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Cartas-->um lugar pra fugir -- 02/03/2002 - 18:15 (Marcelo Santos Costa (Marcelo Tossan)) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
A quem possa interessar.

Um lugar pra fugir (e a caneta falha).
Olhava por entre a janela do banheiro, que faltava um dos vidros, via as árvores, a represa ao longe e ao lado dessa paisagem a periferia. Toda esparramada, pedaços de concretos, tijolos ora vermelhos ora cinzas, casas pintadas ou rebocadas.
Proliferam lojas de materiais para construção. Um lugar pra fugir, se trancafiava com o caderno e caneta no banheiro.
Olhava o verde das árvores e desejava também um lugar verde, com rede e pássaros, sossego.
Acordou numa fazenda, seria a fazenda que sonharas.
Mas já percebeu aventais brancos, e gente sofrida nos quartos calabouços. Agora mais do que nunca pensava em fugir.
Pensava em nunca mais voltar, deixar para trás tudo, desde amigos até família. Pegar um qualquer e comprar passagem de ida para o Mato Grosso, arrumar a mala às escondidas pular o muro. Não deixar noticias, ou talvez deixar um bilhete dramático que causasse indignação e tristeza. Dizendo que amava todos da família, mas algo dentro de si o pedia para ir. Tinha medo de chegando a outro estado sem parentes e dinheiro acabar mendigando, não!
Isso ele não queria, ia de novo a janela (uma nova janela agora, diferente da sua era de alumínio) e via as sombras dos eucaliptos que te remetiam ao sossego, esse sossego perseguido. Imaginava-se plantando e colhendo o que comer morando numa simplória casinha de barro. E se frustrava ao pensar que não iria dar certo, fora criado com arroz e feijão vendidos em embalagens plásticas, mal acostumado.
Fugir inventar uma fuga do próprio cárcere que sem querer entrou. Pensa em se jogar na represa. Se matar é radical demais, apesar de que em horas de depressão a morte talvez seria menos sentida. Talvez uma praia, se oferecer para trabalhar num quiosque, talvez alguém solidário o ajudasse.
Compaixão ao próximo, hoje em dia é raro (mas não impossível).
Com mala e cuia iria para a casa de algum tio na Bahia. Mas só que os parentes querem e esperam receber um parente vitorioso de SP.
Aquele que conseguiu vencer e só veio dar um passeio, dar uns presentes e gastar um pouco do dinheiro que (eles julgam que)tem. No seu caso iria chegar como vagabundo, fugido, não ia ser bem aceito. E agora é interrompido pelo choro da filha que à toa apanha da mãe. Pesadelo acordado lembranças amargas, vida medíocre que leva, fugir é covardia ou solução? Acabar com tudo sem deixar vestígios essa vontade aumentava a cada dia. Só queria fugir, ir e ir. Se pelo menos não tivesse desempregado, poderia quem sabe começar do zero. E fazer igual todo trabalhador semi-analfabeto. Pagar aluguel e depois de dez ou quinze anos comprar a própria casa ou terreno. Mas o destino parece dividido em gomos grandes. A maioria se casa, tem filhos, bebe, engorda e acaba brigando com a mulher.
-Que bosta! É disso que eu fujo também!
Derrotado. Coitado. Esses adjetivos parecem sussurrar em seu ouvido. Aceita-los ou não faz a diferença. Olha a janela, pingos grossos e ligeiros cortam o céu. Queria correr e deitar-se na chuva e sentir o gosto da liberdade.
-Talvez um raio me atingisse e fosse tudo num piscar.
Pensou romanticamente.
Manter aparências esse não era seu forte, quando se abatia ficava carrancudo, mas não descontava em ninguém, não era injusto.seria justo então deixar a própria mãe chorando? Sim ele sabia que ela iria chorar.
-Guerra! Poderia acontecer a terceira guerra mundial, eu estaria na linha de frente.
Disse isso fazendo pose de soldado segurando um fuzil.
- Despejaria meu rancor em forma de balas nos inimigos, terapia bélica.
A droga era uma fuga também, mas uma fuga pelo labirinto ele achava novamente arriscado.
Cocaína não é morfina e maconha dava sono nele.
Cachaça destrói e corrói a dignidade de um homem, transforma um malandro em Zé mané otário.
Dúvidas! Tinha mais perguntas do que respostas para a própria existência. Uma jangada no mar à deriva.
Trancado numa redoma, apesar de estar vivendo provisoriamente numa redoma quadrada de concreto.
Meu lar amargo lar. Abstinência maltrata-me física e psicologicamente.
Dores no estômago, suor frio na insônia e vômitos.


Carta de um interno de uma clínica de recuperação de drogados.
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