Por volta de Julho/Setembro de 1961, para acorrer a uma inesperada falha de manutenção na Secretaria do Quartel General da Região Militar de Lisboa - tratava-se de gerir e ordenar a feitura da Ordem de Serviço - fui de urgência transferido provisoriamente do RAL3, em Évora, para a capital.
Claro, na nova situação e com 22 anos de idade, o meu galão de alferes mais endourou. O tipo da ordem de serviço que então era hábito fazer-se, no cabeçalho, apresentava-se assim:
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Quartel General da Região Militar de Lisboa
ORDEM DE SERVIÇO Nº. 165
Lisboa, 18 de Setembro de 1961
============================================Ora, dado que eu tinha um domínio enorme sobre a máquina de escrever - eu era um espectáculo a teclar e por isso fui recomendado - detinha umas quantas habilidades que me permitiam até desenhar. Por consequência atrevi-me a inovar a apresentação da "Ordem". De que forma?...
Como ao computador não é possível, escrevendo normalmente, sobrepor os caracteres, explicarei o efeito assim:
Tomava eu o "O" maiúsculo (o tronco), e batio-o, o suficiente ao correr da largura da página. Voltava atrás e batia por cima o "&" comercial e a "/" barra inclinada(cabeça, arreios e espingarda). Mudava de linha e batia por baixo o "W" maiúsculo (as calças). Na linha imediata, as aspas " (os plainitos), e por fim, na última linha, o acento circunflexo ^ (as botas).
Obtinha pois uma linha de soldadinhos - em reduzido tamanho, claro - como este aqui exibido:

O novo modelo da "Ordem de Serviço" que, com enorme expectativa apresentei, sairia como se segue:



Quartel General da Região Militar de Lisboa
ORDEM DE SERVIÇO Nº. 165
Lisboa, 18 de Setembro de 1961



Logo que levei a "Ordem" ao general-comandante para assinar, este limitou-se a rabiscar como habitualmente a sua rúbrica na "cera-stencil" que iria para o duplicador, sem reparar no novo efeito. Chamei por isso de imediato a sua atenção para o pormenor que eu havia alterado. "Mas... Ó alferes, está muitíssimo bem. Faça seguir... Está óptimo", retorquiu-me sorrindo anuentemente.
Enfim, esta memória está-me marcada porque, logo que treinei no serviço um companheiro local, fui reconduzido à minha unidade militar em Évora, com uma guia de marcha que me permitia, antes da apresentação, gozar 30 dias de dispensa e levantar na tesouraria 5.000 escudos. Naquela época o meu salário mensal, como alferes-miliciano, era de 1.500 escudos.
Eis agora, ao cabo de 44 anos, a recordação mais alindada ainda, com a colaboração do meu mestre de informática, Carlos Ribeiro. Santinho... Sequer dou por ela que ainda brinco feliz aos 66 anos.
António Torre da Guia
O Lusineiro