Desabafo de médico mineiro reflete indignação à crítica de Dilma aos médicos do SUS

"Uma pessoa me disse: ‘O médico não me toca’. Ela queria que o médico tocasse nela. Ela queria que o médico lhe tocasse, aquilo que a gente, pelo menos eu, meu médico sempre me apalpou, olhou o coração, olhou a garganta."

Em tom de desabafo, médico do SUS escreveu uma carta mostrando a realidade de quem está na linha de frente atendendo a população e sofrendo com as mazelas da saúde pública.

Leia a carta

Presidenta Dilma,

Enquanto a senhora comentava no Nordeste ( Folha on Line de 02 /10/2013) que nós , médicos do SUS, não colocávamos as mãos nos pacientes , eu atendia, neste mesma manhã, à primeira de uma série de consultas em um Centro de Sáude na periferia de Belo Horizonte.

Tratava-se de uma paciente de 40 anos que convive com AIDS egressa de uma hopitalização pela quinta pnemonia nos ultimos 2 anos. Procedi a uma anamnese e ao exame fisico onde realizei oroscopia, rinoscopia, otoscopia, ausculta pulmonar e cardiaca e analisei seus exames e seu Estado Geral de Saúde. A mesma conduta, tenho notado, é comum a todos os 11 colegas médicos que aqui trabalhamos, quase todos pós graduados, ganhando muito menos do que a senhora pagará para os estrangeiros que importa de maneira eleitoreira , como é do conhecimento geral da maioria da população.

No dia anterior, entre outras atividades, realizei visitas domiciliares em pacientes acamadas que vivem em habitações muito pobres , uma delas com sofrimento mental e portadora de diabetes e hipertensão arterial- e nesta, a enfermagem verificou a glicemia capilar, foram-lhe aferidos a pressão e demais procedimentos necessários. Solicitei exames de laboratório cujo material foi colhido pela equipe no dia seguinte.

Eu e a senhora somos mais ou menos da mesma geração e as opções que fizemos na vida determinaram nossa atual serventia. Optei por estudar entre outros o Anatomia Patológica (+ ou - 1600 paginas ) de meu professor Bogliollo que nos colocava no auditório da FMUFMG separando os alunos por tres cadeiras para que não colássemos.

Frequentei tambem como a senhora e muitos de seus colegas no governo, pelos arroubos de igualdade e de uma utopia socialista na juventude, a FAFICH ( Fac de Filosofia ) e o Cineclube da Faculdade de Filosofia onde se lia uma brochura de Karl Marx de 50 páginas de suas ideias sobre o comunismo.

Os índices de desenvolvimento que o Brasil apresenta semelhantes aos dos países desenvolvidos são em grande parte derivados da ação de médicos e do pessoal da saúde do SUS como o aumento da expectativa de vida , diminuição importante da mortalidade infantil, erradicação de diversas doenças infecto-contagiosas etc etc. Os pobres índices da economia e da política, suas especialidades, são conhecidos até na mais importante publicação mundial "The economist". Além do mais, a medicina brasileira tem notável índice de competência nas áreas de propedêutica e condutas - para os privilegiados - como a senhora bem conheceu no Hospital Sírio Libanês, bem diferente da formação de alguns médicos que a senhora trouxe. Sem querer generalizar, há 3 anos estive em Cuba e no hotel que me hospedei havia 3 camareiras que eram médicas.

Não somos contra a vinda de quem quer que seja desde que comprove que tenha competência para exercer o seu ofício e para não balizar a nossa profissão por baixo e servirmos como bode expiatório da incompetência gerencial de seu governo. Será que como divulgado pela imprensa os valores repassados a Cuba ficarão por lá ou voltarão para outros fins?

É muito deselegante falar do que não se conhece. Portanto convido-a a vir passar uma manhã em nosso Centro de Saúde e assim inteirar-se da grandeza de um projeto que vem, quando com equipamentos e pessoal adequados, ofertando uma medicina de excelente qualidade aos usuários do SUS.

Até breve!

Dr. José Carlos - Médico Generalista - SUS

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