Juiz de Fora, 15 de maio de 2001
Queridos companheiros,
Há alguns anos que não me lembro quantos são, quando todos nós éramos adolescentes a procura de algo que não sabíamos direito o que era, nos reunimos e, aos poucos, durante os anos, fomos descobrindo juntos coisas que nos afligiam, nos indignavam e, sendo todos nós, graças a Deus, dotados de muita inteligência, força de vontade e perseverança, entregamos muitas de nossas energias à uma causa nobre: evoluímos, deixando o discurso sobre religião meio que de lado e nos dedicamos no auxilio aos carentes. Foi neste contexto que surgiu o nosso grupo de jovens, sob o nome de Uirapuru.
Como todos sabemos, a grosso modo, o uirapuru é uma ave típica do sertão nordestino que com seu canto leva alegria ao triste e sofrido povo daquela região. E nós, durante muito tempo agimos como tal, levando amparo e solidariedade aos necessitados. Quantas e quantas pessoas nós já fizemos sorrir? Com certeza foram menos pessoas do que gostaríamos que fossem, mas fizemos o melhor que pudemos.
No entanto, com o passar do tempo, todos nós fomos crescendo. Muitos até começaram a questionar a Igreja Católica e alguns de nós a abandonaram em busca de outra alternativa. Cada um de nós escolheu um caminho, e muitos de nós nos afastamos para poder buscar nossos próprios sonhos, alcançar nossas metas. Para nós, continuar o grupo como este era ficou inviável. Ele ainda existe em nossos corações, mas não tem mais aquele vulto na atuação popular como tinha em tempos passados – ficou apenas uma chama que se aquece no Natal na entrega dos almoços.
Mas, com o passar do tempo, além da saudade e da amizade, aumentam também nossos conhecimentos, nossas aflições e nossas indignações. Assim como vocês, escolhi meu caminho e o caminho que escolhi levou-me a entrar de cabeça num mundo em que graças a quatro anos de muito estudo eu pude compreender muito bem, que é o mundo da nossa sociedade, da política... um mundo cheio de miséria, de crueldade, de injustiças sociais. Todos aqueles problemas que discutíamos em nossos encontros e que muitas das vezes não conseguimos compreender o por que deles, neste meu caminho de estudos, eu consegui notar (não por completo, mas a essência) a causa de toda nossa desgraça social.
Então, tendo notado a maldade em que nosso povo esta mergulhado, sinto-me obrigado a fazer algo para pelo menos tentar mudar. Companheiros, a cada dia o Governo do Estado, em conjunto com as altas elites nacionais e internacionais (sobretudo norte americanas) roubam de nossos povo, nos exploram, nos fazem sofrer, acabam com direitos que historicamente nossos antepassados conquistaram com sangue e suor; tudo isso em detrimento de seus próprios prazeres e bem-estar. Continuamos, o povo brasileiro, um povo escravo e dependente, sendo que a diferença de nós para os escravos africanos e indígenas do período colonial é que nós somos muito medíocres, por que muitos de nós nem sabemos que somos escravos e quando sabemos não fazemos nada para reverter a situação. Deveríamos nos espelhar na luta pela libertação dos irmãos africanos!
E é por esse motivo, um motivo a princípio pessoal mas que abrange a todas as pessoas, é que venho até vocês. Amigos, vocês me conhecem, sabem que sempre fui inquieto, revoltado e contestador. Pois é, agora mais que nunca sou um revoltado informado e um revoltado com causa nobre. A cada dia, a cada estudo acerca de nossa sociedade eu noto que nós, o povo, temos que nos revoltar, indignar e o principal, agir! Eu quero mudar nossa realidade. É um sonho. Então, neste momento, um dos novos caminhos que estou escolhendo para minha vida, que é o caminho da luta por uma sociedade mais justa e igualitária, apoiada em um discurso socialista, que leva-me a convocar todos vocês, antigos companheiros, a nos juntarmos novamente e reorganizar o nosso Grupo Uirapuru. Um Grupo munido de um novo discurso, de um ideal político nobre, que retomará com mais afinco a luta em favor dos carentes, da sociedade, baseado em objetivos que tive o cuidado de previamente repensar e enumerar. Um Grupo que lutará ainda com mais brilho para provocar melhorias para a sociedade.
Para encerrar, gostaria que soubessem que tudo isso não faz parte de um delírio ou de uma loucura. Mas sim de um sonho e de uma grande indignação e angústia que desejo transferir a vocês. Sei muito bem que as idéias que estou tendo (que estão dispostas nos novos objetivos que enumerei para o Uirapuru numa espécie de estatuto) são idéias utópicas e quase impossíveis de serem realizadas. Mas se todos nós pensarmos assim, e desanimarmos de um sonho que parece impossível, nunca chegaremos a lugar nenhum e nossa gente continuará sofrendo as injustiças sociais que as torturam em 500 anos de História. Para nós é muito cômodo continuar como estamos porque estamos muito melhor que a maioria da população. Temos nossa casa, nossa roupa, nossa escola, nossa comida... mas milhões de pessoas em todo o Brasil não têm nada disso e vocês, em nossas andanças a favor do bem, já tiveram oportunidade de observar isso. Então agora, convoco todos vocês a participarem desse sonho comigo. Um sonho em favor da nossa liberdade.
Talvez não consigamos nada ou quase nada, mas, antes de fechar os olhos para a morte, gostaria de poder olhar pra trás e ficar orgulhoso de nós, por saber que tentamos, que não entregamos nossa causa assim, de mão beijada. Por saber que não passamos pela vida sem ter sonhado e lutado por nossos sonhos. Por saber que não fomos covardes... por saber que fomos como o uirapuru, por toda nossa vida... Pensem com carinho nisso, sonhem os meus sonhos e até muito breve.
Abraços do amigo,
Jeyson Reis Barbosa |