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Cartas-->TEATRO NÃO É PROBLEMA: -- 10/07/2002 - 07:33 (Jair Alves) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Caro Jair,

obrigado por seu email. Pode divulgar o meu artigo como quiser, um grande abraço, Boal

TEATRO NÃO É PROBLEMA:
É SOLUÇÃO!

Senhor Diogo Mainardi,
li com atenção o artigo que V.S. escreveu na revista Veja desta semana, no qual expõe seus pensamentos estéticos - sobre o teatro - e políticos, sobre a iminente e temida vitória do candidato do PT nas próximas eleições presidenciais. Diante do seu justo pânico, eu gostaria de tranqüilizá-lo – detesto ver gente sofrendo! - mas temo que o que lhe vou dizer perturbe ainda mais a sua mente alvoroçada.
Em primeiro lugar, cabe observar que Lula é candidato apenas no Brasil, e o Teatro do Oprimido existe hoje em mais de 70 países do mundo, 30 dos quais estão catalogados nas Yellow Pages of the Theatre of the Oppressed no endereço http://www.formaat.org/uk/yp/index.php, que V.S. pode e deve consultar. Verificará assim que, por enquanto, não cabe ao candidato petista nenhuma culpa pelo extraordinário desenvolvimento do TO no mundo inteiro, não só nas atividades político-legislativas a que o senhor se refere, mas também psicoterapêuticas, sociais e pedagógicas, onde é amplamente utilizado. Sobre o nosso Método, mais de vinte livros já foram escritos, no estrangeiro, por diferentes autores, atestando a veracidade do que afirmo.
O artigo de V.S. muito nos anima, e esperamos, com ansiedade e entusiasmo, que se cumpra a sua profecia de que, caso Lula seja eleito, “o Brasil se transforme em um gigantesco palco”. Não para canastrões, como diz o seu artigo, mas para que cidadãos livres possam, democraticamente, recuperar o seu legítimo direito à expressão teatral, que todos praticamos na infância, e que nos é depois escamoteado; para que possam, através do teatro, manifestar seus desejos e inventar seu futuro. Como V.S. não ignora, “a imagem do real é real enquanto imagem”: daí o extraordinário poder do Teatro do Oprimido e a sua fantástica expansão pelos cinco continentes.
Peço vênia, no entanto, para discordar de V.S. quando afirma que “os petistas ainda acham que o teatro deve ser usado como instrumento de transformação social”: não só os petistas mas, desde Aristóteles, todo mundo acha. A diferença é que alguns pretendem usá-lo para adormecer os espectadores e outros para despertá-los. Ninguém mais – nem mesmo V.S. – acredita que o teatro seja inocente, e que se possa falar da vida social sem que se revele o ponto de vista do qual se fala.
Discordo ainda – e nisto creio que tenho o apoio de 99,99% da nossa classe teatral, de que “já não necessitamos de mais teatros... porque já se produzem bobagens suficientes no Brasil”. Bobagens, é verdade, vemos em toda parte: no teatro, sim, mas também no jornalismo, nas telas de TV, nos filmes de inspiração holliudesca, na política... Tenho certeza de que o senhor não dirá que já não necessitamos de mais governos ou de novos jornais e revistas, só porque, por estes meios, tantas tolices já foram ditas e postas em prática.
Para terminar – desculpe o horror que lhe causo! – quero convidá-lo para assistir ao desfile de uma excelente Escola de Samba carioca, a Acadêmicos da Barra da Tijuca, que, no próximo Carnaval, terá como tema o Teatro do Oprimido no Brasil e no mundo. Já tenho reservadas duas entradas para o senhor, em nosso camarote, na Marquês de Sapucaí... ou em um dos nossos carros alegóricos, se V.S. nos der a honra, até lá, de mudar de opinião a respeito da arte.
Espero que o senhor publique esta carta com mesmo destaque que teve o seu artigo, não em obediência à lei - que, no Brasil, como sabemos, não é o que mais conta! - mas sim à consciência de V.S. Sem mais, Augusto Boal

O problema é o teatro
"Se Lula for eleito, não vai dar para
agüentar a proliferação de grupos
teatrais. Os petistas ainda acham
que o teatro deve ser usado como
instrumento de transformação social"

O maior perigo de uma eventual vitória de Lula não é a moratória da dívida externa ou o retorno da hiperinflação. Isso a gente tira de letra. O que não vai dar para agüentar será a proliferação de grupos de teatro amador. Em cada esquina haverá um ator improvisado, declamando seu monólogo. O Brasil se transformará num gigantesco palco para milhões de canastrões. Os petistas ainda cultivam a anacronística e terrificante idéia de que o teatro deve ser usado como um instrumento de transformação social. Onde quer que eles comandem, abundam os espetáculos de teatro popular. Em Ribeirão Preto, a prefeitura do PT colocou 300 adolescentes para interpretar sketches pedagógicos sobre a dengue, em locais públicos, como ônibus e shopping centers. O sindicato dos auditores fiscais, ligado ao PT, encenou peças de protesto na frente do prédio da Receita, reivindicando um aumento salarial de 63,83%. Em Porto Alegre, no Fórum Social Mundial, ativistas recitaram um ato a favor da estatização da indústria farmacêutica. Em São Paulo, a prefeita Marta Suplicy organizou um psicodrama coletivo para discutir "O que você pode fazer para ter uma feliz cidade". O evento mobilizou 8.000 moradores, que puseram em cena suas angústias com a ajuda de psicodramatistas e ego-auxiliares. Entusiasmada, a Federação Brasileira de Psicodrama descreveu Marta Suplicy como uma "estrela-mãe, que irá gerar estrelas-bebês, que continuarão a iluminar a navegação dos seres humanos em crescimento".

Todos os grupos teatrais petistas seguem a cartilha do Teatro do Oprimido, criado por Augusto Boal, nos anos 70, durante a ditadura militar. A prefeitura de Santo André foi a mais ativa nesse setor. A partir de 1997, em convênio com a equipe de Boal, passou a aplicar o Teatro do Oprimido no contato com a população. Os grupos teatrais reuniam-se regularmente em diversos pontos da cidade e dramatizavam "as relações de poder, havendo um personagem oprimido que era impedido de realizar seu desejo devido ao personagem opressor". Em seguida, o espectador era incentivado a debater os problemas da cidade e a sugerir soluções. O Teatro do Oprimido de Santo André chegou até a fazer um Desfile do Orçamento Participativo, com samba-enredo, bateria e alas temáticas, representando as maiores preocupações da população. Não sei se o desfile fez alguma referência às propinas da prefeitura ou se contou com carros alegóricos em homenagem a Ronan Maria Pinto e Klinger Luiz de Souza, dois dos principais acusados de corrupção na administração petista.

De acordo com seus fautores, as técnicas do Teatro do Oprimido ajudam nos debates públicos porque favorecem a desinibição. Estranho. Se há algo de que a população brasileira não precisa é de mais desinibição. Pelo contrário: um pouco mais de freio inibitório até nos faria bem. Também acho que não necessitamos de mais teatro. Já se produzem bobagens suficientes no Brasil. Muita gente se preocupa com o avanço das igrejas evangélicas. Involuntariamente, porém, elas trouxeram o benefício de fechar uma grande quantidade de teatros inúteis, convertendo-os em templos. O risco que corremos agora é que, com a vitória de Lula, o teatro brasileiro recupere as forças e tome as ruas. Prepare-se. Ninguém estará a salvo.


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