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Artigos-->Ecologistas "avant la lettre" -- 19/06/2002 - 17:05 (Félix Maier) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos
Hoje, ecologistas pululam por todos os cantos. Há os que defendem o mico-leão-dourado. Há os que defendem as baleias. Há cristãos-novos, como o pseudo-filósofo Leonardo Boff, que pregam os “direitos humanos” dos animais, inclusive de insetos como o Aedes aegypti. Há ainda os radicais que defendem a exterminação da raça humana, para que os animais possam andar livremente neste planeta, longe da destruição e da ganância do ser humano.



Mas, antes que aparecesse essa revoada de ecologistas que, muitas vezes, estão mais interessados nas vantagens pecuniárias que suas ONGs lhes dão do que na efetiva preservação de espécies em vias de extinção, eu tive a satisfação de conhecer dois ecologistas genuínos, ecologistas “avant la lettre”.



Um foi o Dr. Teodorico, veterinário e funcionário do Ibama, em Joaçaba, SC, minha cidade natal. Outro foi Burle Marx, paisagista de fama internacional, que encontrei em Guaratiba, RJ.



O Dr. Teodorico ainda vive em sua chácara próxima ao centro de Joaçaba, onde cuida de cães e gatos, além de “cevar” jacus que aparecem nas árvores atrás de sua casa a um simples chamado, e depois descem até o terreiro para comer milho quase que nas mãos de seu benfeitor. Eu tive a feliz oportunidade de presenciar esse fato anos atrás, quando meu irmão Válter me levou até a casa de Teodorico. Lá, o ecologista me mostrou algumas fotos na ocasião em que a TV de Santa Catarina foi filmar sua chácara, com o chão coalhado de jacus, em torno de uma centena e meia.



Há interessantes estórias envolvendo o Dr. Teodorico. Certa ocasião, três amigos voltavam de uma caçada, quando no asfalto, próximo à cidade, avistam a Toyota do Dr. Teodorico parada no acostamento. Voltar com a picape não dava mais, o problema era se o veterinário levantasse a lona e visse os animais abatidos. Quando chegam perto, Teodorico manda que diminuam a velocidade do carro e parem no acostamento. “Pronto, estamos fritos” – diz um caçador.



Qual não foi o espanto da turma, ao ver que o veterinário não estava interessado em vasculhar o carro. Apenas pedira para que parassem para evitar que atropelassem uma cobra que estava atravessando o asfalto. Teodorico queria apenas que a bichinha rastejasse sossegadamente até o outro lado, sem atropelos, para que não ficasse estressada...



Certa ocasião, meu pai perguntou ao Dr. Teodorico se ele poderia ficar com um guaipeca que estava dando trabalho, pois o animal não servia para cuidar da casa, abanava o rabo para qualquer um que chegasse até a varanda. O veterinário disse que já tinha muitos animais para tratar, ficava difícil, a ração estava cara. Meu pai disse a ele que iria soltar o animal no meio da cidade. Melhor fora não ter dito aquilo. Teodorico mudou a cor da pele e o tom da voz para passar aquele sabão:

- Imagine, seu Hilário, se o senhor, ainda criança, fosse largado no estrangeiro, no meio da rua, onde não entenderia a linguagem de ninguém, nem tivesse para onde ir. Com certeza não iria sobreviver por muito tempo. Um animal é como o ser humano. Precisa de carinho e proteção. Se o senhor largar na rua, o primeiro carro irá atropelar o coitado.



Outro ecologista de minha admiração, já disse, foi o saudoso Burle Marx. Já conhecia seus belos trabalhos de paisagismo feitos no Aterro do Flamengo, no Rio de Janeiro. Além disso, eu passava em frente a sua chácara, à beira da estrada de Guaratiba, quando ia diariamente para a Restinga da Marambaia, onde trabalhava como fotógrafo no Campo de Provas da Marambaia. Do ônibus, ou do carro, contemplava sempre com prazer a exuberância de árvores que se erguiam imponentes por trás dos altos muros.



A primeira vez que conheci a chácara de Burle Marx foi quando fui fazer uma fotos de 15 anos de uma moça, filha de colega de trabalho. Logo na entrada, depois de vencer os grandes portões de ferro, encontra-se a casa do artista, simples, mas com um ateliê espaçoso, pois, além de paisagista, Burle Marx era pintor. Junto, uma pequena capela, utilizada periodicamente para festas de casamento ou outras solenidades, como bodas de prata ou ouro. (Será que ainda existem estas solenidades nesses tempos em que a maioria descasa tão rápido?)



Noutra vez, entrei na chácara em companhia de um grupo de artistas ligados a teatro, todos loucos varridos, que estavam fazendo um filme de 16 mm em Esperanto, para alguns “takes” de “A Sexta Raça”, dirigido por Reginaldo Orestes Cipolatti. Na ocasião, eu desempenhei o papel de “camaraman”. A cena a ser filmada era romântica, o rapaz apanharia uma flor e a entregaria à heroína do filme. Feito um último ensaio, a câmara focada, a luz natural lida por um fotômetro, para ajuste do diafragma, começamos a filmagem. O galã arranca uma flor na chácara de Burle Marx e sai correndo em direção à moça do seu coração, que se encontra sentada em cima de uma pedra, tudo sendo filmado em câmara lenta, como pedia o momento. Porém, alguns gritos interrompem a filmagem. Esbaforido e furibundo, Burle Marx sobe correndo a encosta da chácara o tanto que sua idade já avançada permitia. A bronca que ele nos passou foi desmoralizante. Como tínhamos a coragem de arrancar uma flor que ele havia plantado e cuidado com tanto carinho? Estava uma fera, não queria conversa, nos expulsou do local.



Porém, Cipolatti, aquele ser humano que tem uma lábia como ninguém, que consegue vender até geladeira a um esquimó, aos poucos conseguiu sossegar o artista. Pediu mil desculpas, realmente havia sido um ato indigno, passou a falar sobre o filme, as dificuldades da Cooperativa Esperantista em financiar o filme, os artistas eram todos semiprofissionais, de teatro, era a primeira vez que faziam um filme, essas coisas de como os artistas no Brasil passam por inúmeras dificuldades, normalmente desistem no meio do caminho, pois é, esperava ele que o Sr. Burle Marx perdoasse aquele ato bárbaro. Conversa vai, conversa vem, Cipolatti, como todo maçom que se preza, aos poucos havia conquistado novamente a confiança do paisagista. Resumindo, preparamos a câmara para outra tomada, agora a definitiva, tendo como espectador o ilustre artista com seus cabelos prateados ondulando ao vento.



Dr. Teodorico e Burle Marx. Dois ecologistas “avant la lettre”. O primeiro ainda entre nós, o outro já nos deixou há tempos. Sem dúvida, dois belos exemplos que deveriam nortear o trabalho da atual geração de ecologistas, muitos interessados apenas nas benesses recebidas de ONGs, com viagens e regalias mundo afora.





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