A FRUSTRAÇÃO EM TOKYO E AS INDECISÕES EM BRASILIA
L. C. Vinholes
19.06. 2025
Tomo cuidado para não revelar o nome do destinatário de minha carta e nem o posto que acabara de tomar posse, um dos diplomatas amigos, confiáveis, que tive nos meus anos de trabalho no Itamaraty, mas não posso deixar de compartilhar minhas frustações em Tokyo e meus desapontes no período de transição aguardando a transferência de Brasília para o Consulado-Geral em Milão.
Era o 13 de dezembro de 1995, quando, completei um mês de Brasília, após meu regresso de Tokyo. Sem sala, sem lotação definida e sem DAS[i], colaborando com o DC[ii], a DDC[iii], a DAOC-II[iv] e a ABC[v].
Fiz meu ponto no escritório da ABC no primeiro andar do Anexo I e fiquei sabendo que “vai ser remetida correspondência para o novo posto”. Fiquei motivado a escrever e dar notícias.
A carta que escrevi, depois da devida introdução, tem o texto que ocupa os paragrafos abaixo. Vejamos.
Desejo que já esteja devidamente instalado e de vento em popa no trabalho que tenciona realizar junto aos nossos amigos ......[vi].
O trabalho em Tokyo não foi fácil e não chegou a ser interessante. Valeu, isto sim, a oportunidade de rever amigos e locais que me interessam. O mais foi uma permanente dor de cabeça. Cancelada as apresentações de Fernanda Montenegro e da Denise Stoklos, a primeira depois de ter sido anunciada em primeira página dos semanários em língua portuguesa editados em Tokyo e em outras cidades japonesas.
Nenhuma exposição inaugurada. A do Museu de Arte de São Paulo havia sido planejada fora da programação da Comissão do Centenário e cumpriu o itinerário acertado há mais de dois anos.
A reedição do livro O Japão, de Aloísio Azevedo, ainda não saiu e só sai (se sair) em português o que, a meu ver, não tem o menor sentido, pois nem a primeira edição de 1987 está esgotada.
A mostra de xilogravura do nordeste foi cancelada.
A exposição de fotografias da coleção Joaquim Paiva[vii] foi também cancelada.
A reedição da Antologia de Teatro Brasileiro, inicialmente planejada para 5 de novembro de1995, provavelmente sairá em meados de fevereiro de 96, antecipando a visita do Presidente Fernando Henrique Cardoso ao Japão.
A doação de mudas de árvores para a cidade de Suzu (primeira "cidade irmã" de cidade brasileira), que tencionava plantá-las no dia 5 de novembro de 1995, aguarda desde 18 de setembro de 1995 a fixação de uma data para embarque do material escolhido pelo Jardim Botânico do Rio de Janeiro e que vai chegar ao destino em pleno inverno japonês.
De carona na programação japonesa, mas com passagens e diárias pagas por instituições brasileiras, o regente Carlos Prates e a pianista Linda Bustani participaram do concerto da Festival Villa Lobos-Música Brasileira 1995, organizado pela Sociedade Villa-Lobos do Japão (meia casa no Teatro Bunka Kaikan de Tokyo).
O violonista Turíbio Santos e o Quarteto de Cordas de Brasília, tocando, cada um, três peças de música popular brasileira, apresentaram-se na Festa de Yokohama (menos de meia casa) e na recepção final da cerimônia oficial japonesa quando os Príncipes, a Comitiva do Vice-Presidente Marcos Maciel e as demais autoridades já haviam deixado o recinto do evento. Creio que, do lado brasileiro, faltou profissionalismo, pragmatismo e seriedade.
Para aproveitar estes próximos meses e melhorar minhas finanças, está acertada com o ministro Elim Dutra[viii] e Alice Pessoa de Abreu[ix] minha volta à ABC, com DAS, tendo como principais tarefas, preparar uma minuta para nova revista da ABC, dando ênfase à cooperação prestada, finalizar o texto do manual da ABC e analisar uma série de ajustes-complementares em processo de redação.
[i] DAS era, no contexto do Ministério das Relações Exteriores (Itamaraty), a sigla da remuneração aos níveis de cargos de chefia “responsável por toda a cooperação técnica internacional (CTI) estabelecida entre o Governo brasileiro e outros países ou organismos internacionais.
[ii] DC era a sigla da Divisão Cultural.
[iii] DDC era a sigla do Departamento de Assuntos Consulares.
[iv] DAOC II é a sigla do Departamento da Ásia e Oceania
[v] ABC era a sigla da Agência Brasileira de Cooperação (Técnica), parte integrante do Ministério das Relações Exteriores, “responsável por toda a cooperação técnica internacional (CTI) estabelecida entre o Governo brasileiro e outros países ou organismos internacionais” inserindo-se “nas diretrizes da política externa brasileira”.
[vi] Os potinhos tem como finalidade não revelar o gentílico dos nacionais do país e, ao mesmo tempo, respeitar a privacidade do interlocutor.
[vii] Joaquim Paiva, diplomata que com seu “passa tempo” tornou-se um dos importantes fotógrafos brasileiros.
[viii] Elim Dultra, outro grande amigo, foi diretor executivo da ABC. Sobre suas esculturas em madeira, em 29.03.2007, publiquei no site o artigo Elim Dutra e os sábios de Pirenópolis, hoje com 1130 acessos.
[ix] Alice Pessoa de Abreu, procedente do Instituo de Pesquisa Aplicada (Ipea), foi, por 13 anos e 9 meses, excepcional coordenadora geral da ABC.
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