Para líder das Damas de Branco, luta deve continuar mesmo após libertações de maridos do Grupo dos 75
ENTREVISTA
Laura Pollán
Aos 62 anos, Laura Pollán é a face mais visível das Damas de Branco, o grupo de mulheres de presos políticos que desde 2003 sai pelas ruas de Havana aos domingos, depois da missa na Igreja Santa Rita, pedindo a libertação dos maridos. Ela, no entanto, acredita que seu marido seja um dos últimos a serem soltos pelo acordo entre o governo cubano e a Igreja Católica: jornalista independente, Héctor Maseda Gutiérrez não deseja viajar para a Espanha. Laura reage com indignação sobre a hipótese de que o grupo possa acabar após o último integrante do Grupo dos 75, presos na Primavera Negra, ser libertado. “Dizer que as Damas de Branco se vistam de negro, de azul ou de qualquer outra cor é um disparate”, disse ao GLOBO, por telefone. “Restam outros presos políticos pacíficos que têm direito à liberdade e nós estamos dispostas a continuar nossa luta por eles.”
Cristina Azevedo
O GLOBO: Qual a sua expectativa atualmente? LAURA POLLÁN: Nós, as Damas de Branco, consideramos que nossos esforços, todos estes anos de luta e de muito amor, estão dando frutos. Meu marido ainda não foi consultado pela Igreja se deseja ir para a Espanha. Se mantiver a decisão de não ir, será o último a sair. A filha mais nova dele mora nos Estados Unidos. Ele diz que, se fosse para sair do país, seria para estar com ela. Ele já é um idoso, não quer ficar pulando de país em país.
Uma das Damas de Branco que foi para a Espanha disse que o movimento deveria se dispersar. O que a senhora acha? LAURA: Não sei de onde Oleivis (mulher de Pablo Pacheco) tirou isso. É um disparate! Dizer que as Damas de Branco se vistam de negro, de azul ou de qualquer outra cor é um disparate. Ela pode falar do que pretende fazer, mas não tem o direito de falar pelas demais.
Mesmo após a liberação dos 52 presos restantes do Grupo dos 75, as Damas vão continuar caminhando todos os domingos? LAURA: Sem dúvida.
Restam outros presos políticos pacíficos que têm direito à liberdade, e nós estamos dispostas a continuar por eles. As Damas prometeram caminhar enquanto houvesse um único preso político pacífico em Cuba.
Temos ao redor de 70 a 80 mulheres de apoio, e elas estão dispostas a continuar com as Damas. Há os que foram presos antes e depois desses 75.
Não somos políticas, somos mulheres defensoras dos direitos humanos e da família.
Como foram estes sete anos? LAURA: Foram muito duros, muito difíceis, porque na maioria éramos mulheres que nunca haviam participado de nada que não fosse nossa casa, nosso trabalho. Mas Deus foi nos iluminando o caminho. Somos pacíficas, nunca fizemos ou aprovamos qualquer sinal de violência. Tampouco tivemos ligação com algum grupo político.
Eu era professora, e a Segurança do Estado ia constantemente ao meu trabalho, até que decidi deixar o emprego para dedicar-me a isso. No início, só podia visitar o meu marido a cada dois meses. Hoje, é mensalmente. No início eram 270 quilômetros de distância.
Um castigo para as famílias.
Mas nunca deixei de ir vê-lo, onde quer que estivesse.
Quando seu marido foi preso, a senhora imaginava que ele ficaria tanto tempo na prisão? LAURA: Outros haviam sido condenados a dois, três anos.
Nunca imaginei que ele poderia ser condenado a 20. Saímos às ruas pedindo a liberdade de nossos familiares. Foi um movimento espontâneo. Já havia um grupo de mães de presos, e elas nos convidaram, e assim fomos nos formando pouco a pouco. Quando resolveram mudar de igreja devido à pressão do Estado, dissemos que permaneceríamos ali, porque Santa Rita é a santa das causas difíceis e mesmo impossíveis.
A repressão piorou depois da morte de Orlando Zapata? LAURA: Muito mais. Machucaramme o braço, nos cercavam na rua. Certa vez nos deixaram mais de sete horas de pé, sem nos mover, dando-nos golpes nos tímpanos. Nos ofendiam muito.
A libertação deve ser seguida de mais abertura? LAURA: É preciso esperar, porque, com um governo como esse, nunca se sabe. É um governo imprevisível.
Fidel Castro reapareceu em público agora. A senhora imagina por quê? LAURA: O fato de sair no mesmo dia em que os primeiros presos seguiram para a Espanha foi para dizer ao povo: “Estou aqui e continuo governando”.
Raúl não toma decisão de envergadura sem contar com ele. Ele continua sendo o primeiro secretário do Partido Comunista, que governa o país.
Tem esperanças? O que pretende fazer quando encontrar seu marido em liberdade? LAURA: Deus nos dá muita esperança para continuar. Tomara que eu possa vê-lo quando sair da prisão, porque as famílias estão se reencontrando no aeroporto. Como não vamos partir, não sei se o verei.