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Artigos-->MEMÓRIA DAS 4 VISITAS A ATHOS BULCÃO -- 19/09/2025 - 15:07 (LUIZ CARLOS LESSA VINHOLES) Siga o Autor Destaque este autor Envie Outros Textos

 MEMÓRIA DAS 4 VISITAS A ATHOS BULCÃO[i]

L. C. Vinholes

19.09.2025

Nota: Limpado gavetas, mas aproveitado apontamentos de 13.01.2011 e outros tantos sem datas, cheguei ao texto que registro para compartilhar detalhe relativos aos poucos momentos de convivência que tive com Athos Bulcão, nas visitas que fiz ao Hospital de Reabilitação Sarah, no Lago Norte, em Brasília.

Visita em 26 de fevereiro de 2007

 

Cheguei às 19h[ii] e apresentei-me como amigo do embaixador Wladimir Murtinho e do dr. Ernesto Silva, pioneiro de Brasília, levando comigo, para mostrar, exemplar da revista Desing nº 37, de 1962, com a publicação de minhas Instrução 61 e Instrução 62. Mostrei os cartões da Instrução 62 e coloquei nas 4 posições possíveis comentando sobre as leituras pelos executantes. Manifestei que ficara impressionado com o que li na imprensa quando ele informa que deixava os operários livremente instalarem as cerâmicas de seus trabalhos. Comentei sobre a fachada do Teatro Nacional e tracei paralelos sobre o que ele diz e faz e o que eu penso e digo. Ressaltei o fato de que até certas palavras por nós usadas são idênticas. Por exemplo, a palavra “instrução”. Comentei que na década de 1960 me encontrava no Japão e que não sabia da sua existência em Brasília. Com dificuldade Athos que olhava admirado a página com a Instrução 62, disse “é muito interessante”. Aventei a possibilidade dos cubos da fachada do Teatro Nacional serem de material leve, permitindo que as pessoas modificassem suas posições, criando novas formas e combinações. Athos com um gesto de cabeça respondeu que aceitava a idéia e deu um sorriso muito franco.

 

Obra de Athos Bulcão na entrada
da Embaixada do Brasil, em Praia, Cabo Verde

Mostrei a foto que tirei na frente da residência de nossa embaixada em Praia, Cabo Verde, e ele, notando que a cor estava um tanto azulada, imediatamente disse “a cor é verde”. Ele estava acamado e a luz que entrava pela grande parede de vidro do quarto dificultava ver a revista. Recordei que nós havíamos estado juntos na exposição de suas obras na galeria Athos Bulcão, na parte inferior do Teatro Nacional, ocasião na qual apenas nos cumprimentamos. O secretário/enfermeiro particular Darlon (9965.8189 e 33191995) disse que da próxima vez, se eu telefonasse com antecedência, prepararia para ele estar de pé (na cadeira) que seria melhor. Falei sobre minha visita à mostra de suas obras na galeria Ecco[iii], especialmente tendo chamado minha atenção o catálogo da mostra da Suíça onde está o texto mostrando seu pensamento quanto a construção da obra pelos operários.

Encontro de 12 de março de 2007

No segundo encontro com Athos Bulcão cheguei mais cedo, eram 16h30 e o encontrei sentado em sua cadeira de rodas no pátio à beira do Lago Paranoá. Mais uma vez conversamos a respeito da coincidência de nossas expressões com relação ao processo de realização de nossas obras, especialmente a fachada externa do Teatro Nacional e minhas Instruções. Quando mencionei o ano de 1962, o da Instrução 62 e da publicação pela revista Desing, ele referiu-se a presença no Japão de Wilson Reis Neto. Falei sobre Wilson e seu projeto[iv] - Athos tinha conhecimento -, e sabia de sua personalidade bastante singular. Athos disse que Wilson era uma excelente pessoa, mas “completamente louco”. Concordei e contei histórias que Wilson contava como verdadeiras, especialmente aquela de sua mãe ter dançado nua em evento realizado no salão do Hotel Nacional em Brasília, na presença de autoridades e convidados. Athos contou outra história também envolvendo a mãe de Wilson que ele dizia ter manchado de vermelho todo o lençol da cama por causa da menopausa. Athos explicou que Wilson e sua mãe não se davam bem e que ele, para irritá-la, inventava toda sorte de histórias e provocações. Athos comentou que Wilson teve morte muito triste. Quando perguntei do que morrera Athos disse que, conforme Wilson afirmara, fora de lepra, contraída no Japão. Manifestei minha surpresa. Contei o episódio da fotografia de Wilson vestido de moletom colante, todo branco, sentado em uma canoa às margens do Hotel do Lago Ashi, segurando uma rosa e gritando: “agora eu vou para a eternidade”.

