. — Isso é lenda. — Navegando na ficção, Júlio Verne descreve um submarino, quando ainda não existia nenhuma embarcação que viajasse abaixo do espelho das águas. — Não é preciso estar numa ilha para ver o raio verde. Basta um final de tarde na praia. — Hoje não há mais tarde. São vinte horas. — Isso significa que é hora de voltarmos. — Sim, mas antes quero contar um segredo. — Não somos mais crianças. Não vais falar sobre o quarto secreto, vai? — É outra coisa. Vi teu nome escrito em uma página amarelada no baú de meu pai. — Leste? — As linhas introdutórias, apontavam para um pedido de desculpas. — Não leste tudo? — Meu pai chegou trazendo a aquarela de Toquinho e uma folha de papel em branco, dizendo ser o túnel do tempo... Eu estava mais interessada em saber o que estava escrito naquele papel que acabara de encontrar no baú dele. Fiquei curiosa. —Eu também — Acho que é hora de voltar pra casa. Teve vontade de contar as objeções sobre o namoro dos dois que o pai dela insinuava haver descoberto. “Estamos escrevendo um livro a duas mãos.” — Livro? Afinal, qual o foco? Moral católica tem leque restrito. Já os livros que oferecem solução para todos os problemas, vendem muito. Mas mentem. São verdadeiros apenas quando ensinam a ganhar dinheiro fácil. Realmente, se alcançarem boa vendagem, o autor, ganha muito dinheiro. A voz narrativa calou-se extasiada. Ravenala deslizou o mouse sobre duas ou três linhas no final do último capítulo com a intenção de excluir. Não conferiu o que selecionara e clicou em recortar. Salvou, e desligou a máquina. E ao reabrir o arquivo, no dia seguinte, seu livro tinha sumido, das 256 páginas, restavam apenas 23 palavras. Chorou. Estava tão focada no que perdeu, que esqueceu o que tinha ganhado. Ou não. Se Robert fosse seu irmão? Bem neste caso, teria ganhado um irmão. Passou a mão nos olhos, limpou as lágrimas, mas não conseguiu estancar o choro. Acabara de perder dez anos de trabalho.
*** Adalberto Lima, "Estrela que o vento soprou."
Adalberto Lima
Enviado por Adalberto Lima em 01/03/2018
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