 

 

Wilson Reis Neto e sua rosa vermelha

Falamos também de Gilda, irmã de Wilson, gravadora da qual disse ter algumas gravuras. Athos revelou que ela também não era bem certa, pelo seu comportamento. Comentei sobre meus dois trabalhos para o projeto do Pavilhão das Conferências Internacional, de Wilson, e sobre o fato de que até hoje eu não consegui ver as entrevistas estadunidenses que teriam publicado artigos/entrevistas com Wilson, relativas ao seu projeto nas quais teriam sido feitas referências ao meu Jardim de Palavras e ao Poema-Escultura. Athos recomendou que eu entrasse em contato com o arquiteto Sérgio Parada, seu amigo, que poderia me ajudar. Darlon me forneceu os dois telefones de Sergio (9972.6981 e 3349.4644). Falamos de música e Athos disse que gostava de música antiga. Comentei sobre a música barroca de Minas e ele manifestou desejo de ouvi-la. Prometi levar fita gravada com aquele tipo de música. Prometi também levar o catálogo do projeto de Wilson mandado imprimir pelo governador da província de Kanagawa. Pouco antes de nos despedirmos Athos comentou que este ano completará 89 anos. Felicitei-o e me despedi, pois o vento exigia que ele se recolhesse aos seus aposentos. Ganhei de presente exemplar do catálogo da mostra da Ecco.

 

Visita de 11 de abril de 2007

Combinando por telefone a visita de hoje, Darlon informou que não estaria para receber-me, mas que Elisangela[v] que o substituiria. Cheguei às 17h e levei para Athos cópia do CD de música barroca mineira - na realidade 4 missas: duas de Manoel Dias de Oliveira, uma de Joaquim de Paula Souza e outra de José Maurício Nunes Garcia -, pelo Coral de Câmara São Paulo e pela Orquestra Engenho Barroca, regida por Naomi Munakata. Olhamos as páginas do catálogo do projeto de Wilson inclusive as que mostravam meus dois projetos. Chamei a atenção de Athos para o vitral de autoria de Fernando Lemos e ele confirmou que o conheceu.

 

Vitrais de Fernando Lemos para o Palácio das Conferências Internacional

Aproximando-se das 18h Elisangela providenciou o lanche da tarde, um liquido por via sonda diretamente no estômago (aprendi ser gastrotomia). Comentei que havia entrado em contato com o arquiteto Sergio Parada que me pareceu ser uma pessoa muito gentil e amável. Athos confirmou que sim e disse que ele é muito jovem. Elisangela mostrou-me uma página de revista na qual aparece Sergio, Valéria e Karla Osório. Athos disse que estava vendo pessoas no banho e Elisangela disse que ele fez este tipo de comentário quando percebe que as pessoas estão andando pelo corredor. Quando perguntei se eram pessoas que ele conhecia, respondeu que não, que eram funcionários. Athos, a princípio, não estava muito disposto, mas melhorou consideravelmente quando saímos a passear pelos corredores. Mostrei um quadro abstrato, de singular beleza feito por um dos internos, de 38 anos, e Athos olhando atentamente disse “parece Manabu Mabe”. Realmente, afim com a fase geométrica de Mabe. Athos fez questão de me mostrar os painéis verticais do corredor principal com coloração modulada de sua autoria, bem como as duas mandalas situadas no alto das paredes laterais da área dos ginásios. Igualmente comentou os muros externos vazados e coloridos. Elisangela comentou que Athos gosta muito de ver as corujas que vivem nos canteiros e que ficam no alto dos muros e/ou dos postes. Athos confirmou dizendo são muito interessantes. Contei a piada do português que pensando uma coruja ser um papagaio tentava ensinar-lhe algumas palavras. Quando perguntado se o bicho estava aprendendo, o português respondeu que ainda não falava nada, mas que prestava muita atenção. Athos riu gostosamente. Elisangela contou que levam a Athos ao shopping e ao cinema que ele gosta muito. Athos é muito popular sendo saudado pelas atendentes sendo que uma delas, mais despachada, aproximou-se para saudá-lo, disse que ele estava muito elegante, que parecia um gatão e beijou seu rosto, despedindo-se. Seu médico pessoal também passou pelo corredor e despediu-se dele perguntando: “está tudo bem?”. Ele mesmo respondendo: “tudo bem a não ser aquelas coisas que nos incomodam”. Voltando do passeio aproveitei para despedir-me prometendo voltar. Athos agradeceu com um claro muito obrigado.

Último encontro em 18 de maio de 2007

Cheguei às 16h55 e fiquei pouco tempo, pois Athos se encontrava deitado na cama que fica na enfermaria na frente ao lago. Eu não conhecia o rapaz que estava atendendo. Comentei com Athos que nos jornais estavam notícias referentes ao restauro da Igrejinha da 108 Sul, onde estão um dos seus mais belos azulejos. Ele fez um muito pequeno movimento com a boca e sacudiu a cabeça como quem diz tomar conhecimento. Comentei ainda que o Teatro Nacional seria, também, restaurado, mas que a reforma não previa a parte externa onde está seu grande painel com relevos. Fiquei sabendo que ele havia escutado o CD com música barroca mineira que copiei para ele. A visita foi curta, pois dei-me conta de que, por alguma razão, Athos não se sentia bem e confortável.

 

[i] Redigido em 13/01/2011, aproveitando apontamentos.

[ii] Era rigoroso o controle da entrada dos visitantes no Hospital de Reabilitação Sarah, no Lago Norte, sempre marcava as horas e minutos da chegada e saída.

[iii] Veja o artigo Athos Bulcão e o catálogo da Galeria Ecco, de 12.05.2025, publicado no site .

[iv] Palácio das Conferências Internacional, projetado para ser construído às margens do Lago Ashi, em Atami, Japão.

[v] Não anotei e não me lembro se Elisangela era uma acompanhante ou também enfermeira

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